O governo da Bolívia pediu na noite de quinta-feira, 18, ao Brasil e Estados Unidos que “não intervenham” em seus assuntos internos, após ambos os países expressarem preocupações com a detenção da ex-presidente interina Jeanine Áñez, presa preventivamente no último sábado, 13. Em duas declarações, o Ministério das Relações Exteriores boliviano, que realizou encontros separados em La Paz com diplomatas dos dois países, relembrou acordos internacionais que pedem a não intervenção em assuntos de “jurisdição interna” de outras nações.
Áñez foi presa acusada de ter conspirado pela renúncia do ex-presidente Evo Morales em 2019. No domingo, ela foi condenada a quatro meses de prisão preventiva. Na terça-feira, o presidente Jair Bolsonaro criticou a detenção e disse que a alegação de que ela participou de um golpe de Estado contra Morales em 2019 é “totalmente descabida”.
Em sua fala inicial em um evento virtual, Bolsonaro disse ainda esperar que a Bolívia “mantenha em plena vigência o estado de direito e a convivência democrática”.
Em nota, o Ministério de Relações Exteriores reforçou a posição de Bolsonaro e relembrou que o governo brasileiro foi o primeiro a apoiar a formação de um governo provisório por Jeanine Áñez. O Itamaraty ainda descartou as acusações de aliados de Morales de que ele foi vítima de um golpe de Estado, afirmando que a renúncia do ex-presidente “foi motivada pela reação popular à tentativa de fraude eleitoral detectada pelas missões de observação da OEA e da UE”.
“A posse da Presidente Áñez se deu de maneira constitucional, reconhecida pelas instituições bolivianas e em conformidade com o Artigo 1 do Protocolo de Ushuaia. Recorde-se, também, que o governo da Presidente Jeanine Áñez convocou e realizou eleições livres e transferiu pacificamente o poder ao Presidente Luiz Arce”, diz a nota.
Os Estados Unidos, por sua vez, se manifestaram no próprio sábado, pedindo que a Bolívia “defenda” os direitos civis interamericanos, embora não tenham mencionado explicitamente a prisão da ex-presidente interina.
Em resposta, o Ministério das Relações Exteriores boliviano informou na noite de quinta-feira que, em reuniões realizadas separadamente, o chanceler da Bolívia, Rogelio Mayta, disse à encarregada de negócios dos EUA, Charisse Phillips, e ao embaixador brasileiro, Octavio Dias, que deveriam “abster-se” de “intervir” nos assuntos internos.
“A Chancelaria boliviana fez referência à declaração sobre os princípios do direito internacional sobre as relações de amizade e cooperação entre Estados, de acordo com a Carta das Nações Unidas, que estabelece a obrigação de não intervir em assuntos de competência interna dos Estados”, especifica uma nota.
As acusações
Áñez é acusada de terrorismo, sedição e conspiração para a renúncia de Evo Morales. Segundo o Ministério Público, ela participou do plano para executar um “golpe de Estado” contra o ex-presidente, que renunciou em novembro de 2019 em meio a grandes distúrbios sociais após a sua reeleição.
Outros cinco ex-ministros de Áñez também foram detidos, e o governo do Peru informou que a ex-ministra Roxana Lizárraga solicitou asilo. Advogada e ex-apresentadora de televisão, Áñez deixou o governo em novembro, após a vitória de Luis Arce, ex-ministro da Economia de Evo, nas eleições presidenciais.
Os opositores de direita e centro denunciaram na época que Morales havia cometido fraudes na eleição. Diante de enormes protestos populares, as Forças Armadas pediram para que Morales deixasse o cargo, o que fez o então presidente a renunciar e seguir para o exílio no México (e depois para a Argentina).
Áñez foi presidente interina do país após a renúncia de Evo em 2019. Sua administração durou 11 meses e envolveu a prisão de alguns políticos do governo anterior.