Dizem que 7 é número de mentiroso. Pela numerologia, representa a perfeição. Sete são as cores do arco-íris, sete são os dias da semana, as notas musicais, as Maravilhas do Mundo Antigo, os anões da Branca de Neve, e por aí vai… E sete foram os gols que o Palmeiras sapecou ontem no Flamengo, em confronto no Pacaembu que hoje faz a torcida alviverde amanhecer festejando pelos sete cantos da cidade. Que jogo, meus queridos leitores de 1951, que jogo! Só o atacante Liminha, estreia na peleja, assinalou quatro vezes. Mas ainda tiveram mais três! Um baile! Viajei 70 anos (olha o sete aí de novo!) pela Máquina do Tempo para dar uma notícia não tão boa aos palmeirenses. O cabalístico algarismo 7 vai sim entrar para a história do futebol brasileiro, mas por causa de uma longínqua goleada que a Seleção Canarinho vai sofrer, pelo mesmo placar, no próximo século – e sobre a qual não vale a pena eu me estender aqui (deixei 2021, aliás, sete anos após a tragédia). Já este 7 x 1 de ontem, curiosamente, será praticamente esquecido, jamais citado ou relembrado pela mídia esportiva. O porquê disso? Ah, meus amigos, isso é um segredo guardado a sete chaves.
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Mas que ninguém exagere na zoação e nas brincadeiras com os flamenguistas, mesmo nós estando a apenas três dias do Carnaval (como manda a tradição, sete domingos antes da Páscoa). Todo grande clube brasileiro já teve ou terá seu, digamos, “Dia de 7×1” na História – mesmo que com uma matemática diferente. O próprio Palmeiras, aguardem, sofrerá um 6 x 2 do mesmo rubro-negro. Ok, um placar ligeiramente menor, mas que se dará duas vezes! Em 1958 e 1980! O vencedor de ontem, que, revelo, acabará sagrando-se campeão deste Torneio Rio-São Paulo de 51, já guarda em seu caderninho o 6 x 0 aplicado pelo tricolor paulista há 13 anos e sofrerá derrotas iguais (6 x 0!) do Internacional (em 1981), do Curitiba (2011) e do Goiás (2014). Sem falar num incômodo 7 x 2 para o Vitória da Bahia, previsto para a Copa do Brasil de 2003. Portanto, palmeirenses, nada de soberba – um dos sete pecados capitais.
O Flamengo também terá seus sete dias de vacas magras. Já remói nas entranhas de sua história as derrotas para Vasco (7x 0, em 1931) e Botafogo (9 x 2), em 1927), mas eram tempos amadores, é plausível justificar. O problema, caros flamenguistas, é o futuro… Daqui a dez anos, acreditem, virá um novo 7 x 1 (sim, o Flamengo chegará a 2021, de “quando” venho, como detentor deste “título”: ninguém apanhará tantas vezes pelo místico placar), placar alcançado na próxima vez pelo Santos. Antes disso, em um par de temporadas, será a vez de outro clube paulista, o Corinthians, “pintar o sete” contra o Onze rubro-negro: 6 x 0 no Rio-São Paulo de 1953. O São Paulo não vai querer ficar de fora dessa festa e em 2005 vai sapecar um novo 6 x 0, mesmo placar daquele que se tornará o mais famoso sacode a abalar as estruturas da Gávea: a goleada que o Botafogo vai aprontar em 1972 – mas essa, pelo menos, o Flamengo vai devolver, em 1981. Gaúchos (Grêmio, em 1989) e mineiros (Atlético, 2004) também vão brincar de fazer seis gols em jogos (ambos 6 x 1) contra o rubro-negro. Contem comigo: 1, 2, 3, 4, 5, 6… Sete goleadas históricas! Como as Pragas do Egito.
É, meu caro, todo time tem seu “Dia de 7×1”. Para o Corinthians, o destino reserva os impensáveis 7 x 0 para a Portuguesa (acontecerá sim, em 1961) e um 6 x 1 para o Juventude (2003), papelões que se juntarão aos traumas já vividos na temporada de 1933: Palmeiras 8 x 0; e Santos 6 x 0. Ao Vasco, os Deuses do Futebol trarão um 7 x 2 chato para o Atlético Paranaense, em 2005. Mas o clube da Cruz-de-Malta chegará a 2021 como um especialista em cair de cinco. Já ensaiou esta vocação em 1925 (Fluminense 5 x 1) e em 1942 (Madureira, idem). Mas vai tomar gosto pelo número, podem acreditar! Em 1955, vem aí um Bangu 5 x 0; dez anos depois, será o Santos a atropelar os vascaínos, por 5 x 1; em 1970, o Palmeiras (5 x 0); em 1974, Fluminense (novo 5 x 1). E ainda virão dois 5 x 0, para Corinthians (1995) e Avaí (2014). Ufa… Melhor deixar de fora desta lista as derrotas por 6 gols. Mas o Vasco será sempre gigante – mesmo caindo algumas vezes para a Segunda Divisão no próximo século. É como o gato, que tem sete vidas.
Que tal a gente brincar agora de achar os Sete Erros do passado e do futuro dos tricolores no eixo Rio-São Paulo (cidades mais próximas do que nunca após a abertura, mês passado, da Rodovia Presidente Dutra)? Os são-paulinos sofrem gozações pelos 8 x 1 do Botafogo em 1940, mas ainda terão pela frente três resultados que vão tentar esquecer: 7 x 2 pra Portuguesa (1998); Vasco 7 x 1 (2001); e Corinthians 6 x 1 (2015). O Fluminense reunirá em sua biografia uma série de pancadas de seis, inclusive do próprio São Paulo, que se dará em 2002. Surras semelhantes serão dadas por Vasco (1958), Sport (1996) e Juventude (1999), juntando-se às memórias dos dolorosos 6 x 0 carimbados pelos vascaínos em 1930, derrota ainda hoje engasgada na garganta do controverso dramaturgo Nelson Rodrigues. A propósito, registre-se aqui neste texto, para a eternidade: trouxe do futuro e entreguei ao prestigiado escritor um humilde ensaio literário que fiz, sugerindo que ele adaptasse para o teatro. Fiz questão de dar um nome forte: “Os Sete Gatinhos.”
Pra que esta resenha não vire um Bicho de Sete-Cabeças, vou engatar “uma quinta” – no futuro, explique-se, essa expressão será usada em referência ao câmbio dos automóveis, mas já existirão modelos saindo de fábrica com 7 marchas! Engrenando com o Peixe: o clube do balneário de Santos não vai escapar de ter seus “Dias de 7 x 1”, literalmente! – serão os placares contra Palmeiras, em 1965, e Corinthians, em 2005. A turma boa do Parque São Jorge, vocês devem saber, já deu de 11 x 0 na esquadra da Vila Belmiro. Outro alvinegro, o carioca da estrela solitária, chegará a 2021 carregando nos ombros derrotas que vão destruir uma futura máxima repetida por seus torcedores: “Há coisa que só acontecem com o Botafogo!”. Não é verdade, já deu pra notar. Registros atestam o 11 x 2 do América em 1929 e o 6 x 0 do Fluminense, em 1906. O pior, sinto informar, está por vir. Um acachapante 7 x 3 pro São Paulo (1996), dois 6 x 0, pra Palmeiras (1999) e Vasco (2010), e os constrangedores 7 x 2 (1965) e 7 x 1 (1994) pro algoz Fluminense. Mas atenção: o fatídico algarismo ganhará contornos místicos – destino iniciado há dois anos, com o atacante Paraguaio, no título carioca sobre o Expresso da Vitória vascaíno. – marcando futuros ídolos do clube. Anotem aí os nomes: Garrinha, Jairzinho, Maurício, Túlio… Todos camisa 7.
Vamos seguir neste guia, uma espécie de “sete passos para desmistificar as goleadas”. Em Minas, o Cruzeiro aguarda um 7 x 3 com que o Palmeiras vai lhe presentear em 1999. Na enorme rivalidade local, o Galo terá que suportar derrotas por 5 x 0 (2008) e 6 x 1 (2011) para os cruzeirenses. Tomará também de 6 do Sport (2000) e de 5 pro São Paulo (2004), ficando no zero em ambos os confrontos. Já tivemos um 9 x 2 do Galo, mas em 1927, quando o rival ainda era Palestra Itália – nome já devidamente enterrado a sete palmos.
Tenho sete motivos em deixar os outros sete clubes que chegarão a 2021 como as grandes forças do nosso futebol (façam suas apostas!) para outra viagem ao passado e nova resenha que venha a fazer. Sobre o jogo de ontem, há pouco a se dizer. Liminha, estrela da vitória, fará história no Palmeiras, marcando inclusive o gol que vai garantir o título mundial este ano. Pude confirmar com meus olhos o que os jornais estão dizendo hoje, atestando a fragilidade rubro-negra. Ao deixar 2021, porém, não foi fácil me municiar de informações, como sempre faço, sobre a partida. Cheguei a pensar que alguém ou algo teria apagado os registros sobre este vexame do Flamengo que testemunhamos ontem. No futuro, muitos dirão que coisas assim são obra de uma misteriosa organização que age nos subterrâneos do futebol. Uma tal de “Fla-press”. Mas não coaduno com esta manifestação passional das torcidas rivais. É mito, como a crença de que o sétimo filho homem, após seis mulheres, vem ao mundo como lobisomem. Pura ficção, como as chanchadas e comédias, da Atlântida ou da Vera Cruz, que vocês andam assistindo no cinema – tida como a Sétima Arte.
O que importa hoje é que os palmeirenses estão, como se diz nesses charmosos anos 50, no Sétimo Céu! Pois saibam, torcedores do Verdão, que a euforia vai durar. Com a experiência de viajante do futuro, tal um navegador dos Sete Mares, posso adiantar a vocês que estamos em pleno período de ouro da Sociedade Esportiva Palmeiras. Este Rio-São Paulo em curso terminará com a Taça nas mãos do clube, sagrando-se Bicampeão do Torneio. Mas será apenas a terceira de uma sequência de cinco conquistas consecutivas. Além da Taça Cidade de São Paulo e do Paulistão, ambos na temporada passada, vêm por aí triunfos na Taça Cidade deste ano e no prestigiado Mundial Interclubes, que acontece em breve, fechando o ciclo que ganhará a história com a alcunha de CINCO COROAS. É sério! Podem apostar! E quando forem, aproveitem pra fazer uma “fezinha” também no Jogo do Bicho. Essa informação eu achei na pesquisa que fiz em 2021. Vai dar Grupo 7 (Carneiro) na cabeça!
Aos flamenguistas, trago bastante conforto do amanhã. Será justamente sobre o Palmeiras que o Flamengo conquistará duas taças: Copa Mercosul, em 1999, e a Supercopa do Brasil, em 2021, únicas decisões reunindo os clubes. Deixei o futuro a pouco dias de mais uma edição deste embate, que até lá registrará números divergentes mas algo como 119 jogos já realizados, com 46 vitórias alviverdes e 40 do rubro-negro; 33 empates. Os dois times estarão figurando entre as três maiores forças do futebol brasileiro. E disputando os principais campeonatos em curso – com sete pedras na mão.
Voltando à longa lista de ‘spoilers’, em que dei de bandeja as goleadas que estão por vir, fico tranquilo por saber que quase ninguém acredita que vim realmente do futuro para revelar esses fatos. Aos que creem, aviso: sempre há tempo de mudar o destino e construir um futuro de sucesso. Ainda este ano, por exemplo, o nosso recém-empossado presidente Getúlio Vargas apresentará projeto para a criação de uma nova estatal, que será batizada como Petrobrás e vai longe, longe, longe, na terra e em alto-mar – por mais que surjam corjas querendo usurpar este futuro patrimônio brasileiro. Faltam quase 15 anos para surgir outra empresa, a Rede Globo – para a qual, inclusive, trouxe algumas informações que a ajudarão a superar a concorrente Tupi, inaugurada há duas semanas. Assim como nos negócios, no futebol o mundo dá voltas. Por isso, deixo aqui um ensinamento para torcedores de hoje e de todas as décadas que virão: antes de tripudiar sobre goleadas sofridas pelo rival, olhe pra si mesmo e seu time no espelho. Mas com cuidado. Se quebrar, são sete anos de azar!
P.S.: Magia ou não, no futuro essa resenha que vocês leem em 1951 será republicada, daqui a 70 anos, acreditem… Num dia 7.
FICHA TÉCNICA
PALMEIRAS 7 X 1 FLAMENGO
Data: 2 de fevereiro de 1951
Estádio: Pacaembu
Local: São Paulo
Árbitro: Atilio Trignani
Público: 34 mil (estimados)
Renda: Cr$ 510.760,00 (“cruzeiros antigos”)
Palmeiras: Oberdan (Lourenço); Turcão e Osvaldo; Waldemar Fiúme; Luis Villa, Sarno; Lima, Aquiles, Liminha, Canhotinho e Rodrigues Tatu
Técnico: Ventura Cambon
Flamengo: Cláudio, Osvaldo (Newton Canegal) e Juvenal; Válter Miraglia, Modesto Bria (Aristóbulo) e Bigode; Biguá, Gringo (Hermes), Durval, Adãozinho e Esquerdinha.
Técnico: Flávio Costa
Gols: Rodrigues (15’1T), Liminha (30’1T), Lima (32’1T), Liminha (44’1T), Durval (15’2T), Aquiles (23’2T), e Liminha (35’2T) e (42’2T)
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