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Governo Milei dá a largada para valer com aprovação de pacote ultraliberal

Depois de suar para fazer passar sua Lei de Bases, mesmo em versão enxuta, o presidente argentino já se mexe para ampliar apoios e vingar no longo prazo

Por Amanda Péchy Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 jul 2024, 11h16 - Publicado em 21 jun 2024, 06h00
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  • Depois de um duro choque de realidade, em que viu seu plano de revirar política e economicamente a Argentina tropeçar e quase cair no Congresso, Javier Milei colheu, enfim, uma vitória decisiva no propósito de dar ao país as feições ultraliberais que deseja. Na quinta-feira 13, enfim, os senadores aprovaram a Lei de Bases, um pacote de medidas que, no conjunto, pretende reduzir a presença do Estado na economia, sanear as contas públicas e ampliar os poderes do Executivo. É verdade que a proposta, mais conhecida como Lei Omnibus (para todos, em latim), minguou de 664 para 238 artigos para poder vingar, o que ocorreu após espremidíssima votação: 36 votos contra, 36 a favor, cabendo à vice-presidente, Victoria Villarruel, o voto de minerva. Daí o apelido que a oposição se apressou a dar ao texto: “micro-ônibus”.

    O próximo movimento de Milei é se articular justamente com a “casta” que tanto desdenhou para alargar suas bases no pleito legislativo do ano que vem — hoje, seu nanico partido, o Liberdade Avança, conta com 38 de 257 deputados e sete dos 72 senadores. Dessas costuras depende o sucesso do projeto, um duelo de longo prazo. Os protestos do lado de fora do Congresso ajudam a dar os contornos dos obstáculos no horizonte do ocupante da Casa Rosada — por ora, ele registra popularidade na casa dos 50%, mas isso pode evaporar rapidamente, já que os cortes de benefícios e subsídios têm pesado no bolso. O próprio Milei, mantendo o tom megalômano, reconheceu ser só um começo. “É o primeiro passo para a recuperação da nossa grandeza”, disse sobre o documento, que retornará à Câmara apenas para cumprir o rito.

    OS DESCONTENTES - Protesto em Buenos Aires: uma fatia da população está sentindo o arrocho no bolso
    OS DESCONTENTES - Protesto em Buenos Aires: uma fatia da população está sentindo o arrocho no bolso (Luciano Adan Gonzalez Torres/Anadolu/Getty Images)

    Ajusta daqui, ajusta dali, o que sobrou da desidratada Lei de Bases não é pouco na direção de reconfigurar o Estado. No início, o presidente queria poder governar por decreto em onze áreas durante três anos — ficaram quatro com validade de um ano, mas se concentram em assuntos centrais da gestão (economia, finanças, administração e energia). É ferramenta, porém, que deve ser usada com critério. “Precisamos observar como o presidente utilizará os poderes extraordinários”, diz a cientista política Ariadna Gallo, da Universidade de Buenos Aires. Das quarenta empresas que Milei planejava privatizar, restaram oito, estando de fora a petrolífera YPF, o Banco de La Nación e a Aerolíneas Argentinas, que saiu do rol nos últimos minutos. Um dos mais celebrados tópicos foi certamente o estabelecimento do Regime de Incentivos a Grandes Investimentos, com o objetivo de destravar a burocracia e dar estímulo a empresas dispostas a investir vultosas somas em solo argentino. Também passou uma anistia fiscal para fundos no exterior. A ideia aí é tentar trazer dólares ao país, algo essencial num cenário de baixíssimas reservas.

    Os mercados emitiram sinais imediatos de aprovação, e o Fundo Monetário Internacional (FMI) liberou mais 800 milhões de dólares para a Argentina refinanciar sua dívida. Com um arrocho brutal que se refletiu numa subida da pobreza, ao mesmo tempo que garantiu o superávit primário e o recuo da inflação para um dígito, organizações e sindicatos ligados ao peronismo seguem protestando, assim como uma ala dos governadores, temerosos de que suas províncias percam a autonomia. Eles são, aliás, peças nevrálgicas no intrincado tabuleiro político argentino, e Milei e sua turma precisarão encontrar um jeito de atraí-los — inclusive para o pacto que era para ser “de maio” e agora está previsto para 9 de julho, dia da independência do país, quando o presidente lançará as bases liberais para sua simbólica “refundação” da Argentina. “Mesmo com todas as concessões que precisou fazer, Milei acalmou as dúvidas sobre sua governabilidade”, avalia Ignacio Labaqui, professor de política da Universidade Católica Argentina. Uma vitória que ainda requer tempo e habilidade para se provar duradoura.

    Publicado em VEJA de 21 de junho de 2024, edição nº 2898

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