O discurso gravado do presidente Jair Bolsonaro para a abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas combina exageros, distorções e mentiras. Mas ganha uma passagem só de ida para Rio das Pedras quem imaginava algo diferente. Bolsonaro fala o quer. O importante é o que ele não fala. Ele não fala, por exemplo, sobre qual motivo levou a sua mulher, Michelle, receber R$ 89 mil da família de Fabrício Queiroz.
Enquanto Bolsonaro inventa que existe cristofobia no Brasil, o inquérito que investiga um esquema de corrupção supostamente liderado pelo ex-polícial Fabrício Queiroz avança no Rio de Janeiro.
A denúncia contra o filho mais velho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro, deve ser apresentada ainda neste mês. Flavio será denunciado pelos crimes de peculato, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Segundo a investigação, Flavio era o arquiteto do esquema no qual Queiroz contratava funcionários fantasmas e depois recolhia parte dos salários. Os promotores e policiais descobriram dezenas de ex-funcionários dos Bolsonaros que sistematicamente faziam retiradas em dinheiro de suas contas, supostamente para devolver parte do valor para a família. Entre as pessoas que receberam o dinheiro está Michelle Bolsonaro.
Pela Constituição, o presidente Jair Bolsonaro não pode ser julgado por atos prévios à sua posse. Ele também tem foro privilegiado no STF. Isso significa que o presidente não pode ser citado no inquérito das rachadinhas. Flávio Bolsonaro, por sua vez, tenta obter privilégio similar por ser senador.
Sobram dois elos fracos. O primeiro é Queiroz, que está em prisão domiciliar por motivos de saúde. O segundo elo é Michelle, que não tem foro especial. Ela pode ser investigada pelo Ministério Público e pela Receita Federal, caso não tenha declarado o recebimento do dinheiro.
A preocupação da família Bolsonaro com o episódio é tamanha que se aproximaram do governador interino do Rio, Claudio Castro. Em novembro, se for confirmado no cargo, Castro irá designar o novo chefe do Ministério da Público do rio. A família Bolsonaro espera que seja alguém que não abra uma investigação para saber sobre as contas da primeira-dama.