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Quando a comemoração causa dor

A falta de acolhimento e de espaço para expressar os próprios sentimentos é a principal queixa de pessoas enlutadas

Por *Juliana Dantas e Tom Almeida
11 Maio 2024, 14h00

É praticamente impossível não notar a chegada do Dia das Mães. A data é a segunda de maior importância para o comércio – só fica atrás do Natal. Porém, milhões de brasileiros vivenciam a celebração de forma dolorosa:

Pessoas enlutadas pela morte da mãe;

– Mães enlutadas pela morte de um(a) filho(a);

– Famílias desfeitas pelo preconceito contra LGBTQIA+;

– Pessoas que tiveram perda gestacional ou sofrem com a infertilidade;

– Pais solo que veem os filhos(as) crescerem sem a mãe;

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– Mães cujo(a) filho(a) desapareceu;

– Filho(a) cuja mãe desapareceu;

– O provável último Dia das Mães de uma mãe ou filho(a) adoecido(a).

Além disso, este Dia das Mães no Rio Grande do Sul, definitivamente, vai ser atravessado por dores e incertezas ainda mais específicas. Pessoas que perderam suas mães, mães que perderam seus(suas) filhos(as), pessoas que perderam seus lares e memórias de família e pessoas que talvez nem tenham o que comer no horário do tradicional almoço de Dia das Mães.

A aproximação do Dia das Mães

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O Dia das Mães é, claro, uma data a ser celebrada, uma oportunidade para estar perto de quem amamos. Mas, para quem convive com vazios, o incômodo já começa nas semanas anteriores. As vitrines das lojas, as propagandas na televisão e os e-mails indesejados das marcas vão lembrando, a todo momento, sobre as feridas.

Uma análise inédita realizada pela People Insight Pesquisa & Estudos da Linguagem para o Movimento inFINITO, com 2.700 depoimentos em postagens relacionadas ao luto em datas comemorativas, mostra o impacto dessas festividades em pessoas enlutadas.

Estar enlutado é experienciar um estado de sofrimento e tristeza de forma compulsória, indesejada e, por vezes, inesperada. Para aqueles que perderam entes queridos, as datas comemorativas nunca mais serão as mesmas. O convite para celebrar essas ocasiões traz consigo dor, angústia, receio das próprias reações e de eventuais julgamentos. Onde muitos veem alegria e confraternização, outros veem, majoritariamente, medo.

As principais queixas das pessoas enlutadas

A falta de acolhimento é a principal queixa das pessoas enlutadas. Frases prontas como “vida que segue”, “você precisa superar isso”, “ela não ia gostar que você chorasse”, entre outras, acabam gerando ainda mais sofrimento. A cobrança da sociedade por uma pronta recuperação traz uma camada extra de dor. Entender o processo do luto e nutrir um sentimento de pertencimento para apaziguar as dores do luto.

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O que é luto?

Será que estranheza, inadequação e solidão são sensações típicas do luto? Ou será que é como nos sentimos diante de como somos julgados e julgamos a nós mesmos? Como não falamos sobre a morte, também não falamos sobre o luto. E quando não falamos sobre o luto, não sabemos o que ele é.

O luto é um processo humano, natural e saudável diante da quebra de um vínculo importante. O luto não tem prazo de validade ou aferição de intensidade. Só conhece a dor quem vive a dor. “Superar” não é um verbo que pode ser conjugado para pessoas enlutadas. Não há o que ser superado. Há o que ser vivido, processado, atravessado, trabalhado, lidado…

O que as pessoas enlutadas sentem em relação à chegada do Dia das Mães é totalmente particular. Muitas vezes, a sensação de desajuste surge porque muitos ao nosso redor não nos enxergam e não nos compreendem.

O que fazer com o luto no Dia das Mães?

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Se você é uma pessoa enlutada, se permita sentir tudo sem autocensura. Avalie o que fará bem para você, sem a obrigação de atender às expectativas de outras pessoas. O conforto dos outros não vale o seu desconforto. Então, é hora de pesar o que fica e o que sai. Em meio à saudade de quem partiu, renovar as tradições pode criar um frescor capaz de arejar corações. Construir novas memórias e escolher a dedo quais são as do passado que devem ficar não são ações contraditórias: uma coisa não anula a outra.

É possível passar por esse momento de maneira mais saudável quando nos permitimos refletir e sentir por completo. Fazer um autoexame, entender as sensações que este Dia das Mães está trazendo e dar nome a tudo isso é um primeiro passo. Com isso em mãos, é hora de fazer pedidos claros a quem está à sua volta e estabelecer limites. Vá até onde der para ir.

Tenha contigo, se possível, uma espécie de guardião. É uma pessoa que terá a missão de te blindar de eventuais desconfortos ou te ajudará diante da necessidade de ir embora de um ambiente sem precisar ficar dando explicações. Vale lembrar que as ambiguidades fazem parte: é possível estar feliz por celebrar a data com seu filho e triste por ter perdido a sua mãe. É possível estar contente por ter mãe e triste por não conseguir engravidar.

Se você é próximo a uma pessoa enlutada, não tente acelerar ou subestimar os processos de quem vive. Seja suporte, e não uma camada extra de sofrimento.

 

*Juliana Dantas é jornalista, diretora de comunicação do Movimento inFINITO e diretora do Instituto Ana Michelle Soares. Tom Almeida é comunicador, fundador do Movimento inFINITO e presidente do Instituto Ana Michelle Soares

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*Movimento inFINITO

 Desde 2017, o Movimento inFINITO promove conversas sinceras sobre viver e morrer. Um de nossos projetos é a comunidade de acolhimento mútuo e validação do luto. A pesquisa revelou que a falta de acolhimento é a queixa central das pessoas enlutadas, e o inFINITO tem se mostrado essencial no processo de legitimação do luto, seja por meio da capacidade de acolher (facilitando a escuta, a troca e o diálogo), informar (compartilhando conteúdo profissional sobre morte, luto e temas relacionados) ou proporcionar um espaço seguro (físico, social e emocional) para vivenciar o luto.

 

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