A Casa Branca ameaçou nesta segunda-feira impor sanções contra o Tribunal Penal Internacional (TPI) se este vier a investigar as suspeitas de crimes de guerra cometidos por militares americanos no Afeganistão. A ameaça abrange também a potencial apuração do TPI de crimes contra a humanidade cometidos por Israel contra os palestinos da Faixa de Gaza.
Em nota, a Casa Branca acusou a corte de interferir na soberania dos Estados Unidos e na sua Constituição. O país chegou a assinar o Estatuto de Roma, que previu a criação do TPI, no governo de Bill Clinton. Mas seu sucessor, George W. Bush, retirou o país do tratado. Com sede em Haia, o tribunal julga crimes de guerra e de lesa humanidade.
“Nós vamos proibir os juízes e promotores (do TPI) de ingressarem nos Estados Unidos. Vamos sancionar seus fundos depositados no sistema financeiro dos Estados Unidos e processá-los no sistema criminal dos Estados Unidos”, afirmou o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, John Bolton.
“Faremos o mesmo com qualquer companhia ou Estado que ajude o TPI em investigação de americanos”, completou.
Durante o governo de George W. Bush, Bolton defendeu a retirada dos Estados Unidos do Estatuto de Roma. Na época, era subsecretário de Estado, e sua posição prevaleceu. Em 2003, quando era embaixador dos Estados Unidos nas Nações Unidas, Bolton apresentou provas falsas provas para justificar a autorização do Conselho de Segurança para a invasão do Iraque.
Hoje, ele qualificou o TPI como um órgão “absolutamente perigoso”. “Em teoria, o TPI culpa os autores das maiores atrocidades por seus crimes, garante Justiça às vítimas e impede futuros abusos. Na prática, o Tribunal tem sido ineficaz, não é responsável e, de fato, tem sido absolutamente perigoso”, afirmou.
“Se a corte vier atrás de nós, Israel ou qualquer aliado dos Estados Unidos, não vamos ficar de braços cruzados”, voltou a ameaçar.
Até meados de 2018, o Afeganistão havia encaminhado ao TPI 1,2 milhão de declarações sobre atrocidades cometidas no país, compiladas pela promotora do TPI, Fatou Bensouda. Entre os autores dos crimes estão o Exército Islâmico, o Talibã, as forças de segurança do governo afegão, as milícias locais, os espiões e também a coalizão internacional liderada pelos Estados Unidos, segundo a Organização de Direitos Humanos e Erradicação da Violência.
Os crimes sujeitos a investigações são apenas os ocorridos depois de maio de 2003, quando o Afeganistão ratificou o Estatuto de Roma. Os Estados Unidos invadiram o país em 2001, logo depois dos atentados terroristas da Al Qaeda em Washington e Nova York, com o argumento de caçar os responsáveis pelos ataques e derrubar o governo do Talibã, que os apoiara.
Entre as 1,2 milhão de declarações enviadas ao TPI estão as relacionadas aos centros de detenção criados e administrados pela Agência Central de Inteligência (CIA) no Afeganistão. Há denúncias de torturas cometidas no local entre 2003 e 2014.
Alguns casos de atrocidades cometidas por soldados americanos foram amplamente noticiados nos Estados Unidos. Em 2012, o sargento do Exército Robert Bales planejou e executou um plano para matar 16 civis – nove crianças entre eles – na província de Kandhahar. Bales admitiu o crime e, no ano seguinte, foi condenado à prisão perpétua sem direito a liberdade condicional.