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Philipp Schiemer: Acordo Mercosul-UE só será eficaz com reformas 

Presidente da AHK (Câmara de Comércio Brasil-Alemanha) e da Mercedes no Brasil afirma que sem mudanças tributárias, indústria não consegue competir

Por Larissa Quintino 10 jul 2019, 14h37
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  • Philipp Schiemer, 54 anos, presidente da AHK (Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha) e líder da Eurocâmaras (associação que reúne outras câmaras europeias), classificou como “loucura” a demora de 20 anos para que o histórico acordo entre o Mercosul e a União Europeia, firmado em 28 de junho pelos blocos, fosse firmado. Segundo o executivo, que preside a montadora alemã Mercedes Benz no Brasil, para que a competitividade entre empresas brasileiras e europeias seja possível, é preciso que a reforma tributária seja aprovada. “Nenhum lugar exporta seus impostos como o Brasil.”

    A outra reforma em pauta, a da Previdência, é vista como prioritária para o Brasil. “Sem a Previdência, o risco de colapso da economia é muito grande. Com ou sem acordo”, afirma Schiemer. O texto está em votação neste momento da Câmara dos Deputados. Segundo o executivo, para aproveitar todas as oportunidades que irão surgir, é necessário que as empresas brasileiras se modernizem para enfrentar a concorrência vinda do velho continente. Confira abaixo a entrevista com Schiemer.

    Qual a importância do acordo de livre comércio firmado entre o Mercosul e a União Europeia? Para nós, o acordo é um marco importante na história das relações comerciais entre Europa e Mercosul, e com mais destaque para o Brasil. Primeiro porque demorou 20 anos para ser anunciado, e isso já é uma loucura. E porque abre um grande mercado, representando quase 25% do PIB mundial. Isso traz perspectivas muito boas para ambos os lados para aumentar o comércio. Especialmente para pessoas que estão trabalhando aqui no Brasil, abre perspectivas muito mais promissoras. Até então, as companhias estavam voltadas ao mercado interno. Fora o Mercosul, o Brasil tem poucas relações comerciais, e o acordo abre possibilidade de atingir mercados maiores. Fala-se em ganho estimado de 125 bilhões de dólares para o PIB brasileiro –um volume bem considerável.  

    Estamos em um momento de desaceleração de grandes economias mundiais, como pode ser visto com a China. Foi um contexto importante para aumentar a relação dos blocos? Na minha visão, foi um momento interessante, porque o Brasil e o Mercosul estavam isolados do mundo. O futuro crescimento dos países pode ser por meio de um comércio global. 

    Esse acordo para ser ratificado precisa passar pelo Parlamento europeu e pelos Congressos dos países do Mercosul. Em quanto tempo começará a valer? Sabemos que essa ratificação precisa passar pelos parlamentos e nós da Câmara de Comércio vamos monitorar com autoridades brasileiras e representantes da União Europeia, e a perspectiva é que seja feito em dois anos. Mas pode ser que leve mais tempo. Por outro lado, isso é bom, porque o acordo precisa ser detalhado. 

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    O Brasil tem uma pauta prioritária no Congresso que é a reforma da Previdência. O acordo entre o Mercosul e a União Europeia pode ser discutido ao mesmo tempo que essa reforma? Podem andar paralelamente. A reforma da Previdência é fundamental para aumentar o crescimento. Todo mundo sabe disso. Sem ela, os riscos de um colapso da economia brasileira é grande, com ou sem o acordo comercial. Agora, o acordo cria uma perspectiva para o futuro. Para começar a ser discutido, é preciso que ele seja traduzido em todas as línguas. A discussão vai começar no segundo semestre, e nós esperamos que até lá o debate sobre a Previdência já tenha acabado e o Congresso já esteja iniciando a reforma tributária. 

    O Mercosul exporta commodities e fez um acordo com países extremamente industrializados, como a Alemanha. Esse pacto tem como fomentar a indústria brasileira? Ou para o país o comércio vai ser restrito ao agronegócio? Não há dúvida de que ele fortalece a indústria. O setor vai ter acesso a tecnologia de maneira mais barata do que hoje. Ela pode importar, no futuro, peças e máquinas da União Europeia e isso vai baratear o custo de produção e aumentar a competitividade. As indústrias brasileiras terão mais chance de exportar os seus produtos para a unidade europeia. Por outro lado, teremos a concorrência no Brasil, e isso há de fortalecer, mas são necessárias melhores práticas. Só empresas competitivas internacionalmente tem um futuro. Para a agricultura, o Brasil se destaca como celeiro do mundo. Se analisarmos friamente, isso é pouco. O Brasil poderia começar a trabalhar essa matéria prima e vender produtos semiprontos para se industrializar. Com esse acordo, abre-se uma perspectiva para que isso no futuro seja possível. 

    Como o senhor avalia que esse acordo vai afetar a indústria automotiva brasileira?  O acordo prevê um período de adaptação pára o setor, com uma cota máxima de 50 mil carros europeus por ano em um período de sete anos. A indústria, tanto a automotiva como a geral, apoia a abertura do mercado brasileiro. Mas ela quer que isso seja feito em etapas e gradativamente para conseguir competir. E isso está sendo contemplado pelo acordo. 

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     O que é preciso para a indústria ser mais competitiva? O que o setor, tant o automotivo quanto o geral reclama é que são necessárias condições para competição em condições iguais, o que não acontece hoje. O sistema tributário no Brasil obriga empresas brasileiras a colocarem em seu custo de exportação os tributos. Cerca de 38% do preço do produto que mandamos para fora está composto por impostos. Isso não existe em nenhum outro lugar do mundo. Estamos discutindo com o governo que essa tributação do comércio exterior seja abandonada na reforma tributária. Tem que ser eliminado. Não faz nenhum sentido que o Brasil exporte seus impostos. E, no fundo, esta é a discussão que estamos tendo com as autoridades brasileiras. 

    Além da indústria e do agronegócio, quais são os outros setores que serão mais beneficiados pelo acordo? Há algum que pode ser prejudicado? A contribuição vai ser grande em todos os setores. As empresas podem olhar o acordo e a competição como risco ou como chance. A minha interpretação é que as companhias brasileiras vão ser modernizar e ser mais competitivas, pois esse é o jeito dos negócios prosperarem em um ambiente de concorrência. Para o consumidor, vai ser muito bom, porque os produtos vão sair da Europa mais baratos, e o mercado terá itens de qualidade a preços acessíveis. 

    No agronegócio, alguns produtos têm cotas. No caso da carne, são 99  milhões de toneladas que o Mercosul pode exportar sem taxas. Os países do bloco, incluindo o Brasil, são grandes exportadores. Não deveria ter sido negociado algo melhor? Eu não sou especialista em agronegócio, então não compete a mim a comentar essa questão. Mas independentemente do setor, o importante é a integração. Com o acordo, o Mercosul se coloca dentro do comércio legal. Se uma coisa ou outra pode ser melhorada, é uma outra questão. Todo início é um início e o importante é que o início for feito. E isso faz com que outros acordos de livre comércio sejam possíveis no futuro. 

    Um dos princípios do acordo é a fomentação de pequenos e médios negócios. Como o senhor vê isso? Nós, da Câmara de Comércio Brasil e Alemanha, representamos no Brasil 1.200 empresas. Das quais, 100 são grandes. O restante é média e pequenas. Diariamente temos dezenas de requisições de empresas menores da Alemanha ou da Europa que querem vir ao Brasil e que, por ora, não vieram devido a dificuldade: tributária, aduaneira. O acordo com a União Europeia vai dar mais oportunidades. Seja para empresas europeias virem para o Brasil e gerarem emprego seja para que empresas brasileiras queiram se aventurar e competir no mercado europeu. As pequenas e médias empresas são a base da economia tanto da Europa como do Mercosul.

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