Da MPB ao heavy metal, a nostalgia invade os grandes festivais
Eles estão em alta, e há eventos customizados para todos os gostos e gerações
Há duas semanas, um alquebrado Ozzy Osbourne, 74 anos, foi visto em uma cadeira de rodas dando entrada num hospital de Los Angeles. Desde 2009, o “príncipe das trevas” do heavy metal acumula várias cirurgias na coluna, além de enfrentar a doença de Parkinson. Embora não se saiba a razão da nova visita ao hospital, ela precipitou um anúncio chocante para os fãs: Ozzy cancelou seu aguardado retorno aos palcos, em outubro, no festival Power Trip. A consternação é compreensível: no evento que será realizado na Califórnia, dezenas de milhares de pessoas vão degustar um cardápio de rock pesado composto apenas de atrações, digamos, vintage — e Ozzy será uma baixa importante. Mas haverá outros dinossauros com mais de quarenta anos de estrada para compensar: Iron Maiden, AC/DC, Metallica e, agora, Judas Priest no lugar do ex-vocalista do Black Sabbath.
A comoção com o cancelamento de Ozzy iluminou um novo fenômeno no mercado de shows: a ascensão dos megaeventos que celebram apenas artistas de um gênero ou período específico da história da música. A tática começou nos festivais tradicionais, que notaram a boa resposta ao reservar uma noite para determinado público ou estilo. Desde o fim da pandemia, a tendência evoluiu para a criação de maratonas nostálgicas absolutamente customizadas — e, claro, muito lucrativas. O Power Trip acontecerá num espaço capaz de abrigar 90 000 pessoas por dia, com ingressos a partir de 600 dólares (2 884 reais). Caso ocorresse nos anos 1980, certamente seria o grande festival de seu tempo.
Esses eventos saudosistas galvanizam diferentes gerações de fãs ávidos por rever, no mesmo lugar, os ídolos que marcaram sua juventude — seja de qual época ou ritmo que se imagine. Em novembro, uma imensa área ao redor do píer de Huntington Beach, na Califórnia, reunirá em um dia o créme de la créme da new wave, pós-punk e synth pop dos anos 1980. A escalação terá New Order, Tears For Fears, Echo & The Bunnymen, Soft Cell, The B-52s e muitos outros — um combo que fez os ingressos se esgotarem em poucos dias. Em maio, o Cruel World, realizado pela segunda vez nos arredores do estádio Rose Bowl, também na Califórnia, com capacidade para mais 80 000 pessoas, promoveu o retorno da cantora britânica Siouxsie, além de outros astros da época, como Billy Idol, Iggy Pop e The Human League. Já os órfãos do emo e do pop-punk dos anos 1990 têm encontro marcado em outubro, em Las Vegas, no When We Were Young. O festival, que já está em sua segunda edição, acontecerá num espaço com capacidade para mais de 100 000 pessoas (o mesmo onde ocorreu o Rock in Rio Las Vegas). A lista de atrações inclui Green Day, Blink 182, Offspring, Good Charlotte, Simple Plan e Sum 41.
O apelo de festivais como esses é infalível. Ao se fechar numa bolha temática e confortável, os fãs entram num túnel do tempo em que podem voltar a ser quem eram e reencontrar o pessoal de sua geração, criando um evento único com grande potencial agregador. Um dos primeiros festivais bem-sucedidos desse tipo foi o Desert Trip, em 2016, promovido no mesmo local onde neste ano acontecerá o Power Trip dos metaleiros. A reunião de astros, jamais repetida, contou na época com Rolling Stones, Bob Dylan, Paul McCartney, Neil Young, Roger Waters e The Who.
This Business of Concert Promotion and Touring
No Brasil, o mercado também está caminhando para uma especialização peculiar. Criado há nove anos em São Paulo, o Coala Festival ganhará em setembro sua maior edição. Totalmente focado na nostalgia da MPB, o evento terá como principais atrações grandes nomes do passado como Jorge Ben Jor, Novos Baianos, Marcos Valle, Marina Lima e Angela Ro Ro. Em novembro, vai ser a vez do Rock The Mountain, em Petrópolis, região serrana do Rio. Ele também terá outro recorte marcante: serão só artistas femininas da MPB, entre elas Maria Bethânia, Marisa Monte, Alcione e Daniela Mercury. A nostalgia, vale lembrar, também ajudou a ressuscitar os Titãs, com o retorno dos sete integrantes clássicos numa turnê já vista por 600 000 pessoas. Haja saudades.
Publicado em VEJA de 26 de julho de 2023, edição nº 2851
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