Murilo Benício dá vida ao fazendeiro Tenório em Pantanal. Marido de Maria Bruaca (Isabel Teixeira) e pai de Guta (Julia Dalavia), é um homem prático, frio e racional. Para ele, justiça se faz com as próprias mãos. Se perante a família é um homem moralista e conservador, às escondidas tem outra esposa, em São Paulo. O personagem de Benício tem agradado tanto quanto levantado questões incômodas aos telespectadores. VEJA ouviu especialistas em teledramaturgia para entender que valores o público enxerga em Tenório para se fazer essa identificação.
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Para a pesquisadora em teledramaturgia, Aurora Leão, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), é significativo que Tenório esteja agradando tanto a direita, conforme identifica nas redes sociais. “Além de Benício ser intérprete de alto quilate, o personagem é um típico representante do agronegócio, facilmente identificável com a mentalidade que predomina no retrocesso do patriarcado”, diz. A pesquisadora também lembra que o antagonismo de Tenório está em José Leôncio, o boiadeiro milionário vivido por Marcos Palmeira. “Simboliza a derrocada dos grilhões machistas, trazida pelo filho Jovi (Jesuíta Barbosa), e que, por isso mesmo, deve incomodar os barões do atraso. São personagens que revelam a estrutura opressora que impõe a dominância de um gênero sobre outro”, continua a pesquisadora.
Na coletiva de imprensa da novela, Benício comentou que percebe a existência de Tenório pelos rincões do país. “A primeira conversa que tive com o Bruno (Luperi, autor), falamos sobre estes lugares, onde chegar com o Tenório. E eu falei para ele não segurar, não. Vamos mostrar sim. Pessoas como o Tenório ainda existem aos montes. Acho que vai ser uma boa forma de espelho para uma parcela de pessoas que não conseguiu evoluir deste lugar”, defende.
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O roteirista e dramaturgo Lucas Martins Néia, doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP), reforça o caráter mercadológico da telenovela, que precisa agradar a diferentes públicos. “É uma obra aberta, isso significa que está sendo escrita ao mesmo tempo que vai ao ar. Esse personagem é uma ponte para dialogar com o contexto de hoje, apresentando uma visão de mundo atual. Há quem condene e há quem se identifique com o Tenório. Isso interessa à Globo, porque dialoga com variados tipos de público (os de direita e os de esquerda). Não interessa à emissora perder o público mais progressista, mais jovem, nem o público mais conservador”, afirma.
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