O governo da Turquia pôs em prática nesta sexta-feira, 28, sua ameaça aos países europeus de abrir sua fronteira por 72 horas e liberar a passagem dos cerca de 3,3 milhões de refugiados, em sua maioria sírios, ao velho continente. A Turquia afirma que não recebe apoio suficiente da Europa para abrir os imigrantes.
A decisão foi tomada nas horas seguintes aos ataques da Síria às tropas turcas estacionadas na província de Idlib, nos quais morreram 33 soldados da Turquia. O conflito se intensificou na região devido a uma ofensiva do regime do presidente sírio, Bashar Assad, contra o último enclave rebelde no seu país, que é apoiado financeira e militarmente pelos turcos.
Logo em seguida, centenas de refugiados se dirigiram às fronteiras da Turquia com a Grécia e a Bulgária. Em Istambul, ônibus foram disponibilizados para os imigrantes enquanto imagens captadas por drones mostravam dezenas de pessoas atravessando campos e florestas em direção à Europa.
No Mar Egeu, sem a presença da Guarda Costeira turca, um grupo de refugiados em um barco inflável rumou em direção à ilha grega de Lesbos.
O ministro da Defesa búlgaro, Krasimir Karakachanov, anunciou que o Exército enviará cerca de 1.000 militares e que “tomará todas as ações necessárias” para proteger as fronteiras, já o governo grego disse que aumentará as patrulhas na região.
A Turquia usa os refugiados como moeda de troca nas negociações com os países europeus desde que a crise de refugiados chegou em seu ápice, em 2015, quando milhares de pessoas que fugiam da guerra civil síria, da fome e da pobreza morreram ao tentar atravessar o Mar Mediterrâneo em embarcações precárias. Hoje, muitos dos refugiados ainda vivem em campos superlotados e com infraestrutura precária.
Para tentar mitigar o fluxo de refugiados, a União Europeia e a Turquia assinaram um acordo em 2016 no qual ficaria sob responsabilidade turca a tarefa de impedir as travessias dos imigrantes pela fronteira. Em troca, os europeus contribuiriam financeiramente para mantê-los na Turquia. A decisão de Ancara de “abrir as portas”, porém, viola o tratado e é uma via para extrair o apoio europeu contra Assad e a Rússia, que apoia militarmente o regime de Damasco.
A operação de Damasco contra o último enclave rebelde no país já desalojou quase um milhão de pessoas de suas casas em Idlib desde dezembro de 2019. Habitam a região três milhões de pessoas. Assad tenta reconquistar o controle do território com apoio aéreo da Rússia.
A Turquia culpa o regime sírio pelas mortes de seus soldados. Após uma reunião de emergência do governo, o presidente turco, Recep Erdogan, ordenou uma operação de retaliação contra o Exército sírio com ataques de drones destruindo tanques, blindados e matando dezenas de tropas leais a Damasco.
O governo turco disponibilizou vídeos da represália.
Erdogan convocou também uma reunião de emergência com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), do qual faz parte, esperando conseguir o apoio dos demais membros para criar uma zona de exclusão aérea em Idlib. A medida resguardaria as tropas turcas em Idlib de ataques de aviões militares russos e sírios.
O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, pediu que a Rússia e a Síria interrompessem os “ataques indiscriminados” e que respeitassem a lei internacional.
Quanto a Moscou, principal garantidora de Assad no poder, Erdogan adotou cautela. Durante uma conversa telefônica com o presidente russo, Vladimir Putin, os líderes demonstraram “preocupação com a escalda de tensões em Idlib”. Ambos os lados “reafirmaram a necessidade da adoção de medidas para normalizar a situação no noroeste da Síria”, segundo um comunicado divulgado pelo Kremlin.
Erdogan ameaça Assad com uma operação militar de larga escala se o regime não recuar para as posições estabelecidas no acordo de desmilitarização de Idlib, de 2018. A morte dos 33 militares turcos, contudo, não afetou a visão de Ancara sobre a província, pelo contrário, o ataque deixou o governo da Turquia “mais decisivo” sobre como agir.