Pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) enviada ao Congresso, o governo prevê um salário mínimo de 1.302 reais para 2023, um aumento de 90 reais em relação ao valor atual, de 1.212 reais. Como o valor é calculado considerando apenas a inflação estimada para 2022, os recentes recuos no índice tendem a diminuir o valor projetado. Com isso, o salário mínimo em 2022 possivelmente será menor que o estimado anteriormente pelo governo. Além disso, a proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, de desindexar os salários da inflação pode enxugar ainda mais essa recomposição, caso Jair Bolsonaro seja reeleito e a proposta seja aprovada, pois não haverá a obrigatoriedade de correção pela inflação. A proposta de desindexação do mínimo estaria em um novo marco fiscal, sendo preparado pelo ministério e a ser apresentado.
O governo Bolsonaro não seguiu a regra de reajuste do salário mínimo vigente entre 2011 a 2019, que permitia reajuste real do piso nacional. A gestão preferiu se ater à obrigação constitucional de repor a inflação utilizando o INPC. Anteriormente, os reajustes do salário mínimo eram calculados pela inflação e pela variação do PIB para garantir aumento real acima da inflação. Esse modelo vigorou por oito anos e fazia parte da política do governo Dilma Rousseff de garantir aumentos reais acima da inflação. “Na maior parte desse tempo, o cálculo garantiu aumento real, com exceção de 2017 e 2018, anos que houve retração do PIB”, diz Rodrigo Simões, economista e professor da Faculdade de Comércio de São Paulo.
Em 2020, ano em que o governo Bolsonaro alterou a mudança no cálculo, o reajuste no salário foi de 4,1%, menor que a inflação do ano anterior, de 4,3%. Neste ano, o reajuste dado foi igual ao índice de inflação, de 10,1%. Nos últimos quatro anos, não houve aumento real do salário e uma nova regra de reajuste pode aprofundar ainda mais o salário mínimo no Brasil, que possui o segundo pior salário na lista de 31 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Recentemente, Paulo Guedes disse que pretende desindexar o reajuste do salário mínimo e das aposentadorias do índice de inflação. De acordo com reportagem do jornal Folha de S.Paulo, a proposta é de corrigir o salário mínimo não com base na inflação passada, mas na expectativa futura ou meta da inflação. Caso haja essa mudança de regra, a tendência é diminuir a recomposição do salário. A meta de inflação para este ano, por exemplo, é de 3,5% e a projeção de inflação para o ano é atualmente de 5,6%, segundo o Boletim Focus.
Se essa regra tivesse sido aplicada ao longo dos últimos 20 anos, o salário mínimo atual seria de 502 reais, segundo cálculo do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo. Já, caso o governo Bolsonaro tivesse seguido a política de reajuste vigente entre 2011 e 2019, o salário poderia ser 1.058 maior, segundo cálculos feitos pela LCA Consultoria.
Após repercussão negativa às vésperas da eleição, Guedes não negou a proposta de desindexar, mas garantiu que o “salário mínimo e as aposentadorias serão corrigidas, no mínimo, pelo índice da inflação”. Segundo especialistas ouvidos por VEJA, as afirmações de Guedes sinalizam que a ideia do governo é usar um índice menor dentro das categorias medidas pelo INPC, levando sim a uma correção do salário, mas a uma base menor. Um dos exemplos que pode elucidar a proposta foi a troca realizada do IGMP pelo IPCA para a correção dos aluguéis durante a pandemia. “A ideia obviamente é pagar menos. O salário mínimo pode nem ser corrigido pela inflação cheia e ainda ficar muito aquém de um ganho real, o que não acontece faz tempo”, diz Piter Carvalho, economista-chefe da Valor Investimentos.
A nova regra serviria como um instrumento de “correção” do teto de gastos – que foi rompido neste ano, com o excesso de benefícios concedidos para aumentar a popularidade de Bolsonaro em ano eleitoral – desobrigando o governo a corrigir os salários conforme a inflação, ficando livre para reajustar o valor que julgar suficiente. O reajuste do salário mínimo pela inflação, como funciona atualmente, é uma determinação constitucional, por isso uma PEC seria necessária para alterar a regra, o que segundo o próprio ministro em almoço para executivos, deve ser incluída na PEC para tributar lucros e dividendos.