Falsos diagnósticos de câncer de tireoide, como o que recebeu a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, não são novidade para a comunidade médica. Ao contrário, ilustram uma situação preocupante para a saúde no Brasil e no mundo, na opinião de Artur Katz, chefe do serviço de oncologia clínica do Hospital Sírio-Libanês e médico do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com o especialista, muitos médicos têm solicitado indiscriminadamente o ultrassom de tireoide em consultas de rotina, o que, em alguns casos, tem precipitado cirurgias para a retirada da glândula. “A tireoide virou a amígdala do século 21”, afirma Katz, fazendo referência ao surto de operações para a retirada das glândulas da garganta, especialmente na década de 60.
Katz ressalta que ainda não se conhecem os detalhes dos procedimentos que levaram ao diagnóstico de Cristina – e lembra que às vezes são de fato aconselháveis tanto a ultrassonografia como a remoção da tireoide, como ocorreu com a presidente argentina. Mas o especialista chama a atenção para o fato de que a maioria dos cistos detectados no ultrassom é benigna e dispensa tratamento. “Trata-se de algo que nem precisamos saber que existe. É como se olhássemos nossas mãos em um microscópio mesmo depois de lavá-las. As bactérias estão lá, mas não comprometem nossa saúde”, diz o oncologista. Mesmo assim, é comum que o médico solicite, após a ultrassonografia, o exame de punção.
Dúvida – O problema é que o exame de punção, a que Cristina também se submeteu, nem sempre é preciso na identificação de células cancerígenas. “Muitas vezes é impossível fechar um diagnóstico”, diz Katz. “Quando surge a dúvida, os médicos costumam pedir a opinião de outro patologista.” Se as suspeitas de câncer não são afastadas, o médico pode optar pela cirurgia. Durante o procedimento, terá acesso à estrutura do tecido da glândula, podendo então validar ou não o diagnóstico inicial. Dada a margem de imprecisão do exame de punção, o oncologista Hakaru Tadokoro, da Universidade Federal de São Paulo, explica que os médicos costumam alertar seus pacientes de que este diagnóstico pode ser descartado em testes futuros.