Caetano Veloso escreveu um artigo para o jornal americano The New York Times comentando o cenário político do Brasil. Sob o título “Tempos sombrios se aproximam do meu país”, o cantor critica a campanha de Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência da República e alerta: “Os brasileiros vão enfrentar uma onda de medo e ódio”.
O cantor atribuiu o avanço de Bolsonaro, “um admirador de Donald Trump com ares de Rodrigo Duterte, o presidente das Filipinas”, a uma série de desfortúnios políticos, entre eles o impeachment de Dilma Rousseff (PT), em 2016, e os escândalos de corrupção que levaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à cadeia.
“Artistas, músicos, cineastas e formadores de opinião viram-se em um ambiente no qual ideais reacionários denigrem as tentativas de superar a desigualdade. As ideias socialmente progressistas tem sido associadas a um pesadelo venezuelano, como se os direitos das minorias fossem responsáveis por corroer os princípios religiosos e morais”, escreveu. “A ascensão de Bolsonaro como uma figura mítica cumpre as expectativas criadas por esse ataque à intelectualidade.”
O músico associa Bolsonaro à onda de violência que tem tomado o país. “Na verdade, nós já vimos o sangue”, continua, lembrando o assassinato do mestre de capoeira Moa, após uma discussão com um partidário do candidato do PSL em Salvador, na Bahia. “Sua morte causou luto e indignação na cidade.”
“Como uma figura pública, eu tenho o dever de tentar esclarecer os fatos”, continuou Caetano, que foi preso e exilado durante a ditadura militar brasileira. “Bolsonaro defendeu diversas vezes o regime militar de 1960 e 1970. Inclusive, durante a votação do impeachment de Dilma Rousseff, Bolsonaro dedicou seu voto a Carlos Alberto Brilhante Ustra, que dirigia um centro de tortura nos anos 1970”, pontuou.
“Eu sou velho agora, mas era novo naquela época, e eu me lembro. No final dos anos 60, a junta militar prendeu muitos artistas e intelectuais por suas crenças políticas. Eu era um deles, junto com meu amigo Gilberto Gil. Gilberto e eu passamos uma semana em uma cela suja. Então, sem nenhuma explicação, fomos transferidos para outra prisão militar por dois meses. Depois disso, quatro meses de prisão domiciliar até, finalmente, o exílio, onde ficamos por dois anos e meio. Outros estudantes, escritores e jornalistas foram presos nas celas onde estávamos, mas nenhum foi torturado. Durante a noite, porém, ouvíamos os gritos das pessoas”.
Por fim, Caetano questiona se o comportamento agressivo de Bolsonaro não é só “da boca para fora” — como justifica parte de seus eleitores. Ele ressalta: para governar o Brasil, o candidato terá de enfrentar o Congresso, a Suprema Corte e o fato de que a maioria da população ainda acredita que a democracia é a melhor forma de governar o país.