O deputado Eduardo Bolsonaro fala pela casa real, ainda que na sua longa explicação, muitas horas depois da reclamação do embaixador chinês, tenha se amparado na liberdade de opinião parlamentar.
Até que se encontre explicação mais plausível, vigora a leitura de que buscou desviar para a China as críticas ao presidente Bolsonaro pelo desdém com que se comportou desde que a pandemia alcançou o Brasil. Só anteontem o presidente mudou a prosa.
O tom da reclamação chinesa, por meio de seu embaixador em Brasília, é incomum no contexto diplomático. E preocupou imediatamente os parceiros comerciais brasileiros, entre os quais se insere o agronegócio, que sustenta o PIB nacional e tem na China sua maior parceira comercial.
A dupla identidade que ora o faz diplomata, ora parlamentar – fez com que Eduardo Bolsonaro utilizasse a verdadeira para rebater a reclamação chinesa e receber a aprovação do chanceler Ernesto Araújo. A China, porém, não aceitou o truque.
Na noite de ontem, em nome do governo chinês, a embaixada em Brasília não reconheceu a manifestação do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e disse continuar esperando desculpas formais. Considera que Eduardo falou pelo governo.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, não perdeu tempo: muitas horas antes do governo brasileiro se manifestar, pediu desculpas ao governo chinês em nome do parlamento brasileiro. Maia respondeu porque Eduardo disse ter se manifestado como parlamentar.
Extrai-se do episódio que o governo continua politizando o coronavírus. Ao fazê-lo distancia-se daquilo que a população mais requer em momentos dramáticos como o da epidemia atual: quem demonstre cuidados com ela.
Os cuidados formais já começaram, mas aqueles que distinguem os líderes, o da palavra que conforta, da mensagem que transmite esperança, da demonstração de importância exclusiva à saúde de todos, está em falta.
João Bosco Rabello é editor do Capital Político (capitalpolitico.com)