João Doria (PSDB) está sendo muito criticado por largar a prefeitura de São Paulo para concorrer ao governo estadual. Desde o início de sua campanha em 2016, vendeu-se como outsider na política. Truculento para muitos, driven e popular para outros, Doria venceu as prévias tucanas para se candidatar à prefeitura com métodos considerados pouco republicanos. O choro é livre: seu oponente Andrea Matarazzo mudou-se para o PSD e nunca mais se ouviu falar dele. Alberto Goldman, o crítico mais ferrenho de Doria dentro do PSDB, foi votado pela última vez em 2002, quando se reelegeu deputado federal. Os adversários de Doria podem derrotá-lo e enterrar sua carreira política. Basta reunir votos para isso. É o que mais deve irritar Goldman etc.; Doria é um político popular que foi eleito prefeito no primeiro turno, fato inédito na história paulistana.
Doria é um bom prefeito? Provavelmente não. Uma de suas principais falhas é desconsiderar que a cidade tem problemas complexos que não se resolverão em poucos meses e necessitam de participação popular e transparência – duas coisas fundamentais para a democracia com as quais o prefeito tem dificuldades. Usando jargão mais técnico, Doria trocou “resoluteness” por “decisiveness”, termos usados pelos cientistas políticos Gary Cox e Mathew (com um “t” só mesmo!) McCubbins. Quanto menos “resoluteness”, menos atores políticos e sociais participam do processo decisório. As decisões são tomadas rapidamente, por um chefe do Executivo institucionalmente forte e com controle pleno sobre a burocracia. Não é ditadura. Nesse tipo de sistema, as políticas públicas duram pouco tempo e (provavelmente) tendem a ser menos eficazes – embora essa última afirmação seja mais hipótese do que certeza e esteja fora da análise de Cox e McCubbins. Doria quer ser um prefeito forte, que entrega resultados rápidos, em uma cidade e sistema politico organizados para resultar no contrário. Sua frustração é compreensível.
O prefeito cometeu o erro, natural para novatos em campanhas, de se comprometer a terminar o mandato caso fosse eleito em 2016. Fez juras. Assinou papéis. Reuniu os piores momentos de José Serra (PSDB) e Jânio Quadros (PTN). Se eleito governador, deixará o vice-prefeito Bruno Covas (PSDB), que gosta de viajar, no cargo até 2020. A raiva nas redes sociais contra a atitude de Doria é amplificada porque esperava-se comportamento diferente de um outsider na política: menos ambição, mais criatividade, honestidade e sinceridade características de quem não se preocupa com a carreira política. Mas esperar isso é injusto com qualquer um. É melhor ter representantes ambiciosos, sim, com incentivos para responder aos anseios da maioria (respeitando as minorias) e, assim, ser recompensado com mais votos para cargos mais altos. Fora isso, como poderíamos recompensar um político bem-sucedido? Sem poder ser recompensado, por que um político procuraria fazer o melhor e ser popular? Não está claro.
Além disso, outsiders na política brasileira têm que se juntar aos insiders. O tucano Doria não é exceção. Fernando Holiday, um dos principais expoentes do Movimento Brasil Livre, é vereador em São Paulo pelo DEM. Os movimentos sociais que tanto barulho querem fazer com “renovação na política” estão fechando acordos com o PPS e outros partidos para continuarem relevantes através da ação parlamentar. Sabem que fundar um novo partido é arriscado. Marina Silva (Rede) é o exemplo a evitar.
João Doria e sua justíssima ambição política sofrem com a incompreensão sobre esse paradoxo.
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