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Martinho da Vila: ‘Ludmilla não entende de religiões africanas’

Em conversa com VEJA, sambista fala do novo disco, da decepção com Academia Brasileira de Letras e critica intolerância religiosa de cantora

Por Giovanna Fraguito Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 Maio 2024, 11h59 - Publicado em 26 abr 2024, 07h00
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  • Um dos maiores nomes do samba, aos 86 anos, Martinho da Vila vive um momento com diversos lançamentos na carreira. O cantor e compositor prepara novo álbum, pela Sony Music, de violões e cavacos, onde canta releitura de clássicos. Também lança o livro Martinho da vida (ed. Planeta), que serve de resgate das memórias, no qual relembra passagens importantes da vida e fatos nunca contados em entrevistas. Além disso, prepara o show Canta, canta minha gente!, neste sábado, 27, no Qualistage, Rio, em apresentação única. Martinho conversou com a coluna GENTE sobre os novos projetos, a vontade de estar na Academia Brasileira de Letras (ABL) e o que pensa de etarismo.

    O que prepara para o novo show? Vai ser um show alegre, com convidados, alguns dos meus filhos. Queria fazer um dia só, porque também estou com agenda complicada e agora também diminuí bastante minhas atividades. Já estou com 86, devia estar aposentado, trabalho desde cedo. Eu sempre falo: ‘vou dar um tempo agora’. Mas a pessoa mais idosa é que nem um carro velho, não pode deixar parado na garagem, porque quando for ligar não anda (risos).

    Em Martinho da Vida, como foi reviver suas memórias? Tenho várias biografias feitas por outros escritores, mas tem muita coisa que não falei, na hora não me ocorreu de falar. Aí resolvi fazer uma mais completa. E para não ficar normal, fiz uma coisa meio ficção, conversando comigo mesmo. O Zé Ferreira batendo papo com o da Vila. O da Vila pergunta pela literatura, pelas coisas que ele faz da vida, pela Vila Isabel, pelo Vasco; e ele pergunta ao da Vila sobre a vida artística.

    E qual conclusão os dois chegaram? A conclusão que o Martinho da Vila gostaria de ser só o Zé Ferreira. E o Zé Ferreira gostaria de ser o Martinho da Vila, porque acha que o palco é um lugar mágico, onde o artista se realiza, emociona as pessoas e também se emociona, é uma troca de energia, é um dos melhores lugares para se estar.

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    Hoje existe um movimento de mais artistas na Academia Brasileira de Letras. O senhor se candidataria de novo? Não, eu gostaria de fazer parte, mas cheguei à conclusão, observando, que não adianta se candidatar. Ninguém deve se candidatar à Academia, porque a diretoria da casa de Machado de Assis se reúne e cada um tem um candidato que gostaria de colocar. A diretoria escolhe um e manda ele se candidatar. Ele já vai se candidatar absoluto.

    Caso te chamassem, faria parte? Muito, lá tem os intelectuais para trocar ideias, conversar. É sempre bom trocar figurinha. A Academia foi fundada por um negro e na história da academia poucos tiveram acesso. Sou ligado aos movimentos negros e eles dizem: ‘você tem que ir para lá, temos que ocupar os espaços’. Mas não estou pensando nisso agora não.

    E o que pode adiantar do álbum novo? Já gravei muitos discos, não queria mais, mas não tenho palavra. A gravadora pediu um disco novo e falei: ‘ninguém mais está fazendo disco, fazem uma, duas músicas e colocam na internet’. E eles: ‘faz, a gente de dois em dois meses vai promover uma música’. Já fiz mais de 50 discos, tinha que fazer algo diferente. Vão ser violões e cavaquinhos, mas nada de chorinho. A intenção era fazer nova leitura de músicas que já gravei, sambas ritmados, com muitos instrumentos. Por isso o violão e o cavaquinho, quem gosta de poesia vai curtir mais.

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    O que achou da polêmica frase que Ludmilla apresentou no Coachella? Ludmilla não entende muito desse assunto de religiões africanas. Essa frase: ‘Só Jesus expulsa o Tranca Rua das pessoas’. Tranca Rua é Exu. No passado, Exu era visto como o demônio pelas pessoas. E não é assim, Exu é mensageiro. Nós, católicos, temos anjo-da-guarda; e nós, da religião africana, temos Exu. Pegou mal. Parava por aí: ‘só Jesus salva’, na fala dos evangélicos. Sou religioso, acordo todos os dias e falo: ‘Salve Jesus, Saravá meus orixás’. Misturo tudo. E vamos levando, devagar e sempre.

    Uma palavra que está muito em voga é o etarismo. O senhor já sofreu? Não. Minha mãe dizia: ‘o presente sempre vai ser melhor do que o passado’. Sente-se saudade do passado, mas ninguém quer voltar àquele tempo. Hoje, as idades não têm muita diferença, entre o jovem e uma pessoa mais idosa… Se os dois estiverem atualizados, tudo bem. No passado, uma pessoa de 60 anos era um velhinho.

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