Elon Musk, do X/Twitter, atacou o ministro Alexandre de Moraes, pediu seu impeachment, afirmou que não vai mais cumprir suas ordens. Alexandre estabeleceu multa de 100 mil reais por dia em caso de descumprimento, falou em “instrumentalização criminosa” das redes e mandou investigar Musk.
É uma briga ruim — e briga ruim não tem lado bom. A discussão não é sobre quem está certo. É sobre quem está menos errado.
Nos últimos tempos, o STF tomou medidas enérgicas na defesa da democracia. A defesa foi providencial, não apenas porque a República de fato correu grave risco, mas também porque outras instituições, como o Congresso Nacional e a PGR, foram omissas — ou mesmo coniventes. Algumas dessas medidas foram polêmicas, mas se polemizou relativamente pouco, porque quando a democracia está em perigo, salva-se a democracia primeiro e discutem-se os métodos depois.
O perigo não passou, mas deixou de ser imediato, e torna-se cada vez mais difícil defender integralmente as medidas de Alexandre, algumas das quais, excessivamente rigorosas, podem ser entendidas como censura prévia. Também falta transparência sobre a quem elas afetam. E tais medidas, monocráticas, raramente vão ao plenário do STF. Alexandre tenta salvar a democracia com medidas não muito democráticas.
Musk, contudo, está longe de estar certo. Descumprir ordem judicial não é desobediência civil nem defesa da liberdade. É crime. Parece não entender o que é liberdade (de expressão ou de outro tipo) ou o que é democracia. Supõe-se um Thoreau redivivo, mas é apenas um fanfarrão que acha que ser possível defender a liberdade subvertendo o Estado de Direito. E dando tribuna para liberticidas.
O Congresso Nacional não está na briga, mas também está no erro. Já se vão quatro anos que a Lei das Fake News está em discussão e nada de se chegar a um consenso. O Congresso reclama do “ativismo” do STF, mas mantém o vácuo legal que provoca sua existência.
Musk e Alexandre estão em um caminho que leva à proibição total do X/Twitter, um resultado desastroso para todos.
Perder o Brasil custará caro para Musk: o X/Twitter é uma rede pequena e nós somos um de seus principais mercados. E Alexandre será responsável por colocar o Brasil na companhia China, Coreia do Norte, Irã, Rússia, Turcomenistão e Mianmar — não é uma lista em que alguém que defenda a democracia queira estar.
Os maiores prejudicados, claro, serão os brasileiros em geral. Milhões de pessoas dependem do X/Twitter para se comunicar, ter acesso a notícias, fazer negócios. Elon Musk deveria ser mais cuidadoso com os interesses de seus usuários. Alexandre deveria ser mais cuidadoso com os interesses dos cidadãos.
Só quem terá vantagem será o bolsonarismo, que poderá bradar que existe uma “ditadura do Judiciário” no Brasil etc. (Será uma vitória limitada, já que o brado não estará no X/Twitter, hoje um de seus principais canais de comunicação.)
(Por Ricardo Rangel em 08/04/2024)