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A onda dos luxuosos resorts que oferecem substâncias naturais psicodélicas

O turismo se espalha por Jamaica, Costa Rica, Peru, Holanda e estados americanos onde as experiências são legalizadas com fins recreativos e terapêuticos

Por Caio Saad, Camille Mello 24 jul 2022, 08h00

Há quem viaje ao México para visitar resquícios de antigas civilizações, abrangendo um leque espetacular de pirâmides, e imergir nas cristalinas e tranquilas águas do Caribe. Mas outra rota bem diferente se descortina por ali, um tipo de turismo que começa a despontar também em outros cantos do planeta. Ao norte da atribulada Riviera Maia, a americana Holly Hollingsworth dispensou toda aquela beleza cultural e natural para mergulhar em uma viagem, com o perdão do trocadilho, bem distinta: passou uma semana no resort The Buena Vida, onde embarcou em uma experiência psicodélico-espiritual embasada no consumo de cogumelos. A estada foi tão intensa que encontrou por lá um caminho para apaziguar sua ansiedade e depressão, que resistiam a todos os tratamentos. “O retiro fez com que eu me voltasse para mim mesma. Foi uma experiência de outro mundo”, relatou a VEJA, na linguagem típica dos convertidos.

Assim como o Buena Vida, que se apresenta como “uma aventura segura e sem riscos dentro da região mais mística do universo — seu eu interior” —, hotéis luxuosos voltados para a experiência com substâncias psicoativas como a psilocibina, extraída de cogumelos alucinógenos, e a ayahuasca, bebida feita a partir da mistura de variadas espécies do cipó, estão se espalhando por Jamaica, Costa Rica, Peru, Holanda e estados americanos, onde elas são legalizadas com fins recreativos e terapêuticos. Com paisagens exuberantes e muita tranquilidade, o Buena Vida, inaugurado em 2019, oferece, além das cerimônias com psilocibina, sessões de ioga, meditação, massagem, reiki e musicoterapia em dependências luxuosas espalhadas por uma área de 6 000 metros quadrados à beira-mar. O custo do pacote all inclusive para programações de, em média, sete dias varia de 3 000 a 15 000 dólares para cada um dos quinze participantes. O resort também atende grupos privados e promove retiros de casais. “Isso é para aqueles que buscam experiências de cura mais profundas e íntimas”, explica Amanda Schendel, fundadora do Buena Vida.

A expansão desse gênero de turismo, que atrai um eclético público, é resultado do polimento, nos últimos tempos, da imagem das substâncias naturais psicodélicas. Há indício do uso delas desde os primórdios da humanidade, passando por Egito e Grécia e os loucos anos de 1960 — até, na década seguinte, serem proibidas na cruzada antidrogas liderada pelo governo Nixon, nos Estados Unidos, que reverberou mundo afora. Seu atual retorno na trilha dos resorts tem relação direta com pesquisas científicas, conduzidas por prestigiadas instituições, que atestam seus efeitos positivos no tratamento de distúrbios psíquicos como estresse pós-traumático, transtorno obsessivo-compulsivo, ansiedade e depressão. Em relação a este mal, o próprio FDA, a agência reguladora de saúde americana, divulgou resultados bastante auspiciosos. “Percebo no consultório um nítido aumento do interesse dos pacientes por essas substâncias, que hoje só são permitidas no Brasil em rituais religiosos e estudos acadêmicos”, afirma a psiquiatra Débora Tavares, que integra justamente o grupo de pesquisa da Associação Psicodélica do Brasil.

FEITO EM CASA - Os cogumelos do MycoMeditations, na Jamaica: cerimônias de até seis horas monitoradas por “facilitadores” e relaxamento à beira-mar (à esq.) -
FEITO EM CASA - Os cogumelos do MycoMeditations, na Jamaica: cerimônias de até seis horas monitoradas por “facilitadores” e relaxamento à beira-mar (à esq.) – (@thebuenavida/Facebook; The buena vida/.)

Pioneiro no ramo, o MycoMeditations, na Jamaica, em atividade desde 2015, recebe 600 hóspedes por ano nas programações mensais de uma semana para doze pessoas. O cronograma envolve médicos, psicólogos e “guias”, que monitoram os participantes para prevenir riscos. “A maior parte dos clientes vem dos Estados Unidos e da Europa, mas a presença de brasileiros é cada vez maior”, observa o diretor-executivo, Justin Townsend. Além das sessões com “cogumelos mágicos” — no caso, cultivados no próprio resort —, o pacote inclui terapia diária em grupo e individual, todas as refeições, sessões de massagem e acompanhamento com terapeutas pós-retiro. Nos Estados Unidos, os resorts espirituais se concentram em cidades como Santa Cruz, na Califórnia, e Denver, no Colorado, onde a psilocibina foi descriminalizada.

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O ponto alto da experiência são as cerimônias que duram de cinco a seis horas, conduzidas pelos chamados “facilitadores” especializados em substâncias psicoativas. Alguns retiros contratam curandeiros de povos indígenas, tradicionais consumidores de alucinógenos em suas práticas religiosas. O belga Tim Cools, que atua como guia e professor de meditação em retiros psicodélicos por toda a Holanda, ressalta que a maioria dos frequentadores busca esses locais para superar situações difíceis, como o fim de um relacionamento, luto e insatisfação profissional. “Muitos chegam a um ponto na vida em que se sentem presos e querem superar obstáculos”, observa Cools.

O voo de autoconhecimento, no entanto, tem lá suas turbulências. A ingestão de alucinógenos pode trazer à tona memórias desagradáveis, intensificando, em vez de amenizar, crises de ansiedade e paranoia, ou gerar náuseas e sensações desconfortáveis típicas da chamada bad trip. Para evitar efeitos adversos mais graves durante as cerimônias, os organizadores fazem uma rigorosa seleção prévia dos interessados em embarcar na jornada de expansão da mente, que inclui entrevista com a equipe médica. Não são aceitos, por exemplo, hóspedes com doenças que requerem uso de medicações incompatíveis com o psicoativo. “Recusamos aproximadamente 15% das solicitações devido a esses fatores”, calcula Townsend, do MycoMeditations. Aos aprovados, boa viagem.

Publicado em VEJA de 27 de julho de 2022, edição nº 2799

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