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A primavera está de volta? Investimentos em startups voltam a crescer

Além de festejar o retorno do venture capital, vale observar o que o mercado aprendeu no período gelado que atravessou

Por Marcos Coronato
28 set 2024, 08h00
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  • Maria Tereza Azevedo, do SoftBank: o setor entrou em nova fase, mas ainda exige cautela
    Maria Tereza Azevedo, do SoftBank: o setor entrou em nova fase, mas ainda exige cautela (./Divulgação)

    A previsão é de tempo melhor para investimentos neste final de 2024. Mas, 

    Começou como um raiozinho de sol através da névoa: depois de um período de dois anos de queda contínua no volume de investimentos em startups no mundo, o fluxo se estabilizou, no início deste ano. O fenômeno ocorreu, com alguns meses de diferença, no Brasil, nos Estados Unidos e em outros mercados, principalmente por causa do ânimo dos investidores de venture capital com novas empresas construindo ou usando inteligência artificial. O número de negócios fechados continuou em queda (ou seja, menos start­ups conseguem ser selecionadas), mas o dinheiro voltar a correr é uma mudança importante. O segundo semestre começou com expectativas moderadas, mas melhores, de que o investimento vai aumentar nos próximos meses. Isso encerraria um período de seca brava — e de aprendizado bem valioso para empreendedores e investidores.

    O tempo que termina (ou que parece terminar, pelos sinais deste momento) ficou conhecido, no Brasil, nos Estados Unidos e em outras grandes economias, como “o inverno das start­ups”. Foi uma fase feia, mesmo. No Brasil, o ritmo de investimentos começou a cair em 2021 — de 200 operações por trimestre, no fim daquele ano, para menos da metade no início de 2024. As start­ups selecionadas ainda poderiam ter alguma alegria, já que havia menos delas para dividir o bolo e cada uma poderia ter recebido mais dinheiro. Nada disso. As escolhidas passaram a receber, em média, bem menos capital, porque o volume total investido despencou da casa de 2,6 bilhões de dólares no segundo trimestre de 2021 para um sétimo disso no primeiro trimestre deste ano, pelas contas da consultoria KPMG. O número de novas start­ups unicórnios — aquelas avaliadas em ao menos 1 bilhão de dólares — passou de dez em 2021 para uma em 2023. E a mais reluzente oportunidade de lucro para os grandes investidores, a abertura de capital da start­up (ou IPO, oferta pública inicial de ações), apagou-se. Não houve mais nenhuma desde 2021. O inverno das start­ups foi ruim mesmo em nações com forte base tecnológica, como China, Japão e Israel. Mas períodos assim são péssimos para uma economia que precisa de muito mais inovação e produtividade, como a brasileira.

    Eric Acher, da Monashees: a empresa liderou investimento no Brasil, na fintech NG.Cash
    Eric Acher, da Monashees: a empresa liderou investimento no Brasil, na fintech NG.Cash (Piaras Ó Mídheach/Getty Images)

    Agora, aparecem sinais de que entramos numa nova fase. O volume de investimento em startups no Brasil cresceu no segundo trimestre deste ano de forma expressiva, em comparação com o mesmo período no ano anterior — um salto de 160%, segundo a KPMG. Desde 2022 não se via uma evolução assim. Algumas operações chamaram atenção: em março, a climatech Umgrauemeio, que oferece tecnologia para enfrentar queimadas e incêndios florestais, captou 18,7 milhões de reais de um grupo de investidores, incluindo a gestora brasileira Baraúna Investimentos; em abril, a fintech QI Tech estendeu uma rodada de investimentos (iniciada em 2023) e captou 50 milhões de dólares adicionais, numa operação comandada pela americana General Atlantic; em maio foi a vez de outra fintech, a NG.Cash, que captou 65 milhões de reais com um grupo de investidores liderado pela brasileira Monashees.

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    A mudança no ambiente também apareceu no radar da consultoria Distrito, especializada em formar parcerias entre start­ups e grandes empresas. “O mercado de VC global deve se aquecer ainda mais nos próximos meses com a redução das taxas de juros nos Estados Unidos, o que atrai capital para ativos de risco, incluindo os destinados a países emergentes. Já vemos a retomada das grandes rodadas de investimento”, diz Victor Harano, coordenador de pesquisas da consultoria. Em 18 de setembro, mesmo dia em que houve corte de juros básicos nos EUA, houve aumento no Brasil, e com expectativa de mais alta pela frente. Mas, no mundo do venture capital, os juros brasileiros devem pesar menos. A Distrito estima que o volume de aportes na América Latina avance 15% este ano, e a fatia do Brasil no bolo já está crescendo: passou de 43% no primeiro trimestre para 57% no segundo. Para esse leve aquecimento mandar o inverno embora de uma vez, os investidores precisam voltar a enxergar a possibilidade de IPOs. O presidente da B3, Gilson Finkelsztain, apresentou à XP uma avaliação de que há de cinquenta a 100 empresas preparadas para fazer abertura de capital, que deve retornar no início de 2025. A primavera parece próxima — mas o mercado aprendeu alguma coisa com o inverno que passou?

    Ciclos com altas e baixas intensas sempre vão fazer parte desse mercado. Nos Estados Unidos, o francês Georges Doriot, considerado o pai do venture capital, queria aproveitar o aquecimento da economia pós-Segunda Guerra Mundial, por isso fundou sua empresa de investimentos, a ARDC, em 1946 — só para ver o país entrar em recessão em 1948. Foi uma recessão curta, e Doriot enriqueceu nas décadas seguintes graças às start­ups, mas o alerta estava lá, desde o início. Neste século, o segmento sofreu com o estouro da bolha da internet em 2000 e com a crise nascida nas hipotecas americanas em 2008. De 2010 em diante, porém, vários fatores se alinharam para formar um, digamos, verão perfeito para as start­ups: a difusão comercial de tecnologias revolucionárias, como telefonia 4G, cloud, big data, carros elétricos, energia renovável e plataformas de economia colaborativa, a disparada no número de investidores em start­ups nascentes, o encorpamento dos investidores em start­ups maduras. Em 2018 surgiu o primeiro unicórnio brasileiro, a 99. Na América Latina, foi marcante o lançamento de um fundo regional do SoftBank, em 2019. O ambiente já era muito favorável aos investimentos. Aí veio o fator imprevisível que transformou aquele verão em superaquecimento.

    Pedro Mac Dowell, da QI Tech: primeira startup brasileira a virar unicórnio em 2024
    Pedro Mac Dowell, da QI Tech: primeira startup brasileira a virar unicórnio em 2024 (./Divulgação)

    A pandemia de covid-19 prejudicou setores tradicionais, mas acelerou ainda mais negócios inovadores, por causa do estímulo à digitalização e das injeções de dinheiro dos governos para tentar reanimar o mercado. Esses fatores pesaram no rumo profissional de Carlos Simonsen, que entrou na década passada como executivo financeiro em grandes companhias (passou por gigantes como Itaú BBA e AB InBev) e saiu como investidor e caçador de start­ups promissoras. Simonsen é cofundador da Upload Ventures, com participações em empresas como Digibee, Olist e Wildlife. “Os anos de 2020 e 2021 foram de capital abundante — houve excesso de fundos”, diz o investidor. “E depois disso veio uma correção brutal.” Mas isso não quer dizer que o inverno das start­ups tenha sido tempo perdido.

    Foi um período de reforçar as startu­ps que haviam recebido investimento na alta — refinar modelos de negócio, enxugar operações, melhorar a gestão. O processo foi doloroso mas, em retrospecto, é possível ver que o mercado apenas retoma a trajetória de crescimento mais moderada, sem superaquecimento, que havia sido interrompida em 2020.

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    Eimi Arikawa e Rogerio Cavalcante, da Umgrauemeio: captação de 18,7 milhões de reais para tecnologia de combate a queimadas
    Eimi Arikawa e Rogerio Cavalcante, da Umgrauemeio: captação de 18,7 milhões de reais para tecnologia de combate a queimadas (Fotos/Divulgação)

    O gigante SoftBank nunca parou de investir — mesmo na secura de 2023, analisou 106 empresas e colocou dinheiro em sete na América Latina. Outra parte do trabalho, menos visível e igualmente difícil, seguiu em ritmo forte o tempo todo. “Dispendemos bastante energia e capital na gestão do nosso portfólio (com 75 empresas latino-americanas e 470 no mundo). Estamos mais criteriosos em relação a efi­ciência na alocação de capital”, diz Maria Tereza Azevedo, líder de investimentos do SoftBank para a América Latina. “Os últimos anos forçaram empresas e investidores a ser mais eficientes. Não há mais espaço para crescimento a qualquer custo.” O SoftBank ficou mais rigoroso também ao estudar tamanhos de mercados e enxergar saídas no investimento. A executiva acredita que o período de seca tenha selecionado as boas empresas e trazido as valorações para níveis mais razoáveis. Harano, da Distrito, concorda: “O mercado amadureceu. Os grandes fundos exigem mais na avaliação das empresas, na análise das métricas de crescimento e na responsabilidade financeira dos sócios, para evitar crescimento incompatível com o aumento das receitas”. Houve outro desdobramento positivo desse inverno que passou.

    As fontes de investimento e financiamento para start­ups se tornaram mais diversas. Há opções como venture debt, debt financing e créditos em serviços, formatos adaptados para empresas que correm os riscos inerentes à inovação tecnológica, mas já estão no mercado. Um dos participantes nesse segmento é a AWS, braço da Amazon que ofereceu, nos últimos sete anos, 6 bilhões de dólares em créditos de serviços para start­ups selecionadas, juntamente com mentorias e conexões com investidores. A aposta da AWS é que essas empresas cresçam e se tornem clientes de serviços como cloud e inteligência artificial. Em setembro, a companhia anunciou que mais dez jovens empresas brasileiras estão em seu programa global de incentivo ao uso inovador de IA. “Acabou a fase de buscar crescimento sem se importar com o custo”, afirma Alvaro Echeverria, diretor de startups da AWS na América Latina. “Mas, para as start­ups mais sólidas e rigorosas com suas operações, as oportunidades são ilimitadas.”

    Publicado em VEJA, setembro de 2024, edição VEJA Negócios nº 6

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