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‘A diversidade é reflexo da realidade de vários Brasis’, diz diretora

Camila Nunes e o produtor Wadih Elkadi falam a VEJA sobre os desafios do Festival Internacional Lanterna Mágica

Por Valmir Moratelli Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 26 mar 2024, 12h00

Já sendo um dos mais importantes festivais de animação do país, a 6ª edição do Lanterna Mágica, em Goiânia (GO), contou com mais de duas mil pessoas no CineX, cinema do Centro Cultural Oscar Niemeyer, entre os dias 18 e 24. Dos 640 filmes inscritos, 75 foram exibidos em mostras como a Africana Animage e a Gondwana. Dos premiados, destaque para Carcinização, de Denis Souza (RS), Melhor Filme; e Tardes no Escarafuncha, de Fernando Ferreira Garróz (SP), Melhor Direção. Casados, a diretora geral Camila Nunes e o produtor executivo Wadih Elkadi conversaram com a coluna sobre o desafio de se colocar em prática o discurso da diversidade e o projeto de animação audiovisual que desenvolvem juntos.

É a primeira vez que o festival abraça a diversidade como bandeira na prática? Por quê? CAMILA NUNES: Antes a direção era dividida, era como um casamento. Às vezes você precisa abrir mão de uma coisa ou outra. Vivências, formas de ver o mundo, de vida, eram diferentes. Não conseguia externar e colocar em prática essa diversidade, como uma equipe de mulheres, principalmente. Mas também a preocupação de não só de priorizar filmes nacionais, projetos do laboratório do norte, nordeste e centro-oeste.

O que representa essa diversidade nas telas? CN: A diversidade é reflexo da realidade de vários Brasis, isso porque a gente coloca no ideal um formato de festival que precisa seguir, e é necessariamente o que acontece de fato. Minha realidade não é essa aqui em Goiás, no centro do Brasil. Uma coisa curiosa é que, em muito filme, ainda se coloca personagem para cumprir cota. O personagem é negro, mas por que é negro? Só porque vende, está na moda? São discussões necessárias.

Dentro da animação, existe um movimento mais forte de abranger a diversidade? CN: Acredito. É por isso que escolhi animação. Desde a época da faculdade, amo animação, mas não sei desenhar e achava que não podia trabalhar com isso. E aí na aula de direção, a professora falou: ‘o tema é apaixonar-se, faça o que quiser’. Falei: ‘vou mexer com animação’. Apaixonar pode ser de várias coisas, não precisa ser algo afetivo. Tenho várias paixões. Fiz com Stop Motion, pesquisei, fiz recortes de revista. E aí fiz uma personagem com paixões mundanas, coloquei música do Tom Zé, O amor é um rock.

Além do festival, vocês estão envolvidos em uma série, certo? CN: A ideia de Ayla Violeta foi inspirada na minha irmã caçula Helena, que tinha uma gatinha. Tem 11 anos que moro em Goiás, mas meus pais moram na divisa com a Bahia, em Luís Eduardo Magalhães, cidade agrícola que foi colonizada por sulistas. Todas as vezes que voltei lá, e sobretudo na pandemia, muita coisa me incomodava. Todo mundo que vai de carro para o litoral fala: ‘nossa, só tem plantação de soja, destruíram o cerrado’. Na cidade é a mesma coisa. Destruíram a paisagem para construir aeroporto e condomínios. Daí veio a ideia do filme, a história de uma gata e da família que mora nesse condomínio’. A gata tem super poderes, espera a família dormir, para salvar os próprios humanos de maldade que eles mesmo fazem. WADIH ELKADI: Agora está em desenvolvimento. Temos recurso da Lei Paulo Gustavo. Serão dois episódios e 13 roteiros. Ela pode não funcionar para um streaming, talvez no YouTube, não sabemos.

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Como é a criação de um projeto: primeiro vocês pensam no formato e na tela de exibição, ou isso só vem num segundo momento? WE: Cada projeto é uma particularidade. No caso de Ayla Violeta, a animação é um tipo de projeto mais capaz de ser internacionalizado. Basta trocar a voz original e está em inglês. Não perde tanto quando, por exemplo, um filme americano é dublado. Há mais possibilidades. A gente ainda não tem uma certeza de qual será a primeira janela da obra. Pode se YouTube, streaming, tanto faz. Mas canais dificilmente aceitam projetos já fechados, querem se envolver desde o primeiro momento. Se a gente passa para um streaming, perde o poder do projeto. É isso que a gente quer? Mas se tem recurso para entrar junto com eles, a conversa é outra, vira parceiro. É preciso conversar bastante.

Negociações como estas podem alterar bastante a temática ou formato da obra. WE: Acho que hoje é mais difícil alterar tanto assim. Tem muita série no streaming que o primeiro episódio tem oito minutos, o segundo tem 13, o terceiro tem nove e o quarto pode ter sete minutos. Não acontecia isso. Então, se você consegue vender o projeto, os caras querem bancar e falam: ‘todos têm que ser de 12’. Vamos fazer uma alteração. Mas acho que se eles falarem: ‘não pode ser uma gata, tem que ser um cachorro’, aí a gente mata o cara e vai para casa (risos).

Como trabalhar a regionalidade diante da busca por temas universais, que agradem a um público abrangente? CN: Essa é a chave: temas universais, mas com características regionais e específicas. Ayla Violeta é uma série de uma família comum, um casal que tem dois filhos pequenos e a bebê Helena, que foi inspirada na minha irmã. É uma bebê que está prestes a falar, é pequenininha, aprendendo a andar e tal. Eles têm esse bichinho de estimação, que é a Violeta. A bebê Helena finge que dorme e vê a gata saindo pela passagem secreta. Quando a gata está lá fora, aparecem vários personagens folclóricos: Saci Pererê, a cobra Cabra Cabriola, o Curupira, Boitatá… E aí pensando nessas narrativas que alcançam o mundo: como fazer com que esse filme possa passar no Japão, por exemplo?

Qual é a saída encontrada? CN: Com características do cerrado, nenhuma outra série tem. Isso é uma forma original de entender e pensar o roteiro. A característica do lugar dá personalidade para a obra. Só eu posso contar minha história, minha realidade. Se você vier contar a minha história, da cidade, do cerrado, não vai ser a sua história. Vai ser algo que você vai olhar e interessante. Veja o caso do filme A menina atrás do espelho, do Yuri Moreno, que ganhou o Grande Prêmio de Cinema Brasileiro. Ele chamou o primo dele, um homem trans, para fazer o roteiro com ele. Como ele ia contar aquela história daquele menino sem a visão do primo?

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Voltando ao festival, o que ele é em números? WE: O Lanterna é o festival de animação no Brasil que mais traz realizadores. Esse ano a gente teve 18. Até mais, porque alguns vieram por conta própria. Tivemos quase 1000 crianças na sala. CN: De investimento, quase 600 mil reais. Essa é como se fosse a primeira edição de uma nova direção. Temos 23 pessoas na equipe. Sou grata por tudo que o Lanterna foi, mas o que penso nele é disso aqui para maior. Quando você vai pra sala de cinema, com projeção gigantesca, com um sofá-cama que deita, um som maravilhoso, tudo é experiência gratuita. Trazer crianças de escola pública que nunca teriam condição de pagar, ou a Mostra Africana que nunca seria exibida num cinema como esse… É ocupação política. Se estou ocupando esse lugar, minha equipe também vem. Minha diretora de produção é negra, meu coordenador de exibição é negro.

 

 

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