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O equívoco de Celso de Mello e o esforço da tropa de Dirceu para desmoralizar ministros do Supremo

O ministro Celso de Mello é um homem decente, de bem. Já discordei radicalmente de alguns votos seus, mas nunca reconheci nele o pendor para a chicana ou para a vigarice intelectual. Ao contrário. Tem sido, na esmagadora maioria das vezes, expressão de ponderação e bom senso. Mas fez em seu voto uma consideração com […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 06h24 - Publicado em 23 abr 2013, 19h45

O ministro Celso de Mello é um homem decente, de bem. Já discordei radicalmente de alguns votos seus, mas nunca reconheci nele o pendor para a chicana ou para a vigarice intelectual. Ao contrário. Tem sido, na esmagadora maioria das vezes, expressão de ponderação e bom senso. Mas fez em seu voto uma consideração com a qual é impossível concordar sob qualquer aspecto que se queria.

Ao defender que os embargos infringentes são cabíveis, afirmou, leio na coluna “Radar”, de Lauro Jardim, que eles funcionam como uma espécie de duplo grau de jurisdição. Os condenados do mensalão que não exerciam cargos públicos alegam que não tiverem esse direito porque seus processos não foram remetidos para a primeira instância. Sempre que a lógica é frontalmente agredida, o troço fica aqui dando pontadas no meu cérebro, e me vejo obrigado a exercitar a discordância, nem que esteja do outro lado o papa e que se trate de matéria teológica. Celso de Mello é quase um papa no Supremo, e eu sou apenas um fiel seguidor das leis, mas acho que ele agrediu a lógica.

Se se trata, então, de ignorar a Lei 8038 (ver post anterior), admitindo os embargos infringentes como expressão do segundo grau de jurisdição, cumpriria indagar por que tal “direito” só será garantido a alguns réus, mas não a outros. “Ah, porque eles tiveram os quatro votos divergentes.” Mas isso nada tem a ver com o duplo grau de jurisdição; trata-se apenas de matéria regimental, já vencida pela lei. O argumento é ruim; não se sustenta. Ou bem se considera o Artigo 333 do Regimento Interno (o que prevê embargos infringentes) em sua área restrita, ou bem se tenta extrapolar, e, nesse caso, cumpriria, então não fazer justiça seletiva. Infelizmente, a especulação de Celso de Mello abre uma vereda para os chicaneiros acusarem todo o processo de ter sido uma farsa. Cumpre lembrar que o próprio ministro recusou as tentativas de desmembramento, o que implicaria enviar os casos dos réus sem cargos públicos para a primeira instância. Ou bem se considera que o Supremo agiu dentro da lei (e agiu) quando o manteve unificado, ou bem se considera que não. Trata-se de um mau argumento de um bom homem.

Cedeu à patrulha?
Teria Celso de Mello — e não só ele! — cedido à patrulha? Ele já foi enxovalhado pela tropa dirceuzista, especialmente aquela financiada na Internet com o leite de pata das estatais. Inventaram a falácia de que ele teria mudado de ideia sobre a necessidade de ato de ofício para comprovar a corrupção passiva. Já escrevi bastante a respeito. É mentira. Tentaram evidenciar a sua incoerência, acusando-o de ter decidido, nesse caso, ser um Torquemada, quando vem de uma tradição garantista. Era pura conversa mole, puro truque. Em que medida Celso de Mello, até sem querer, faz um movimento para livrar-se das correntes da maledicência? Não sei. 

Fux, Joaquim etc.
A máquina não brinca em serviço. Dias antes da publicação do acórdão, Dirceu voltou à carga com uma entrevista em que acusava Luiz Fux — e era a segunda vez que o fazia — de lhe ter prometido um voto favorável caso fosse indicado para o Supremo. O ministro nega que tenha se comprometido, embora admita o encontro. A estupefaciente entrevista de Dirceu, é óbvio, não coloca sob suspeição apenas a seriedade de Fux, mas também a da pessoa que o indicou: Dilma Rousseff. Não que o ministro não tenha sido flagrado em situações, digamos, incômodas. O advogado Sérgio Bermudes havia organizado para o amigo uma megafesta, abortada a tempo.

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Reportagens outras fizeram especulações sobre a sua isenção, uma vez que não se declarara impedido de votar em processos oriundos do escritório de Bermudes. E por que deveria? Sua filha trabalha lá. Nas vezes em que votou, Fux ora concordou com a postulação da banca advocatícia (e, nesse caso, integrou a unanimidade), ora recusou. Na rebarba, tentou-se especular também sobre a isenção de Gilmar Mendes, cuja mulher, advogada, trabalha no escritório de Bermudes. Trata-se de um despropósito.

As maiores bancas de advogados costumam ser escritórios gigantescos. Se ministros do Supremo forem se declarar impedidos porque têm relação com ao menos uma pessoa que os integra, as coisas se complicam. Será preciso buscar ministros do Supremo em Marte. Não é o que o PT faz, certo? Um foi buscado entre ex-subordinados de Dirceu; outro, entre amigos de Marisa Letícia… No caso de um parente próximo envolvido com a causa, aí, sim, a coisa é diferente. “Ah, mas ele disse que se daria por impedido…” O sorteio é eletrônico. Talvez nem soubesse. Querem pegar no pé de Fux por causa das conversas incômodas de antes, muito bem! Querem pegar no seu pé por causa da festa que acabou cancelada, ok. Era descabida mesmo. Querem colocá-lo sob suspeição por causa dessa história do escritório, aí é pura pegação no pé; tentativa escancarada de desmoralização.

Joaquim Barbosa
O presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, também virou alvo — e, em alguns casos, se fez alvo. O ministro indicou Wellington Geraldo Silva para a presidência do fundo de previdência dos servidores do Judiciário — o Funpresp-Jud. Silva é seu amigo. Não é servidor do Judiciário, mas funcionário do Banco do Brasil (BB). Antes de assessorar Barbosa, foi gerente de Comunicação e Marketing da Previ, fundo de previdência do BB, por nove anos. Nota: nomear o presidente desse órgão é tarefa do ministro. As associações de juízes, que estavam furiosas com as críticas que Barbosa fizera à aprovação da PEC que cria novos tribunais regionais federais, caíram de porrete no presidente do Supremo. Ficou no ar um clima de suspicácia. Reportagens lembravam que o fundo é “milionário”, sugerindo mais do que diziam…

É claro que o temperamento do ministro não ajuda. A reação despropositada ao pleito das associações de juízes em favor dos novos tribunais (ele estava certo, mas é uma questão de forma), a resistência em convocar o plenário para tomar determinadas decisões, a beligerância desnecessária com um repórter… Tudo isso cria um clima do qual se aproveitam os mensaleiros.

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Internamente, as coisas também não caminharam bem para o ministro em razão desse temperamento olímpico. Na quarta-feira passada, ele tentou indicar duas magistradas pela o Conselho Nacional de Justiça. Os nomes foram rejeitados. A maioria considerou que o assunto deveria ser tratado em sessão administrativa, depois de um exame mais acurado de currículos.

É bom ficar atento
A questão dos embargos infringentes será debatida num momento em que há gente interessada em afrontar o temperamento algo mercurial do ministro, tentando, uma vez mais, caracterizá-lo como um Torquemada. O jogo é  pesado. As especulações sobre a indicação para o fundo de pensão tentam atingi-lo, ainda que de forma oblíqua, moralmente. Ele terá de ter três virtudes para administrar esta fase: temperança, temperança e temperança. E isso, vamos convier, é difícil, é difícil, é difícil. Deve lembrar também que há um verdadeiro especialista em tirá-lo do sério: Ricardo Lewandowski. E a gente sabe que este faz o que todos têm a certeza de que vai fazer.

Acabei me alongando neste post mais do que queria. E não tratei das chicanas passadas que ainda poderão se mostrar bem-sucedidas. Fica para outro texto.

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