Das bandas clássicas dos anos 60, The Who foi a que melhor traduziu os ideais da juventude rebelde. Criou versos nos quais dizia preferir “morrer a ficar velho” e óperas-rock sob o ponto de vista de adolescentes torturados. As apresentações ao vivo traziam atitudes de moleques insolentes, como destruir instrumentos no final dos shows. Sobreviventes do quarteto original (o baterista Keith Moon e o baixista John Entwistle sucumbiram aos excessos do rock), o vocalista Roger Daltrey e o guitarrista Pete Townshend estão com 75 e 74 anos, respectivamente. Isso não freou a fúria juvenil de Townshend, um dos maiores letristas de sua geração. WHO, décimo segundo disco do grupo e seu primeiro em treze anos, expressa bem essa sede pela eterna adolescência. Um verso da faixa Rockin’ in Rage vai direto ao ponto: “Estou fazendo rock com fúria / Já passei do meu apogeu / Negando a cortina final / E sem querer perder tempo”.
Os veteranos da banda continuam a exibir uma energia notavelmente explosiva. E ela se espraia também pelos bastidores. O lançamento do álbum foi precedido por perrengues ruidosos. Em uma entrevista, Townshend confessou ter se sentido aliviado pela morte dos outros dois ex-integrantes, porque sentia dificuldade em impor suas ideias musicais a eles. Depois, pediu desculpas pelo sincericídio, mas o fato é que o clima belicoso sempre moveu as relações no The Who (no auge, era como se a banda reunisse três instrumentistas-solo duelando no palco, enquanto o vocalista tentava se impor à frente). Se existe uma definição perfeita para o talento de Townshend como letrista, ela foi dada pelo crítico Jon Savage. Para ele, o compositor escreve em perpétuo “estado de guerra”: seus versos são contra tudo e contra todos. A beligerância não faltou à gravação do novo disco: Townshend e Daltrey mal se cruzaram no estúdio. Como já não se dão, os dois registraram suas partes em horários diferentes. Há rebeldia após os 70.
Publicado em VEJA de 11 de dezembro de 2019, edição nº 2664
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