Ao longo dos anos, a advogada Rosangela Wolff Moro chamou a atenção pela maneira como defendeu a Operação Lava-Jato e, por extensão, o trabalho do marido, o ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro, mesmo nos momentos em que estiveram sob o mais intenso bombardeio político. Sua projeção saiu da arena das redes sociais e chegou aos eventos organizados por socialites e entidades de classe, onde passou a dar palestras. Agora, o mundo político entrega a ela a chance de mostrar que pode chegar ao Congresso como deputada federal por São Paulo, onde registrou domicílio eleitoral, coisa que o marido buscou e não conseguiu, o que o obrigou a tentar a sorte no Paraná — mas para o Senado.
Essa oportunidade oferecida pelos caciques partidários não vem despida de interesses. Rosangela é vista como a candidata com o maior potencial de votos entre as postulantes femininas do poderoso União Brasil, dono da maior fatia do Fundo Eleitoral. Os mais otimistas acham que ela pode conseguir 1 milhão de votos, mais do que suficiente para ajudar a eleger outros deputados (em torno de três, considerando a votação de 2018). É por isso que o partido deve reservar a ela tempo maior de TV que o de outros nomes que concorrem a uma vaga. A empolgação se dá justamente pelo fato de Rosangela ter se tornado a cara feminina do lavajatismo. O potencial eleitoral do sobrenome Moro, aliás, foi um dos argumentos usados para apaziguar os ânimos com a chegada do casal ao União Brasil, segundo um padrinho de ambos. “São ativos importantes, que podem captar muitos votos”, diz o deputado Júnior Bozzella, vice-presidente da sigla em São Paulo.
Rosangela ainda tateia em sua estreia eleitoral. Por ora, não teve o que se possa chamar de agenda de pré-candidata, um período dedicado a ouvir potenciais eleitores e a lapidar o discurso eleitoral. Ao longo da última semana, ela passou fechada em reuniões internas e treinamentos para lidar com a imprensa e o público. O que está definido é que suas bandeiras serão a defesa do combate à corrupção, a valorização das mulheres e a defesa de direitos de pessoas com deficiência — esta última, uma área na qual ela tem experiência como advogada. Não são necessariamente temas que mobilizam os eleitores. Segundo pesquisa Quaest de julho, apenas 8% dos paulistas colocam a corrupção como o problema mais grave no estado. Economia, saúde, violência e questões sociais lideram.
Mesmo assim, Rosangela tem investido na pauta. Uma rápida passagem pelo seu perfil no Instagram, onde tem 210 000 seguidores, na quarta 27, aponta que, dos dez últimos posts, sete são sobre corrupção, dois a mostram em interação com o marido e em um ela responde a perguntas de seus seguidores. Resta saber como será para o casal continuar ancorado na pauta única com um partido que abriga denunciados pela Lava-Jato, como o, à época, senador José Agripino Maia (RN), ou investigados em outros esquemas, como o senador Chico Rodrigues (União Brasil-RR), flagrado com dinheiro na cueca em ação da PF.
O lavajatismo entra na campanha com o desafio de disputar o eleitorado à direita com o bolsonarismo, com quem somou forças há quatro anos. Movimentos que defendem a Lava-Jato, como Vem Pra Rua e MBL, apoiam a eleição de nomes que representem a pauta de combate a desvios de dinheiro público. Mas a seleção desses candidatos será mais rigorosa — e o resultado, provavelmente, não será tão vistoso como o da eleição passada. “Muitos se elegeram prometendo combater a corrupção e votaram favoravelmente a medidas de retrocesso”, diz Luciana Alberto, do Vem Pra Rua. “Não vamos ter o que tivemos em 2018, quando o fenômeno Bolsonaro elegeu um monte de gente”, acredita Adelaide Oliveira, ex-porta-voz do MBL e pré-candidata a deputada federal pelo Podemos (partido que abrigou Rosangela por 48 horas).
Mesmo com boas chances de se eleger, o casal Moro tem enfrentado muitos problemas em sua encarnação política — e as farpas estão vindo dos velhos inimigos. Depois de causar a negativa ao domicílio do ex-juiz em São Paulo com uma ação na Justiça Eleitoral, o PT promete tentar impugnar a candidatura de Rosangela. A defesa alega que a relação dela com o estado pode ser comprovada por um contrato de aluguel e por vínculos de trabalho (ela desenvolve projetos com uma associação de defesa de pessoas com doenças raras e deficiência). Há ainda um outro processo que pede uma apuração criminal para saber se houve intenção do casal de enganar a Justiça no registro do domicílio, mas ele foi trancado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-SP). Alçados ao protagonismo quando a Lava-Jato estava no auge, os Moro experimentam as dores da mudança de posição de vitrine à vidraça, sendo que a campanha nem sequer começou.
Publicado em VEJA de 3 de agosto de 2022, edição nº 2800