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Os colapsos que ameaçam o Brasil: o hospitalar e o democrático

Bolsonaro controla a situação

Por Ricardo Noblat
Atualizado em 19 mar 2021, 10h19 - Publicado em 19 mar 2021, 08h00
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  • Jair Bolsonaro dispensa intermediários. Ele, em pessoa, como presidente da República, arrasta o Brasil na direção de dois tipos de colapso: o sanitário hospitalar, o maior da história, e o democrático – esse, certamente difícil de superar os pavorosos 21 anos da ditadura militar de 64. Os tempos são outros. O autoritarismo tem várias faces e diferentes meios de se impor.

    O Brasil tem 2,7% da população mundial. Nas últimas 24 horas, o número de mortos pela Covid representou 27,9% de todas as mortes ocorridas no mundo. Foram mais 2.724 mortes, o segundo maior número em toda a pandemia. O aumento só foi menor que o registrado na última terça-feira – 2.841.  É o terceiro dia consecutivo em que os óbitos ficam acima de 2.600.

    Foram registrados mais 86.982 casos, totalizando 11.780.820. Dezesseis estados e o Distrito Federal estão com ocupação de leitos de UTI acima de 90%. Dos 27 estados, 18 adotam toque de recolher. O estoque de remédios para atendimento de doentes graves está perto do fim. Quem toma decisões – o ministro da Saúde demitido ou seu sucessor ainda não empossado?

    por que imaginar que a troca de ministros poderá resultar em um salto de qualidade no combate ao vírus? O ministro de saída antecipou que seu substituto “reza pela mesma cartilha”. O ministro de entrada, que obedecerá às orientações de Bolsonaro porque foi ele o eleito para governar. Por tudo que diz e repete, Bolsonaro não mudou de lado. Segue parceiro do vírus.

    Somente ontem, no período de 12 horas, em conversa com devotos nos jardins do Palácio da Alvorada e na live das quintas-feiras no Facebook, Bolsonaro voltou a defender o tratamento preventivo de de infectados com drogas ineficazes, entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal contra o toque de recolher que chama de Estado de Sítio, e atacou governadores, Lula e o PT.

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    A quem desconfia estar doente, aconselhou: “Você passou mal, está com um pouco de dor de cabeça, dor nos olhos, um pouco de febre, resfriado, vai para o médico. Alguns nem vão, já tomam logo remédio ‘para matar piolho’, porque falar o nome também não pode. E eu tomei outro e me dei bem, e milhares de pessoas têm se socorrido nesse tratamento inicial e seguraram”.

    Para desacreditar o avanço da doença no Brasil, tentou plantar a dúvida: “Parece que só morre de Covid. Os hospitais estão com 90% da UTI ocupada. O que a gente precisa fazer? Quantos são de Covid e quantos são de outra enfermidade”. E completou: “A gente pergunta aí, qual país do mundo que está tratando bem a questão do covid? Aponte um. Todo local está morrendo gente”.

    A seu mando, a Advocacia-Geral da União tentará derrubar na justiça medidas restritivas adotadas por três governadores. Justifica: “Isso [toque de recolher] é estado de defesa, estado de sítio que só uma pessoa pode decretar: eu. Mas, quando assino um decreto de defesa ou sítio, vai para dentro do Parlamento”. Isolamento em excesso, segundo ele, empobrece o país.

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    Adiantou ter enviado ao Congresso um projeto de lei com urgência em que define o que são atividades consideradas essenciais durante a pandemia. “É toda aquela que serve para o cidadão botar pão na mesa. Então, tudo passa a ser atividade essencial”, aduziu. Atividade essencial não fecha. Nada fecha se tudo for considerado atividade essencial. Portanto, mais mortes à vista.

    Enquanto Bolsonaro preparava o país para encarar novas mortes que poderiam ser evitadas, aconteceu mais um episódio de apagão democrático – desta vez a prisão em Brasília de três militantes do PT que estenderam uma faixa na Esplanada dos Ministérios acusando-o de genocídio. A Polícia Militar invocou a Lei de Segurança Nacional (LSN) para prendê-los.

    Herança da ditadura militar de 64 que o Congresso, por medo, finge que não existe, a LSN está sendo usada para intimidar os opositores e críticos eventuais de Bolsonaro e do seu governo. Em nome dela, no dia anterior, um sociólogo de Palmas foi intimado a depor por ter pagado um outdoor onde Bolsonaro era comparado a um “pequi roído”, algo de pouco valor no Tocantins.

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    Com base na LSN, a Polícia Federal abriu 26 inquéritos em 2019 e 51 em 2020. Nos anos anteriores, a média era de 11. Outro dia, professores da Universidade Federal de Pelotas foram obrigados a assinar um termo de ajustamento de conduta depois de criticar Bolsonaro numa transmissão digital. No ano passado, o Ministério da Justiça investigou policiais que se diziam antifascistas.

    A pesquisa Datafolha mais recente mostra que 79% dos brasileiros estão convencidos de que a pandemia fugiu ao controle das autoridades públicas, e por isso sentem medo. Enganam-se. Ao seu modo, Bolsonaro está no controle da situação, sempre esteve. Tudo está saindo conforme ele planejou. Morram os que tiveram de morrer, e daí? Se a economia afundar, seu governo acaba.

    O mais será decidido ao longo da batalha de narrativas a ser travada até o último voto da eleição de 2022 – e nisso, ele e sua turma costumam se dar bem. 

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