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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)
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O estelionato eleitoral de Bolsonaro

Ao trazer o Centrão para o governo, Bolsonaro ganha na política, mas pagará um preço. O eleitor que se sente traído não esquece e nem perdoa

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 26 jul 2021, 15h20

De todas as promessas quebradas por Jair Bolsonaro nenhuma seja tão simbólica quanto a de entregar a coordenação do seu governo para o Centrão, a geleia de partidos metida em todos os escândalos financeiros que se tem notícia.

Depois de prometer na campanha uma ‘nova política’, Jair Bolsonaro entrega nesta semana o ministério que coordena o governo para o senador, líder do Centrão e presidente do PP, Ciro Nogueira. Antes mesmo de Nogueira assumir, Bolsonaro fez mais um recuo e hoje anunciou que não vai mais vetar o fundo eleitoral, apenas negociar o valor distribuindo R$ 4 bilhões para as campanhas do ano que vem.

É difícil prever qual será o preço que Bolsonaro pagará por trazer o Centrão para dentro de casa. Bolsonaro foi eleito com 58% dos votos, mas hoje tem menos de 30% de aprovação. As investigações da CPI da Covid mostraram que ele intencionalmente recusou a compra de vacinas contra a Covid em 2020, deixando milhares de pessoas expostas ao vírus. No melhor dos casos, fez isso por acreditar que em janeiro a pandemia estaria terminada _ um disparate sem sentido algum que ajudou a matar muitos brasileiros. No pior dos casos, ele foi conivente com uma quadrilha que operava no Ministério da Saúde para assinar contratos de compra de vacinas em troca de propinas. É indefensável nos dois casos.

Para sugerir o futuro de Bolsonaro é útil olhar o passado.

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Deve-se ao ex-ministro e professor catedrático de economia da USP, Delfim Netto, a expressão “estelionato eleitoral” para definir a sensação de traição do eleitor quando um candidato descumpre suas promessas depois de vencer as eleições. A tirada foi usada por Delfim pela primeira vez em novembro de 1986, quando o então presidente José Sarney anunciou o descongelamento dos preços quatro dias depois de Plano Cruzado ter dado do PMDB a maior vitória eleitoral da história recente.

Dois presidentes foram acusados de estelionato eleitoral ao adiarem para depois de suas reeleições ajustes drásticos na economia, Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff. Depois de vencer as eleições de 1998, FHC mudou o presidente do Banco Central para acabar com câmbio centralizado, medida defendida havia quatro anos. Mal feita, a manobra terminou com o dólar mais alto em dois mês e o Brasil pedindo empréstimo no Fundo Monetário Internacional para manter suas reservas.

Em 2014, depois de reeleita, Dilma Rousseff autorizou um pesado ajuste nas contas públicas que incluiu o reajuste das tarifas de energia, a recomposição dos preços de combustível, a redução na concessão das bolsas universitárias, o aumento nos juros do programa Minha Casa Minha Vida e o fim de isenções fiscais para empresas que não demitissem. A recessão que já atingia o País no final de 2014 se aprofundou e em dois anos 9 milhões perderam seus empregos.

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Tanto FHC como Dilma pagaram o preço em popularidade. A aprovação de FHC saiu de 43% de ótimo e bom em outubro de 1998 para 21% em fevereiro de 1999, segundo pesquisa do Datafolha. A aprovação de Dilma pelo mesmo instituto caiu de 42% em outubro de 2014 para 13% em março do ano seguinte.

Mais interessante é que a sensação de traição dos eleitores foi transferida para os candidatos dos dois presidentes. Em 1994, FHC teve 34,3 milhões de votos (54,2% dos votos válidos), passando para 35,9 milhões de votos (53%) em 1998. Quem pagou a conta do descontrole cambial e a quebradeira do Brasil foi José Serra em 2002. Ele teve apenas 19,7 milhões de votos no primeiro turno (23,1%), perdendo no segundo turno para Lula por 61% a 38%

Em 2010, Dilma Rousseff teve 47,6 milhões de votos(46,9%) no primeiro turno e 55,7 milhões no segundo turno (56%). Em 2014, Dilma foi reeleita com 43,2 milhões de votos no primeiro turno (41,6%) e 54,5 milhões (51,6%) no segundo. Depois da recessão de 2014-16, Dilma sofreu impeachment e deixou para Fernando Haddad um limite de votos. Haddad teve apenas 31,3 milhões de votos no primeiro turno (29,2%), o pior resultado do PT desde 1989, e 47 milhões (44,8%) no segundo turno, sendo derrotado por Jair Bolsonaro por mais de 20 milhões de votos de diferença.

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