Enquanto Brasília vivia na última semana uma reforma ministerial particularmente turbulenta, outra grande mudança era concluída nas maiores estatais brasileiras. A reviravolta foi iniciada em meados de fevereiro com a tumultuada troca da chefia da Petrobras, que ficará com o general Joaquim Silva e Luna assim que tiver seu nome aprovado pelo conselho de administração na segunda, 12 de abril. Nos últimos dias, também se confirmou a nomeação de Fausto Ribeiro para o Banco do Brasil e de Rodrigo Limp para a Eletrobras. Com isso, as três gigantes do Estado que iniciaram o governo com presidentes indicados pelo Ministério da Economia terão, a partir de agora, a marca do presidente Jair Bolsonaro. E isso preocupa.
Em comum, os executivos escolhidos são “novatos” para a função que vão exercer. Ribeiro, do BB, e Limp, da Eletrobras, são vistos como profissionais de pouca experiência para cargo de alto comando. O primeiro, funcionário de carreira do banco, exercia funções do nível de gerente até setembro do ano passado, quando assumiu a presidência da área de consórcios. Depois de ter sido indicado na última segunda-feira, 29, precisará agora ser aprovado em assembleia no dia 28 de abril. É uma ascensão que contraria os ritos internos no banco. Segundo fontes ouvidas por VEJA, o fato de ser bolsonarista o ajudou — e muito. Por sua vez, Limp detém reconhecido traquejo político. Foi secretário de Energia Elétrica do Ministério de Minas e Energia (MME) e ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Embora muito bem-visto pelas ideias liberais, não possui experiência no comando de empresas. O militar Silva e Luna não pode ser chamado de inexperiente. Foi ministro da Defesa de Michel Temer e comandou a estatal responsável pela hidrelétrica de Itaipu. Mas é um calouro no complexo setor de petróleo.
O desafio comum aos três será conquistar a confiança do mercado sem desagradar a Bolsonaro, que pediu a cabeça dos antecessores no BB e na Petrobras por motivos meramente eleitoreiros. No banco, o correto plano de fechamento de agências e demissões elaborado por André Brandão foi mal recebido pelo Planalto. Já a estratégia de Roberto Castello Branco de seguir, na Petrobras, os preços de mercado dos combustíveis causou sucessivas altas que desagradaram aos caminhoneiros, categoria que apoiou Bolsonaro nas eleições de 2018.
De todas, a que mais preocupa é a Petrobras. Desde a interferência do presidente na companhia, as ações sofreram fortemente, indicando que o investidor puniu o uso político da empresa. Até a correlação entre altas dos preços do barril de petróleo no mundo e das ações da estatal deixou de existir. Enquanto o petróleo subiu 23% em 2021, os papéis da empresa caíram cerca de 17%. Dos 92 bilhões de reais que as companhias listadas na B3 perderam no primeiro trimestre do ano, a Petrobras detinha 60 bilhões de reais em valor de mercado.
A instabilidade se refletiu no conselho da empresa, no qual seis membros deixaram o posto por discordarem da forma como foi feita a troca do presidente. O que se imagina entre analistas e investidores é que Silva e Luna não cederá à pressão para tabelar os combustíveis, mas isso só será confirmado com o tempo. “O mercado vai ter de esperar para ver. Se o general der sorte, a conjuntura pode ajudar. Para isso, o real precisa se valorizar e o preço do petróleo, cair”, diz David Zylbersztajn, ex-diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP).
Também no BB ocorre uma debandada no conselho, com a saída de quatro membros. Para substituí-los, foram indicados nomes com experiência profissional robusta e ligações com instituições cristãs. A maior briga, porém, se desenha pelos bem remunerados cargos de vice-presidentes. Pelo menos quatro dos sete deles estarão vagos em breve. Até o momento, as escolhas vinham sendo feitas por meritocracia. Agora, apoiadores de Bolsonaro acreditam que terão vantagem.
A mudança que aparentemente implica menos sobressaltos é a da Eletrobras. Para diminuir os ruídos da intervenção na Petrobras e agradar ao mercado, o governo mandou ao Congresso uma medida provisória para vender a empresa energética. Por isso, apesar da pouca experiência de comando, Limp tem todas as cartas na mão para conduzir a privatização da companhia. “Além de ser respeitado como técnico, ele conhece o projeto a fundo, por ter trabalhado conosco desde o início”, afirma o secretário especial de Desestatização, Desinvestimentos e Mercado, Diogo Mac Cord. Agora, será o momento de conferir se os novos comandantes estarão à altura do mar turbulento que se desenha à sua frente.
Publicado em VEJA de 7 de abril de 2021, edição nº 2732