Marcos Cintra, ex-secretário da Receita Federal, lembrou-se de seus últimos dias no governo nesta terça-feira, 15, ao ver o presidente Jair Bolsonaro vociferar nas redes sociais contra o projeto do Renda Brasil. Só mudou o personagem. Ao invés do próprio Cintra, na linha de tiro estava o secretário da Fazenda, Waldery Rodrigues. Fora do governo desde agosto de 2019, quando Bolsonaro exigiu sua demissão por insistir na recriação da CPMF, ele continua a contestar as decisões do ex-capitão e garante que, se continuar neste rumo, o Brasil terá problemas para pagar a conta da pandemia. “Bolsonaro está colocando o Brasil numa rota inflacionária”, diz.
Segundo Cintra, o país precisará encontrar alguma maneira de pagar o custo fiscal da crise causada pela Covid-19. Mas o presidente não permite que nenhuma ideia da equipe econômica avance. “Já estamos vivendo um aumento causado pelo estrangulamento de alguns setores, como o do arroz. Isso pode se difundir por toda a economia e se transformar numa inflação estrutural”, garante Cintra, que retomou o cargo de vice-presidente da Fundação Getulio Vargas. “Se não houver condições para aprovar a reforma tributária, ou a administrativa, ou cortar gastos, ou desvincular recursos, ou aumentar a carga tributária, em um ano a inflação está em um nível muito preocupante.”
A equipe econômica entregou diversos projetos para corrigir a rota fiscal após o fim do orçamento de guerra, que causará um déficit primário superior a 800 bilhões de reais este ano. E não haverá talento suficiente no Banco Central para contornar o rombo sem gerar inflação. “A inflação é o último dos recursos. E neste caso, o problema não é a política monetária, mas por razões estritamente fiscais. Ou seja, o governo tendo um déficit gigantesco e não estamos conseguindo tomar as medidas para fazer que volta a uma situação de contenção fiscal. Se isso se tornar algo permanente, o risco inflacionário é grande.”
Por fim, Cintra diz acreditar que assessores palacianos e outros ministros estão orientando mal o presidente. “Como ele antecipou o calendário eleitoral, agora está evitando tomar decisões dolorosas, porque está se cercando de uma equipe com uma visão mais estatista do país como um todo”, afirma. “O Ministério da Economia é um batalhão cercado de militares adversários.”
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