A apenas três dias de completar 21 anos, Malala Yousafzai visita pela primeira vez o Brasil. Em passagem rápida por São Paulo a convite do Instituto Alana, uma ONG de projetos socioeducacionais e de proteção da infância, ligada ao banco Itaú-Unibanco, a jovem paquistanesa participou de um debate sobre inclusão educacional na tarde desta segunda-feira no Auditório Ibirapuera – Oscar Niemeyer e aproveitou para dizer que “em um ou dois dias anunciaremos nossos projetos para o Brasil”.
A anfitriã do evento foi Ana Lucia Villela, presidente do Instituto Alana e uma das herdeiras do Itaú. No palco, o debate foi mediado pela jornalista Adriana Carranca, que escreveu um livro infantil sobre Malala, e três importantes ativistas pela inclusão educacional no Brasil: Conceição Evaristo, doutora em literatura brasileira e vencedora do Prêmio Jabuti com a obra Olhos d’Água; Dagmar Rivieri, fundadora da Casa do Zezinho; e Tábata Amaral, de 24 anos, da periferia paulistana, que superou dificuldades imensas e acabou ganhando uma bolsa integral para estudar astrofísica na Universidade Harvard, nos Estados Unidos.
Houve música e participação de jovens ativistas, que fizeram intervenções pontuais para expressar como a história de Malala era um exemplo de luta pela educação universal e inclusão social.
A jovem paquistanesa originária do Vale do Swat, no noroeste do Paquistão, pertence à etnia pashto, extremamente islâmica e conservadora. Entre 2011 e 2012, o Talibã dominou a região onde ela vivia com a família e onde seu pai tinha uma escola. O furor islâmico do grupo deu início à queima de CDs, DVDs, livros e computadores. A interpretação radical da sharia sob o comando do mulá Fazlullah atingiu em cheio Malala: de acordo com o clérigo não havia motivos para que uma mulher estudasse qualquer coisa que não a religião. Meninas foram proibidas de frequentar escolas –– e de sair nas ruas se não estivessem acompanhadas de um parente do sexo masculino.
Malala e algumas amigas se rebelaram contra o decreto e continuaram indo às aulas. Malala, com 15 anos na época, ousou a fazer o que muitos adultos não tinham coragem: falou publicamente contra o mulá Fazlullah e defendeu seu direito à educação. No dia 9 de outubro de 2012, um membro do Talibã invadiu o ônibus que levava a ativista e suas amigas à escola e deu três tiros na menina. Um deles acertou seu crânio e a deixou em coma. Entre a vida e a morte, a jovem foi levada à Inglaterra, onde passou por diversos tratamentos e –miraculosamente– sobreviveu.
Sua história se espalhou pelo mundo e ela se tornou símbolo do direito das mulheres em sociedades islâmicas em geral, e do direito de meninas serem educadas, em específico. Malala escreveu um livro contando sua história e, em 2014, aos 17 anos, tornou-se a mais jovem personalidade a receber o Prêmio Nobel da Paz.
A fama de Malala rendeu frutos na forma de status e dinheiro, com o qual a paquistanesa criou o Malala Fund (fundo Malala) para realizar projetos de inclusão educacional de meninas mundo a fora. O fundo já patrocinou iniciativas no Quênia, na Nigéria, na Jordânia, no Afeganistão e no Paquistão. Aproveitando o convite do Instituto Alana, os projetos patrocinados pela jovem desembarcam agora pela primeira vez nas Américas.
Malala adiantou que o local que deve receber maior atenção de sua organização é o sertão nordestino. De acordo com ela, 1,5 milhão de crianças brasileiras que deveriam estar em escolas atualmente não estudam. “Esperamos que isso possa mudar e que todas as crianças tenham acesso a uma educação de qualidade e que possam sonhar em ser o que quiserem sem limitações”, disse durante o evento.
Em resposta à indagação de Tábata Amaral sobre como elas podiam se conectar para trabalhar juntas nesses projetos, Malala disse: “Estou aqui e vou apoiar ativistas locais”.
Sem divulgar sua agenda ou falar diretamente com a imprensa, Malala desapareceu do palco assim que o evento terminou — ela continua no Brasil por mais alguns dias e deve viajar de maneira privada a outras cidades do país.