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No dia em que Renato Janine gritou: “Fogo, fogo na floresta”, como Bambi durante o incêndio

Renato Janine Ribeiro é uma pepita das mais reluzentes da esquerda brasileira. Ninguém encarna melhor as ambigüidades petistas, entre o discurso democrático e a tentação totalitária, do que ele. É o chefão da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior), onde é diretor de avaliação. Isso significa que tem um poder quase discricionário […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 22h39 - Publicado em 27 fev 2007, 13h53
Renato Janine Ribeiro é uma pepita das mais reluzentes da esquerda brasileira. Ninguém encarna melhor as ambigüidades petistas, entre o discurso democrático e a tentação totalitária, do que ele. É o chefão da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior), onde é diretor de avaliação. Isso significa que tem um poder quase discricionário sobre a produção acadêmica brasileira. Na mídia e entre os esquerdistas, ganhou fama de iluminista. Antes de ter-se metido em nova polêmica, sua opinião mais palpitante, que ganhou os jornais, foi sobre a novela Páginas da Vida. Um pensador realmente seminal, como se costuma dizer por aí.

Pois bem. No dia 18 de fevereiro, escreveu um artigo de uma estupidez rara no caderno Mais!, da Folha (clique aqui), que mereceu aquele título eu-freqüento-a-sala-Unibanco-de-cinema: “Razão e sensibilidade”. Ali, o nosso Diderot do folhetim se dizia perplexo com o assassinato do menino João Hélio, mostrava-se chocado, confuso, estarrecido mesmo, não sabia o que fazer na prática (era a parte “Razão perplexa” de seu texto), mas, oh!, o homem tinha ganas, desejos secretos de vingança. Era um Charles Bronson da justiça cega com sotaque francês (o côté sensibilidade…). Ali, escreveu coisas estranhas como “Torço para que, na cadeia, os assassinos recebam sua paga; torço para que a recebam de modo demorado e sofrido.” O Iluminismo de Janine mostrava, enfim, o seu lado prático.

Comentei seu texto aqui no blog e observei a sua desimportância. Lembrei que Janine era um dos autores da tese de que haveria uma conspiração de direita contra o governo Lula. Quando Marilena Chaui, a versão menos sensível de Janine, saiu atirando contra a mídia golpista, ganhou o apoio do nosso filósofo das estrelas. Seu texto era uma tolice, que ambicionava um lugar impossível: ser a expressão de uma emoção. Que é que há? Trabalho em jornalismo faz 21 anos. Um texto costuma ser encomendado com antecedência. Você telefona para o autor, dá o tamanho, explica em que contexto será publicado. Não existe texto em jornal que possa reivindicar o estatuto da “sensibilidade” em oposição ao da “razão”, o da “emoção” em contraste com a da “ponderação”.

Janine estava querendo só fazer um pouco de barulho. Convidado a se pronunciar, percebeu que o mercado de idéias lhe facultava uma chance de investir na própria mitologia: “Em vez de sair com aquela cascata de sempre da esquerda, farei o contrário. Eu, um humanista sensível, expressarei o meu horror dizendo palavras duras”. E saiu gritando no caderno Mais!, feito o Bambi do filme: “Fogo, fogo na floresta!”. Se vocês lerem seu texto original, não há uma miserável idéia, uma proposta que seja, nada! Não fosse puro marketing pessoal, seria fascismo para normalistas. Sendo o que é, não presta pra nada.

Mas aí seus amigos se encarregaram de afirmar uma certa comoção provocada por suas palavras. Elio Gaspari caiu na conversa de Janine e lhe deu uma carraspana (clique aqui), tornando-se peça involuntária de uma farsa. Decidiu, como direi?, moralizar pela esquerda o pensamento — quero dizer, a “sensibilidade” — do nosso iluminista, momentaneamente cego de tanto sentimento, de tanta luz que emanava de seu Eu Profundo. Na mesma edição, mas em outra seção, a professora Olgária Matos, outra petista de plantão e detentora dos direitos de distorção da Escola de Frankfurt, mandava bala (ops!) num Adorno para os simples de espírito (clique aqui) e sustentava que o pensamento de seu companheiro não havia sido bem entendido por ninguém.

Olgária tentava nos dizer que o que estava lá não estava lá. A Folha aproveitou para fazer uma chamada na capa lincando os três textos. Janine havia se tornado a Maria Callas do debate sobre a violência. E por uma razão banalíssima: era, afinal, um esquerdista pedindo vingança em vez de justiça. É o que a esquerda fez a vida inteira. Como o pensamento politicamente correto julga que é o contrário — isto é, que sanguinária é a direita —, então a voz estridente de Janine se sobressaiu com seu “La violence est un oiseau rebelle”. O curioso é que, no mesmo jornal, o governador José Serra afirmava em artigo não ser necessário baixar a maioridade penal para punir adolescentes infratores: basta mudar o Estatuto da Criança e do Adolescente, estendendo o prazo de internação por até 10 anos, em vez dos três atuais (clique aqui). Silêncio. Não queremos propostas práticas. O negócio é sair aos pulinhos: “Fogo, fogo na floresta!”

Abro a Folha de hoje e dou de cara com uma carta de Janine encabeçando a seção Painel do Leitor. Contesta Gaspari num particular: diz que não escreveu seu artigo como chefão da Capes e lamenta que o jornalista não distinga “emoção e reflexão”. Ou seja: em seu primeiro texto, o maître a penser não pensou, apenas sentiu. Era uma comichão moral. E já avisa que vai escrever um novo artigo no Mais! Certo, vocês atentaram para o vício típico das esquerdas: elas sempre conseguem pensar “enquanto” uma coisa, escrever “enquanto” uma segunda e se comportar “enquanto” uma terceira. A primeira o afaga, a segunda o manda para a fogueira, a terceira reza pela sua alma.

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E pronto! A questão da violência, a se julgar pela importância e pelo espaço cedidos pela Folha aos polemistas, encontrou seu ponto alto num artigo imbecil de Renato Janine Ribeiro. E por uma razão que mereceria um ensaio sobre o estado das partes do pensamento no Brasil. Tivesse ele escrito uma daquelas banalidades rotineiras da esquerda — “a culpa é do capitalismo” —, ninguém teria dado bola. Como o humanista de plantão resolveu dizer que até ele (???) tinha desejos de vingança, então isso foi considerado uma novidade.

Como se a morte e a brutalidade não tivessem sido, como a história prova de sobejo, a seiva principal do pensamento e da prática da esquerda.

PS: Faz menos de um ano, Renato Janine Ribeiro esculhambou a Folha porque o jornal publicou uma carta aberta de Marilena Chaui a seus alunos. O filósofo viu uma terrível invasão de privacidade. Pisando, desta feita, nos astros distraído, como a cabrocha lesa, acabou permitindo que a mesma Folha publicasse um texto todo feito de intimidades emocionais. A razão, tudo indica, vem em outra edição do Mais! E, claro, essa pantomima não se dá na imprensa “deles”, mas na imprensa que “eles” ainda dizem ser burguesa.

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