Em outubro do ano passado, burburinhos de uma fusão para lá de luxuosa tomaram conta do mercado. O conglomerado francês LVMH, dono da marca Louis Vuitton, começou a negociar a aquisição da Tiffany & Co., a icônica marca de joias americana. Um mês depois, os franceses confirmaram a aquisição da companhia em um negócio de 16,2 bilhões de dólares. A previsão era que o acordo fosse sacramentado em junho deste ano, mas, em meio a pandemia do novo coronavírus, a futura dona da joalheria adiou a conclusão da fusão por três vezes e depois afirmou que desistiria da compra sob alegação de questões diplomáticas entre os governos franceses e americanos. O namoro entre as marcas não terminou com um diamante para sacramentar o casamento, nem com um café da manhã na Quinta Avenida, e sim com um processo. Nesta semana, a Tiffany ingressou com uma ação na Justiça dos EUA pedindo a concretização do negócio pelos termos acordados. Por outro lado, a Louis Vuitton alega má gestão da joalheria centenária durante a pandemia para conseguir romper o acordo e não fazer a fusão bilionária.
A aquisição estava prevista para ser concluída em junho deste ano, mas, em meio à pandemia, o prazo foi estendido para 24 de agosto e, posteriormente, para 24 de novembro. Como a pandemia foi danosa para o mercado de luxo em todo mundo, Bernard Arnault, dono do conglomerado e homem mais rico da França, tentou reabrir as negociações para baixar o preço previsto, de 135 dólares por ações, porém uma nova rodada de conversas não foi aceita pela joalheria.
No anúncio da desistência, feito na última quarta-feira, a LVMH argumentou ter recebido uma carta do Ministério das Relações Exteriores da França solicitando novo atraso no negócio, até o início de 2021, por ameaças do governo americano de impor taxas sobre produtos franceses de luxo. Estados Unidos e União Europeia vivenciam escalada de tensões comerciais após os europeus anunciarem a criação de um imposto para taxar as gigantes do setor de tecnologia. A Tiffany questiona que a carta seria uma forma de tentar fugir do acordo. Segundo o jornal The Wall Street Journal, autoridades diplomáticas francesas afirmam que não há implicação nenhuma na compra da Tiffany nas negociações comerciais entre os países. Quem coordena as tratativas de taxação é o Ministério das Finanças, que não teria coordenado o envio da carta. O texto mandado pelo ministro das Relações Exteriores, Jean-Yves Le Drian, seria a resposta ao pedido de ajuda feito por Arnault para se desfazer da aquisição.
Após a reação da Tiffany em protocolar uma ação contra a empresa francesa no tribunal de Delaware, a Louis Vuitton afirmou que os resultados do primeiro semestre da joalheria e suas perspectivas para 2020 “são muito decepcionantes” e significativamente inferiores aos de marcas comparáveis do Grupo LVMH durante este período. Em comunicado, a empresa afirmou que a má gestão da Tiffany durante a crise, significa que a empresa sofreu um evento adverso relevante, que segundo o acordo de fusão permitiria à LVMH desistir do negócio.
Uma cláusula material adversa é uma parte padrão dos acordos de fusão que permite aos compradores desistir se ocorrer um evento que prejudique o alvo antes do fechamento. Os tribunais de Delaware, que têm jurisdição sobre a aquisição da Tiffany, permitiram apenas uma vez que uma empresa desistisse de um negócio invocando tais cláusulas. Ou seja, há uma grande disputa jurídica pela frente, prevê o The Wall Street Journal.
A LVMH citou como evidência de má gestão a decisão de pagar todos os dividendos durante a pandemia. Nos seis meses encerrados em 31 de julho, as vendas da Tiffany caíram 37% e a empresa perdeu 32,7 milhões de dólares. Entretanto, na avaliação da GlobalData PCL, empresa de análises de mercado, o desempenho da Tiffany foi “razoavelmente bom” comparado com o restante do mercado de luxo. A queda nas vendas, aliás, foi em linha com a divisão de joias e relógios do conglomerado LVMH. A redução foi de 38% e o prejuízo operacional de 20 milhões de dólares. O lucro geral da LVMH no primeiro semestre foi de US $ 522 milhões, uma queda acentuada, mas ainda impulsionada pelas fortes vendas na Louis Vuitton, Dior e sua marca de conhaque Hennessy.
A tentativa de defesa da gigante francesa de luxo é mostrar às autoridades que não tem culpa de a aquisição ter dado errado. A empresa informou que planeja buscar a aprovação para a fusão da Comissão Europeia, apesar de insistir que o negócio não pode acontecer. Essa medida tem como objetivo refutar um dos argumentos que a Tiffany fez em seu processo: que a LVMH estava se arrastando para obter aprovações regulatórias enquanto buscava maneiras de sair do negócio.