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Os cuidados extras dos restaurantes que começam a voltar à atividade

Fechados pela pandemia, estabelecimentos se preparam para mudar o ritual de comer fora 

Por Jana Sampaio Atualizado em 8 Maio 2020, 11h07 - Publicado em 8 Maio 2020, 06h00

O cotidiano hábito de partilhar a refeição ganhou novo sentido quando, durante a Revolução Francesa, os aristocratas perderam a cabeça e os renomados chefs que preparavam seus banquetes, o emprego. Para garantirem o sustento, os mestres-cucas tiveram a ideia de transplantar suas receitas para a cozinha de estabelecimentos onde qualquer pessoa poderia sentar-se à mesa, degustar os quitutes e pagar um preço predeterminado — que começou alto, para poucos, mas se democratizou à medida que o conceito foi alcançando bairros populares. Nascia ali o restaurante, um lugar pensado para apreciar o ato de comer bem, em ambiente agradável e em boa companhia, o que também viria a revolucionar as regras da convivência social. E assim a humanidade caminhou por dois séculos, abraçando a rotina de se alimentar fora de casa — para celebrar alguma data, promover um encontro de negócios ou pelo simples prazer gastronômico —, até a atual pandemia obrigar os restaurantes a fechar as portas. No máximo, entregam pratos em domicílio, o que não tem o mesmo sabor do rito cultivado ao longo dos tempos.

O corte súbito e brutal de um hábito arraigado tem tudo para ser temporário. Quando o perigo diminuir, os restaurantes vão voltar (pelo menos os que conseguirem sobreviver a estes dias bicudos), mas a relação entre eles e seu público poderá passar por grandes transformações. “O prato é a materialização da ida ao restaurante, uma experiência que envolve o ambiente, o preço e a companhia. Agora, tudo isso será influenciado por novos cuidados e uma certa suspeita no ar”, avalia Enrique Rentería, autor de O Sabor Moderno: da Europa ao Rio de Janeiro na República Velha.

Em países da Ásia, onde o vírus apareceu primeiro, bem como em determinados pontos da Europa e alguns estados americanos, o relaxamento da necessidade de distanciamento social permitiu a reabertura de estabelecimentos, mas mediante protocolos rígidos. Com apenas quatro mortes e mais de 1 000 casos confirmados, Hong Kong saiu na frente na retomada e nos cuidados; de seu guia com as novas regras, já adotado por vários países, constam a presença na mesa, ao lado do saleiro e do pimenteiro, de um frasco de álcool em gel e cardápios plastificados e desinfetados a cada uso. Além disso, funcionários e clientes precisam usar máscara (que pode, sim, ser removida para comer), todos os que entram têm a temperatura medida e divisórias de acrílico separam os comensais em uma mesma mesa — as mesas, por sua vez, são seguramente distantes umas das outras e acomodam no máximo quatro pessoas. Para o chef português José Avillez, dono de dezoito restaurantes (dos quais cinco devem fechar), a dúvida é se os clientes vão se adaptar ao novo ambiente: “Trata-se de um local que oferece entretenimento e uma experiência prazerosa. O grande número de cuidados pode empanar essa expectativa”.

A DIVISÃO - Refeição compartilhada em Taiwan: painel transparente para evitar contágio (Jorge Silva/Reuters)

Cioso diante da pandemia, o público tem hesitado em ir comer fora nos locais onde isso é permitido. No Espírito Santo, Santa Catarina e Paraná, que autorizaram uma reabertura gradual, com horários e frequência reduzidos, o faturamento vem girando em torno de 10% do habitual. Mesmo quando voltarem a funcionar normalmente, calcula-se que os restaurantes que seguirem todas as regras vão operar com 30% de sua capacidade, para se amoldar ao conceito de aglomerações moderadas. A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes lançou uma cartilha com extensa — e custosa — lista de orientações. “O ser humano continuará buscando opções para confraternizar, e o restaurante seguirá como um local para isso, mas nossos hábitos já mudaram. O cidadão precisa ser o gestor do próprio risco e solidário com o risco alheio”, diz o filósofo Francisco Razzo.

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Os novos manuais sendo postos em vigor no mundo recomendam mais: que os talheres venham embrulhados e que o ambiente seja higienizado a cada meia hora, além de proibirem os bufês expostos e até a oferta de limão em fatias. Muitas das mudanças agora adotadas deverão deixar de existir quando tratamentos e a tão aguardada vacina contra a Covid-19 estiverem disponíveis, mas o setor prevê que a preocupação com a higiene veio para ficar — com vantagens para todos os envolvidos. E aí a palavra restaurante, que vem do latim restaurare, ou restaurar, e foi usada pela primeira vez em um cartaz onde se lia “Vinde a mim os que têm estômago vazio e eu o restaurarei”, fará mais sentido ainda.

Publicado em VEJA de 13 de maio de 2020, edição nº 2686

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