O Prêmio Nobel de Literatura escolheu, pela primeira vez, uma mulher sul-coreana como exemplo sumário da arte escrita em 2024. Segundo a instituição, Han Kang, de 53 anos, recebeu a láurea pela “prosa poética que confronta traumas históricos e expõe a fragilidade da vida humana”, traquejo que evidencia nos romances A Vegetariana (2007), Atos Humanos (2014) e O Livro Branco (2016), todos publicados no Brasil pela Todavia. Após o troféu, é certo que a procura pela obra da autora aumentará — e, por isso, a editora já se moveu: a Todavia confirmou a VEJA que, em data não especificada de 2025, publicará a tradução do trabalho mais recente de Kang, Don’t Say Goodbye (Não me Despeço, em tradução livre).
Publicado na Coreia do Sul em 2021, o livro veio da vontade que a autora tinha de se debruçar sobre o tema do “amor máximo”, como descreve. Nele, uma romancista deve cuidar do pássaro de estimação de sua amiga acidentada enquanto a tutora está no hospital. A tarefa a leva até a ilha de Jeju, no Estreito da Coreia, e a coloca no meio de uma intensa tempestade de neve, que quase a impede de chegar a seu destino. O desconforto climático, no entanto, não se compara à dor que descobrirá na casa, cheia de memórias do massacre político que acometeu a província em 1948, quando civis se revoltaram contra autoridades da Primeira República da Coreia do Sul e da Comissão Temporária das Nações Unidas para a Coreia. Passado e presente se conectam por meio da matriarca da casa visitada, Jeong-sim, que passou décadas tentando encontrar o filho desaparecido na tragédia, busca que tem reverberações até na amizade que movimenta a trama.
Olhar abrangente
Traçando a linha entre o micro e o macro, o romance é bem encapsulado pela justificativa do Nobel. Ainda de acordo com a Academia Sueca, o trabalho da autora é caracterizado pela “dupla exposição da dor” que combina “tormentos físicos e mentais”, com uma forte conexão com os pensamentos orientais. Em seu livro mais popular, A Vegetariana, uma jovem começa a repelir carne e alimentos de origem animal. O que poderia se tornar uma trama panfletária sobre o veganismo, nas mãos da autora, se torna uma profunda análise sobre o machismo e sobre o que é ser humano — para além de se tornar vegetariana, a protagonista, aos poucos, almeja se tornar uma planta.
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