Nunca antes um ex-guerrilheiro havia seduzido tanto na Colômbia, um país governado historicamente pela direita, como o candidato da esquerda Gustavo Petro. O economista é um dos favoritos nas eleições presidenciais de domingo.
Os colombianos vão às urnas para escolher um substituto para Juan Manuel Santos, que está inelegível após dois mandatos. Petro é um dos principais candidatos na corrida, está atrás apenas de Iván Duque, o representante da direita apadrinhado pelo ex-presidente Álvaro Uribe (2002-2010).
Ex-prefeito de Bogotá e ex-rebelde dos “mocinhos”, daqueles que falam mais e atiram menos, Petro conseguiu o que parecia impensável: que a esquerda chegasse a uma eleição com chances de governar este país de 49 milhões de habitantes e tradicional aliado dos Estados Unidos.
Aos 58 anos, o leitor voraz da obra de Gabriel García Márquez e também ex-senador, aparece em segundo nas intenções de voto para o primeiro turno no domingo. Se as previsões eleitorais não errarem, disputará o segundo turno em 17 de junho com Iván Duque.
Segundo as últimas pesquisas divulgadas pelas empresas Guarumo e Invamer Gallup no final de semana, Petro conta com um respaldo de 24,2% e 29,5% dos eleitores. Já Duque aparece com 37,6% e 41,5% das intenções de voto.
Em um dos três países mais desiguais da América, o discurso antissistema de Petro e seu posicionamento em favor dos pobres fala alto depois do histórico acordo de paz que desarmou e transformou em partido a ex-guerrilha das FARC.
Passado de militância
Petro, que cresceu no Caribe colombiano, gosta de conversar, raramente perde a paciência em público e quase sempre usa jeans e camisas largas, embora não rejeite a gravata.
Com 17 anos, Petro entrou para o Movimento 19 de Abril (M-19), que surgiu como um grupo rebelde nacionalista. Naquela época, jovens esquerdistas de classe média urbana que questionavam o marxismo pegaram em armas depois de denunciar a fraude eleitoral de 1970 em favor do tradicional Partido Conservador.
Vinte anos depois, assinou a paz, depôs os fuzis e ajudou a redigir a Constituição de princípios liberais que existe desde 1991. Hoje, Petro resgata o fantasma de supostas fraudes nas eleições de domingo.
O candidato levantou suspeitas sobre o software que será utilizado para a contagem de votos nas eleições e acusou o atual presidente Juan Manuel Santos de mentir sobre uma missão da União Europeia que deveria inspecionar o pleito.
Segundo Petro, o bloco europeu enviou à Colômbia uma missão de observação diplomática, e não pessoas com capacidade técnica para revisar o software eleitoral e evitar fraudes.
Amar e odiar Petro
O aspirante do Colômbia Humana, que promove a política do amor contra o ódio da violência, polariza. Seus oponentes lhe acusam de um “castrochavismo” que ele nega. Com este jogo de palavras, alertam para o “risco” de que, sob Petro, a Colômbia se transforme na Venezuela vizinha. Outros o acusam de incitar um conflito de classes anacrônico.
Mesmo assim, Petro, que teve uma passagem controversa pela prefeitura de Bogotá (2012-2015), onde ganhou a reputação de mau administrador e autoritário, é uma opção para jovens e classes populares.
Atraiu os primeiros com iniciativas como substituir os combustíveis fósseis por limpos, não aprisionar os usuários de drogas, mas oferecer tratamento, e apoiar a adoção por casais homossexuais.
“Estamos com ele por convicção, não queremos repetir o que nossos pais viveram: violência e desigualdade”, diz John Durán, um comunicador social de 27 anos que o ouve atentamente em um comício na Praça de Bolívar, em Bogotá.
Para alguns jovens, Petro é a melhor alternativa dentro de uma faixa que vai da direita de Duque ao liberalismo do ex-negociador da paz Humberto De La Calle, passando pelo centro com o matemático e ex-governador Sergio Fajardo.
Dos seis candidatos, o esquerdista é quem mais tem seguidores no Facebook e no Twitter, e o que melhor combina as antigas artes da oratória com a gestão das redes sociais.
Robert Karl, acadêmico de Princeton e autor do livro “Paz Esquecida”, acredita que o fenômeno de Petro é único em comparação com o destino de Timochenko, o líder das FARC que desistiu de sua campanha presidencial antes do ressonante resultados obtidos pelo partido nas eleições legislativas de março.
“Seria impossível imaginar Timochenko, um guerrilheiro rural, enchendo as praças como Petro. Ele é um ex-guerrilheiro, mas também é ex-prefeito de Bogotá”, ressalta à AFP.