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Festivais: mudam as épocas, fica o espírito

Desde Woodstock, realizado há 42 anos, o encontro de bandas, cantores e milhares de pessoas em festivais servem para contar a história de uma geração e, nos últimos anos, para dar muito lucro e movimentar a economia

Por Da Redação
10 set 2011, 00h11
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  • Ao longo dos anos, as motivações políticas dos festivais foram deixadas à margem ou usadas como floreio publicitário e eles se transformaram em uma máquina de fazer dinheiro

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    Em um editorial publicado em agosto de 1969, a revista americana Time se referiu ao Festival de Woodstock, então recém-realizado, como um fato histórico de peso comparável ao de guerras, tratados e deposição de governantes. O fio que unia esses pontos, segundo a publicação, era o poder que certos movimentos populares têm de “afetar mentes e valores de uma geração”. Com o texto, a Time corrigia as próprias impressões sobre o evento, emitidas em um primeiro momento, e saía na frente na compreensão de seu significado. “Ao olhar para a história da América nos anos 1960, os historiadores do futuro poderão compreender o significado desse movimento”, dizia o editorial.

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    Como previu a revista, Woodstock se tornou um fato relevante e indicativo de mudanças políticas e sociais de sua época. E, 42 anos depois, modelo para eventos semelhantes no mundo inteiro em que uma espécie de celebração da juventude é perseguida em moldes cada vez mais profissionais. Nos próximos meses, quando acontecerão no Brasil festivais de grande porte como o Rock in Rio (23 de setembro a 2 de outubro), o Planeta Terra (5 de novembro) o SWU Music & Arts (12 a 14 de novembro), as referências à reunião de bandas em uma fazenda nos arredores de Nova York virão à tona. A relação não é descabida, basta que se guardem as proporções históricas e se atualizem os referenciais, dos comportamentais aos financeiros. Virão à tona, também, as engrenagens de uma poderosa e rica indústria que grassa em todo o mundo.

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    Ao longo dos anos, as motivações políticas dos festivais foram deixadas à margem ou usadas como floreio publicitário para atrair plateias. Eles se transformaram em produtos capazes de render muito dinheiro. Dezenas de bandas e milhares de pessoas são capazes de movimentar a economia de um lugar, gerar empregos diretos e indiretos, e exigem estrutura hoteleira, de alimentação e transporte. É o caso, no Rio de Janeiro, do frenesi por vagas em hotéis no período do Rock in Rio, que tem orçamento de 60 milhões de reais, entre cachês e estrutura de palco, e vendeu 600.000 ingressos antecipados. A estimativa do setor hoteleiro é de que, nos oito dias de festival, a ocupação chegue a 95% e que, nas contas da prefeitura, o evento movimente 500 milhões de reais em gastos com serviços.

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    Paulínia, no interior de São Paulo, que este ano receberá o SWU, não será a única a lucrar com o evento. Ao menos dez cidades em seu entorno serão afetadas. A estimativa da prefeitura da cidade é que cerca de 120 milhões de reais sejam gastos na região.

    Zeitgeist – A explicação para a reação eletrizada do público antes, durante e depois dos festivais é variada. Ter ido a um evento que pelo porte das bandas e cantores se anuncia inesquecível e afirmar-se como parte de um grupo são algumas razões — daí o grande slogan do Rock in Rio (RiR) serem as frases Eu Vou e Eu Fui. Para Luiz Felipe Carneiro, autor do livro Rock in Rio – A História do Maior Festival de Música do Mundo, todas as edições do RiR estão sob a sombra da primeira, realizada em 1985, ano subsequente ao fim da ditadura, quando o Brasil voltava a respirar largamente a liberdade. “Naquela época, shows internacionais no Brasil eram raríssimos e os festivais anteriores estavam quase sempre restritos à MPB. Ir às edições seguintes é como dar continuidade a essa história. As pessoas se sentem impulsionadas a fazer parte disso”, analisa.

    Apesar das diferenças no formato (local fechado e não aberto) e no repertório (MPB em vez de rock), os citados festivais da canção realizados no país nos anos 1960 ajudam a entender um pouco a aura de um festival como o Rock in Rio. Todos se assemelham a uma grande partida de futebol, na opinião de Ricardo Calil, diretor do documentário Uma Noite em 67, que reconstrói a célebre edição do Festival da TV Record de 1967, em que nomes como Caetano Veloso, Gilberto Gil e Chico Buarque disputavam o prêmio principal. Unidos por uma mesma paixão, desconhecidos se juntam como em torcidas organizadas, diz Calil. “Vaiava-se vencedor, perdedor, apresentador, os jurados, mas as pessoas também choravam emocionadas com suas canções preferidas”, diz Calil. O espírito de comunhão, muito próprio dos festivais, aponta em geral para a alegria, mas também pode descambar para a hostilidade — lembre-se da saraivada de garrafas d’água sobre o baiano Carlinhos Brown no RiR de 2001. “Em 1985, no primeiro Rock in Rio, eu e o Ney Matogrosso fomos muito hostilizados pelos metaleiros”, disse o cantor e compositor Erasmo Carlos em entrevista ao site de VEJA.

    Em suma, mudaram as motivações ideológicas e se agregaram profissionalismo, escala industrial, infra-estrutura e lucro, mas a disposição do público em festejar e aclamar seus ídolos — ou vaiar o ídolo alheio — permanece a mesma. Um festival pode não ter hoje os significados políticos de Woodstock, que se transformou em um grande ato contra a Guerra do Vietnã, além de ápice da liberação sexual em curso na época, e do RiR de 1985, que marcou a volta do Brasil à democracia, mas conserva a mesma química entre liberdade, atitude e experiência histórica e coletiva. Daí se pode entender como, por exemplo, cem mil ingressos do Rock in Rio foram vendidos em 2010 sem que nenhuma atração tivesse sido anunciada. “Isso é um sintoma de que a reunião de pessoas e uma marca forte podem ser superiores à música”, opina Luiz Felipe Carneiro.

    Em um artigo publicado em 2004, em que fala de sua predileção por shows de rock (em tese, algo tipicamente juvenil), o escritor britânico Nick Hornby, hoje com 54 anos, defendeu a disposição de ser sempre jovem. “Juventude não é muito diferente de saúde: você encontra em maior abundância nos jovens, mas todos nós desejamos ter acesso a ela.” Festivais de música, pela energia com que eletriza a plateia, são bons exemplos de como é possível viver ou revivê-la, às vezes sem se importar com o que se passa no palco.

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