Novo sucesso da Netflix, a trilogia Rua do Medo – cujo terceiro filme estreou neste fim de semana – conseguiu um feito notável. Todos os três títulos entraram na lista das atrações mais assistidas da plataforma nas últimas semanas. Mérito da qualidade cinematográfica? Não. O mérito vem dos algoritmos a serviço da nostalgia.
Mais uma vez, a Netflix reciclou uma estratégia que vem dando certo desde a série House of Cards: analisar o que os dados de audiência da plataforma indicam para produzir um produto feito sob medida para certa parcela dos espectadores. Há dez anos, a gigante do streaming observou que o público gostava de maratonar séries políticas (o chamado binge watching) e também gostava de filmes de Kevin Spacey dirigidos por David Fincher. Junte-se todos esses elementos e em 2013 veio a premiada House of Cards (inaugurando, inclusive, a prática de divulgar todos os episódios de uma só vez – ideal para maratonar). Em 2016, mais um golaço. A série Stranger Things explorava o interesse pelos anos 1980 ao contar uma história idílica repleta de referências a filmes clássicos como Goonies e Conta Comigo.
Agora, em 2021, a aposta é em filmes do tipo slasher, que fizeram muito sucesso nos anos 1990. Ao notar, por meio de seus algoritmos, que o público gostava de filmes na linha de Pânico, Sexta-feira 13 e Halloween, que têm várias continuações e assim permitem também o binge watching – a Netflix repetiu a estratégia: juntou todas essas referências em Rua do Medo e lançou os três filmes com uma diferença de uma semana entre eles. Vale lembrar que a diretora de Rua do Medo, Leigh Janiak, é esposa um dos showrunners de Stranger Things, Ross Duffer, e que os filmes são baseados nos livros de R. L Stine, autor de Goosebumbs. Sucesso garantido.
Mas, com um roteiro sofrível (para não dizer dispensável) e atuações medianas, algo está muito errado quando o principal motivo de interesse por um filme não é da história em si, mas uma boba listagem de referências aos filmes que o inspiraram. Isso explica a falta de qualidade da produção e suas entediantes repetições de clichês, em cenas calculadas para causar sustos gratuitos. Perde-se um logo tempo em discussões inócuas como “esse vilão é uma referência ao filme tal”, em vez de se propor algo totalmente novo.
A tática de se deixar levar pelos insights que seu algoritmo lhe proporciona sem dúvida é boa para a Netflix, pois ficou provado que isso se reflete em audiência fácil. Mas é ruim para produção cinematográfica como um todo. A sensação é de estar sempre preso em uma bolha de referências antigas que se retroalimentam, sem nunca entregar algo original. A tendência, inclusive, já é observada na TV aberta, em novelas como Totalmente Demais ou Verão 90, que a Globo produziu baseada em pesquisas qualitativas. O sucesso de Rua do Medo mostra que, para o bem e para o mal, a influência dos algoritmos nas produções culturais veio para ficar. Não duvide se a próxima grande produção da plataforma vier, sei lá, das insuportáveis comédias românticas dos anos 2000. Vai saber… Quer dizer: os algoritmos sabem.