“Caro colunista, venho pedir sua ajuda. Meu avô adorava usar uma expressão que não existe nos dicionários. Quando queria dizer que uma coisa não tinha qualidade, não funcionava direito, era vagabunda, dizia ‘marca barbante’. Nunca ouvi ninguém mais falar assim e não encontro nos livros. O velho estava inventando moda? Agradeço qualquer esclarecimento.” (Claudia Frota)
Não, Claudia, seu avô não inventou a “marca barbante” (ou “marca-barbante”, com hífen, a depender da fonte). Trata-se de uma expressão informal antiga e caída em desuso, mas que teve momentos de glória no século XIX e avançou por parte do século XX.
Nos dicionários gerais será difícil encontrá-la, mas os pesquisadores de locuções populares a registram. O sentido é esse mesmo que você depreendeu das falas de seu avô: “de marca ordinária, de produto caseiro ou de qualidade inferior”, segundo Raimundo Magalhães Jr.; “inferior, primário, subalterno”, na definição de Luís da Câmara Cascudo.
As explicações dos dois pesquisadores diferem nos detalhes, mas concordam no essencial. Marca barbante era como se chamava “a cerveja local [em] Recife, Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, no início da industrialização”, escreve Câmara Cascudo. “As rolhas de cortiça ficavam amarradas de barbantes, evitando que não fugissem no impulso da fermentação.”
Para Magalhães Jr., a bebida fermentada que deu origem à expressão era a cerveja de gengibre: “Originou-se [a expressão] da fabricação doméstica de gengibirra (bebida obtida por meio da fermentação do gengibre, da casca do abacaxi e de outros frutos), engarrafada e com a rolha solidamente presa à garrafa por barbantes. À falta de rotulagem, estes passavam a servir de marca”.
De uma forma ou de outra, a tal “marca barbante” da bebida ordinária, vira-lata, inferior, passou a ter emprego metafórico para qualificar qualquer coisa ou pessoa que se quisesse depreciar.
Na deliciosa crônica Antigamente, um compêndio vertiginoso de expressões idiomáticas antigas (do livro “Caminhos de João Brandão”, de 1970), Carlos Drummond de Andrade imortaliza assim a locução:
Ganhar vidro de cheiro marca barbante, isso não: a mocinha dava o cavaco.
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