Grande parte da Venezuela voltou a sofrer um apagão nesta segunda-feira, 25, cerca de 20 dias depois de um episódio similar que paralisou o país por uma semana.
A capital Caracas e pelo menos 17 dos 23 estados foram afetados, de acordo com usuários nas redes sociais que utilizaram a hashtag”#SinLuz” (“#SemLuz”) para relatar os cortes no Twitter.
Cerca de três horas após a interrupção, o serviço começou ser normalizado em diferentes áreas da capital venezuelana e em regiões centrais do país, como Miranda, Carabobo e Aragua.
No início da noite, edifícios residenciais da capital e sua periferia – onde vivem cerca de seis milhões de pessoas -estavam com luz e os semáforos e a iluminação pública voltaram a funcionar. Já moradores de outras de outras regiões do país continuavam às escuras, segundo depoimentos postados em redes sociais.
O governo de Nicolás Maduro denunciou que o problema foi causado por um novo “ataque” contra o sistema elétrico nacional.
Numa declaração à televisão estatal, o ministro da Comunicação, Jorge Rodríguez, afirmou que houve “um ataque ao centro de armazenamento e transmissão do nosso sistema elétrico nacional”, especificamente na central hidroelétrica de Guri (estado de Bolívar, no sul).
“O que nos custou cinco ou seis dias (para recuperar) depois desse ataque (…), hoje em poucas horas foi resolvido”, expressou Rodríguez, celebrando que o serviço foi restabelecido em “tempo recorde”.
Mas o líder opositor Juan Guaidó, autoproclamado presidente interino da Venezuela, garantiu que o corte ocorreu por uma “sobrecarga no sistema de subestações”.
“Mentem para não assumir sua responsabilidade (…). Estão pondo em risco o pouco que resta em pé da infraestrutura elétrica”, disse.
O fornecimento de eletricidade foi interrompido às 13h20 local (14h20 de Brasília), afetando de imediato os semáforos, o metrô, as redes de telefonia celular e internet e o comércio de Caracas, que rapidamente fechou as portas.
Alguns hospitais suspenderam o atendimento na capital, segundo usuários do Twitter.
“Esta situação já está demais porque afeta as carnes, os frangos, tudo que é comida se estraga, é perda total”, informou Leo, de 19 anos, funcionário de um restaurante do centro comercial San Ignacio, na região leste da capital venezuelana.
A seu lado, uma dezena de funcionários se sentaram na rua para esperar resignados, já que nenhum deles crê que a luz vai regressar nas próximas horas.
“Agora devemos caminhar por toda Caracas porque não há metrô”, se queixou Alejandra, que trabalha como caixa no restaurante, a uma jornalista da AFP.
“Tudo graças a nosso presidente, que depois joga a culpa nos Estados Unidos”, ironizou.
Em Maracaibo, capital do estado de Zulia e onde se concentra a produção de petróleo no país, os internautas informaram que o serviço se encontrava “instável” e que a luz “vem e vai”.
“Me preocupa que isto continue por muito tempo”, declarou à AFP Neyda Colina, prevendo que as interrupções elétricas não vão parar. “Essa história de ataques é conversa para boi dormir”, acrescentou, para em seguida ser levada em sua cadeira de rodas pelas escadas do prédio onde trabalha pelos colegas de trabalho.
Sete dias consecutivos de apagão
O país superou há alguns dias um apagão generalizado, que durou de 7 a 14 de março, que complicou as comunicações, a distribuição de água e combustível, bem como o fornecimento de alimentos.
Também teria causado, segundo relatos, a morte de mais de uma dúzia de pacientes em hospitais.
O governo de Nicolás Maduro, em seguida, acusou os Estados Unidos por “ataques cibernéticos” contra a principal usina hidrelétrica do país, com o apoio da oposição, que tem à frente o líder parlamentar Juan Guaidó, autoproclamado presidente interino da Venezuela e reconhecido no cargo por Washington e 50 países.
A oposição atribui a crise da eletricidade ao abandono da infraestrutura e à corrupção
Cinco dias após a primeira série de apagões, Maduro informou que o serviço de energia estava restabelecido em quase toda Venezuela. Pouco depois anunciou uma reestruturação de seu gabinete e prometeu uma “transformação profunda” nas empresas do setor.
A situação de emergência levou o governo a suspender a jornada de trabalho e as aulas por sete dias.
As quedas de luz são frequentes no país petroleiro, e sistematicamente o ministro da Eletricidade, general Luis Motta, os atribui a sabotagens da oposição.
“É cruel, tudo deixa de funcionar.. nos dias de apagão não podemos fazer nada, não há Internet, não há acesso a nada”, declarou Yendresca Muñoz, uma analista bancária de 34 anos. A única esperança é “a queda deste governo”, acrescentou.
Guaidó se autoproclamou presidente interino em 23 de janeiro diante de uma multidão, após o Parlamento – de maioria opositora – declarar Maduro “usurpador” por considerar como “fraudulenta” sua reeleição no dia 20 de maio de 2018.
Contudo, o líder da oposição ainda não conseguiu até agora quebrar o principal pilar de sustentação do herdeiro político de Hugo Chávez (1999-2013): as Forças Armadas, com amplo poder político e econômico.
Com Maduro, a cota de militares ocupando cargos no Executivo chegou a 43,7% em 2017, e hoje está em 26,4%, segundo a ONG Controle Cidadão.
Dos 32 ministros, nove são militares e estão à frente de pastas como Defesa, Interior, Agricultura e Alimentação, além da PDVSA – empresa estatal de petróleo responsável por 96% das receitas do país – e do serviço de inteligência.
Guaidó prepara uma passeata até o palácio presidencial de Miraflores, em Caracas, para assumir o controle do governo, numa data a definir. O opositor não descarta pedir ao Legislativo que autorize uma intervenção militar estrangeira.
Washington, principal aliado do autoproclamado presidente interino, também não exclui uma ação armada para derrubar Maduro, e já atua no campo econômico com sanções para asfixiar economicamente o país. A principal medida é o embargo ao comércio de petróleo que entrará em vigor em 28 de abril.
Em meio a esta crescente pressão internacional para que abandone o poder, Rússia e China, principais credores da dívida externa da Venezuela (estimada em 150 bilhões de dólares), se converteram nos grandes aliados de Maduro.
Como parte deste apoio, a agência estatal russa Sputnik confirmou que duas aeronaves das Forças Armadas russas aterrizaram no sábado no aeroporto internacional de Maiquetía, em Caracas, transportando militares e equipamentos.