O caminho para construção da democracia política é longo, repleto de armadilhas e permanentes ameaças. Porém, a solidez dos princípios e objetivos do sistema assegurou ao regime uma resistência milenar.
A “Oração Fúnebre”, proferida por Péricles em homenagem aos mortos na primeira guerra do Peloponeso e (431 a.C.), foi, sobretudo, uma apologia à vitória de homens, nascidos e criados livres, sob as luzes da cultura e espírito de uma comunidade que marcaram definitivamente a evolução política da humanidade.
A democracia ateniense não foi criação ou invenção de um pensador iluminado. Está sempre em movimento como um fenômeno social, alicerçado nos seguintes ideais: eleutheria (liberdade), isonomia (igualdade diante da lei), isocracia (direito à participação política). Neste sentido, a narrativa deve ser entendida, interpretada e contextualizada a partir da tragédia de Eurípedes, “Os Heráclidas”.
Depois de dois milênios da proclamação principista do discurso de Péricles, a democracia foi destruída pelo absolutismo, despotismo, tiranias, sistemas totalitários e correu riscos de ser varrida do mapa. Renasceu com o viço iluminista. Porém, graves ameaças permanecem mimetizadas e personalizadas no populismo em franca ascensão.
Nos nossos dias, o furacão do trumpismo assassino reforçou no mundo o populismo autocrata que mudou os convencionais métodos de ataques: é uma espécie de cupim que destrói por dentro as instituições democráticas.
Na edição do Valor Econômico (06/01/21), Tiago Cavalcanti, professor de economia da Universidade de Cambridge, menciona o relatório lançado em outubro passado pelo Centro para o Futuro de Democracia de Cambridge com dados de 50 anos e cobrindo 154 países que “mostra que nos anos 90 cerca de 67% da população estava, satisfeita com a democracia. Atualmente, mais de 50% dos indivíduos nesses países se dizem insatisfeitos com a democracia e a descrença é maior nos Estados Unidos e no Reino Unido[…] No Brasil, menos de 20% se diz satisfeita com a democracia”.
Neste caldo de cultura antipolítico e antidemocrático, viceja grave armadilha: parcela significativa e decisiva nas eleições decidem pelo voto-masoquista, tendem à abstenção ou a votar no anti, menos pior, ou menos rejeitado.
No cenário Bolso x Lula, eles empatariam no teste de autoavaliação: quem é o líder capaz de salvar o Brasil? Quem mentiria mais sobre soluções rápidas, simples e erradas para economia? Para quem seria mais conveniente o conflito “eles e nós”? Quem destruiria mais rápido as instituições liberais em nome da “vontade popular”? Quem é mais honesto?
Quem vai para o trono? O Brasil merece governantes mais decentes.
Gustavo Krause foi ministro e governador