Durante os longos anos de predomínio petista no poder, uma das lendas mais conhecidas no Senado envolvia o senador Renan Calheiros e um certo burocrata instalado na cúpula de uma empresa pouco conhecida no imaginário popular, mas importante pelos negócios bilionários que comandava. A empresa era a Transpetro. O burocrata, Sérgio Machado. Em meio a todo tipo de pressão, dentro e fora do governo, no PT e no PMDB, com ou sem denúncia de irregularidade, apadrinhados de todas as facções políticas eram demitidos. Machado, não. Ninguém se arriscava a mexer com ele.
Instalado no comando da estatal, Machado era um desses figurões que só mantinham contato com a nata do poder. Havia chegado lá, dizia a lenda, pelas mãos do poderoso Calheiros. Os anos passaram, Lula deixou o poder instalando no seu lugar Dilma Rousseff. Calheiros continuou sendo importante ao petismo no Congresso, mantendo cargos no governo, incluindo Sérgio Machado na Transpetro.
Aí veio a Lava-Jato e sua bateria de operações que revelaram como PT, PMDB e PP haviam dividido a Petrobras em campos de exploração de propina para financiar o caixa dois de campanha e abastecer os bolsos de muitos figurões da política brasileira. Nessa enxurrada de prisões e delações, Sergio Machado, o intocável da Transpetro, percebeu o que estava vindo e acabou fechando em sigilo um acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República.
Enquanto os caciques do MDB, Calheiros entre eles, tramavam como estancar a sangria da Lava-Jato em secretas conversas, Machado gravava tudo para entregar aos investigadores. Na entrada da residência oficial do Senado, uma pequena gaveta num aparador recebeu dos emedebistas o apelido de “gaveta do Sérgio Machado”. Era nela que o ex-presidente da Transpetro colocava o celular toda vez que chegava para conversas sigilosas com Calheiros e sua turma. “Olha, vou deixar o celular aqui para não ter risco, viu?”, costumava anunciar.
As trapalhadas de Rodrigo Janot acabaram colocando muita coisa a perder na delação de Machado, é verdade, mas nesta semana a clima esquentou no Supremo Tribunal Federal para Calheiros. A lenda de Sérgio Machado no Senado acabou convertida em ação penal. Por três votos a dois, a Segunda Turma do Supremo tornou Calheiros réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Em tempo, o senador do MDB de Alagoas sempre negou qualquer envolvimento em casos de corrupção.