Se nos Estados Unidos cresce a aposta para a queda dos juros, por aqui a tendência é outra. As expectativas de uma possível alta da taxa Selic já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) ganharam força entre os agentes do mercado financeiro que já precifica uma Selic maior em setembro. Descontrole fiscal, aquecimento do mercado de trabalho, as expectativas de alta da inflação e câmbio pressionado são os principais motivadores para isso.
Recente relatório da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado, indicou que seriam necessários mais 64,8 bilhões de reais para que o governo consiga cumprir a meta de déficit zero em 2024, ou no mínimo 3 bilhões de reais, se considerada a margem de tolerância.
Um dos primeiros especialistas a colocar na mesa de apostas a alta da Selic, Marcelo Fonseca, economista-chefe da Reag Investimentos, acredita que a elevação de 0,5% seria eficaz para corrigir a rota. Ele destaca que a questão central é a dinâmica fiscal insustentável do país, um problema que vem crescendo desde 2022, com a aprovação da PEC de transição, que ampliou o teto de gastos e, posteriormente, agravado pelas incertezas a respeito do novo arcabouço fiscal.
“Hoje a gente não tem mais um conjunto de regras fiscais que garantam a percepção de que as contas públicas são sustentáveis. O arcabouço não tem instrumentos de controle de gastos”, diz. O receio de perda de autonomia do BC, com a troca de comando no fim do ano, é mais um ruído que ressuscita o medo de insolvência da dívida pública, que chega ao fim de 2024 correspondendo a 80% do Produto Interno Bruto (PIB), numa trajetória de alta de cerca de quatro pontos ao ano. “E nós não temos regras fiscais que ancorem a percepção de risco de insolvência.”
Na terça-feira, 20, o diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, disse que a função da autarquia é ser o “chato da festa”. Fonseca faz outra analogia: “É o garçom que pede licença e traz a conta do restaurante. Vocês comeram, beberam, fizeram a festa, agora a conta é essa”.
Para ele, o cenário internacional é secundário e não é o principal problema. Mesmo que o Fed (banco central dos EUA) corte os juros, isso não resolverá os desafios internos do Brasil, como a perda de credibilidade e o superaquecimento da economia. Esses problemas são domésticos e foram causados internamente, então é o Brasil que precisa corrigi-los, independentemente do que acontece no cenário internacional.
“Acho que se o Fed cortar 0,5% é uma boa oportunidade para o Banco Central ser duro, talvez ajude no tamanho do ciclo, ajude no tamanho do passo, [uma oportunidade para] o Banco Central ser duro e reafirmar o diagnóstico, que é um diagnóstico doméstico”, diz.
Com a confiança no cenário fiscal brasileiro em baixa, a expectativa de inflação vem crescendo, conforme mostra o relatório Focus, e as estimativas extraídas dos títulos públicos indexados à inflação. “Quem tem o dever fiduciário de cuidar do seu dinheiro, dinheiro de terceiros, está com medo e está pagando um certo prêmio para se proteger do risco de inflação. Você tem um problema de expectativa”, diz o economista, a favor de que a conta seja entregue o quanto antes pelo BC.
Na mesma linha, José Alfaix, economista da Rio Bravo, também prevê um aperto monetário suficientemente restritivo. “A expectativa do início de um novo ciclo de alta na Selic tem crescido entre os economistas e já é precificada pela curva de juros”, diz.
Sidney Lima, analista CNPI da Ouro Preto Investimentos, também vê como provável o aumento da Selic na próxima reunião do Copom como uma forma de manter a credibilidade da autoridade monetária. “Vale lembrar que o crescimento econômico robusto do Brasil, impulsionado por um déficit fiscal elevado, tem sustentado a economia, mas também aumentou as pressões inflacionárias e principalmente uma certa necessidade de se reforçar a credibilidade quando a condução política monetária por aqui.”
Nesta semana, a XP Investimentos também revisou sua projeção para a Selic, prevendo que o ciclo de alta comece em setembro e que a taxa termine o ano em 11,75%. A expectativa é de que a taxa atinja 12% em janeiro de 2025. A XP anteriormente previa que a Selic terminaria 2024 em 10,5%, mas ajustou essa previsão devido a condições econômicas.
O relatório, assinado pelo economista-chefe Caio Megale e sua equipe, sugere que o Copom deve realizar um ciclo moderado de ajuste, com uma alta inicial de 0,25 ponto percentual, seguida por duas altas de 0,50 pp e uma última de 0,25 pp. Para o final de 2025, a XP mantém a previsão de 12%, mas está aberta a reavaliar essa projeção conforme novos dados econômicos surgirem.