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Por que políticos têm tantas restrições a usar máscaras

Feias, abafadas e incômodas, embora necessárias, máscaras viram tema politizado nos EUA e Joe Biden usa uma para se distinguir de Donald Trump

Por Vilma Gryzinski 27 Maio 2020, 06h29
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  • Joe Biden, para muitos já eleito futuro presidente dos Estados Unidos, passou dois meses trancado no porão de casa, em quarentena, com seus 77 anos enquadrando-o na faixa de risco do novo coronavírus.

    Quando emergiu, apareceu de máscara. Pretendia, assim, passar imagem de responsabilidade – e espetar Donald Trump.

    O presidente se recusa a usar máscara porque acha que vai parecer ridículo e a imagem será explorada pelos adversários na campanha eleitoral.

    Quem tem razão, Biden ou Trump?

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    Em vários sentidos, ambos. Se um governante, ou aspirante a cargo eletivo, aparece de máscara, como é demandado ou aconselhado a todos os cidadãos, está dando um bom exemplo.

    Mas a máscara realmente é um estorvo, principalmente para um político em campanha. 

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    Esconde o rosto e suas expressões, uma maneira de comunicação mais importante até do que a fala – seres humanos são programados para “ler” o que os traços faciais transmitem, inclusive ou principalmente de maneira subconsciente.

    Também abafa a fala, o instrumento por excelência do político.

    E Trump não deixa de ter razão quando considera que ficaria ridículo. 

    Eleitores e simpatizantes podem até descontar ou aplaudir ostensivamente o uso da máscara, mas lá no fundo da mente anotam que o sujeito parece esquisito.

    Ou pouco másculo. Ou até doente.

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    O pavor a parecer intimidado pelo vírus já fez uma vítima de alto coturno, Boris Johnson, o primeiro-ministro inglês que continuou a cumprimentar todo mundo até sofrer uma variante barra pesada da Covid-19.

    Mas ele continua a não usar máscara, preferindo dar entrevistas em que é mantido o distanciamento social e os jornalistas não estão presentes fisicamente. 

    No Parlamento, agora com muito menos presentes, nem Boris nem o líder da oposição, Keir Starmer, se mascaram para o tradicional enfrentamento semanal.

    Emmanuel Macron usa máscara em locais aglomerados, mas tenta evitar ao máximo esse tipo de compromisso.

    É condenável, por excesso de vaidade ou de masculinidade, preocupar-se em proteger a própria imagem no meio de uma pandemia?

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    Com certeza, mas só as pessoas muito superficiais não julgam pelas aparências, provocava o mestre das tiradas geniais, Oscar Wilde. 

    Personalidades públicas, sejam artistas, políticos e mesmo jornalistas de televisão, vivem da imagem.

    E para um político de 77 anos como Joe Biden, a máscara pode acrescentar um elemento bem indesejado de vulnerabilidade.

    Para complicar, Biden criou uma armadilha para si mesmo. 

    Não vai poder mais aparecer sem máscara em nenhum lugar público enquanto durar a recomendação para o público em geral.

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    E sabem os deuses quando a volta do rosto exposto será liberada.

    Como acontece em todos os outros países, até a máscara foi politizada. Não usá-la virou uma forma de manifestação da direita mais durona, cobrir-se com ela passou a ser característica do campo oposto.

    Biden já tem problemas de sobra: a idade, os lapsos de linguagem e de memória, e o excesso de intimidade, no passado recente, com que tratava mulheres – uma recente acusação de estupro por enquanto não colou muito.

    A última derrapada foi numa entrevista ao cantor de rap Charlamagne the God. 

    Além do sensacional nome artístico, o rapper também faz um programa de rádio frequentado por políticos que querem parecer modernos e simpatizantes de causas negras – uma das mais garantidas maneiras de fazer besteira.

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    A de Joe Biden foi de doer. Numa espécie de resposta ensaiada, ele disse o que poderia ser traduzido como “Se você não entende se deve votar em mim ou em Trump, então tu não é negro”.

    Obviamente, tentar imitar o jeito de falar nas comunidades negras menos privilegiadas só pode dar errado.

    Deu e o candidato democrata pediu desculpas depois. Mais um pequeno vexame entrou para a lista que vai ficando cada vez maior.

    Como Joe Biden vai se jogar na fase mais acirrada da campanha quando tudo o que os políticos americanos fazem – maratonas e mais maratonas de comícios – tornou-se impossível na era do coronavírus? 

    E ainda por cima de máscara, mantendo distância de dois metros de qualquer outra pessoa que não seja a própria mulher?

    Trump tem o mesmo problema, mas é Trump. Seu público não só releva como aplaude os exageros performáticos.

    Sem contar que todas as pessoas à sua volta são testadas constantemente (o teste que dá o resultado em 15 minutos), além de submetidas ao termômetro.

    Com uma assumida fobia a germes, Trump provavelmente gostaria de usar máscara (mais luvas, óculos de proteção e macacão de hospital). 

    Na recente cerimônia em memória dos mortos de guerra, a mulher dele, Melania, o genro Jared Kushner e a nova porta-voz, Kayleigh McEnany, foram filmados de máscara no helicóptero presidencial – o tipo de ambiente apertado em que até os céticos preferem se proteger.

    Todos a retiraram assim que desceram.

    Já houve muitos casos de contágio na Casa Branca. Entre eles, o do taifeiro que serve bebidas (Coca Zero) e comida (hambúrguer ou aqueles bifões americanos) a Trump.

    A porta-voz do vice-presidente Mike Pence, Katie Miller, casada com um dos assessores mais próximos de Trump, Stephen Miller, voltou agora da “licença corona” – e anunciou que está grávida.

    Quando Stephen Miller, que é o linha duríssima da Casa Branca em relação a imigração clandestina e escreve os discursos de Trump, anunciou que estava com o vírus, houve torcida aberta para que fosse um caso fatal – este é o nível da política hoje.

    Como já tem um “certificado de imunidade”, Miller agora pode ficar bem perto de Trump.

    A ideia é de dar pesadelos a muitos oposicionistas.

    Num mundo mascarado e com distanciamento social, como seriam os tradicionais debates da campanha presidencial?

    Joe Biden de máscara e Trump sem? Separações de acrílico entre os candidatos? E ninguém na plateia?

    No fim de agosto, os dois partidos terão feito suas convenções – sabe-se lá como – e a campanha para a eleição presidencial de 3 de novembro começa para valer.

    A epidemia deverá estar desaparecendo, considerando-se seu trajeto nos países onde começou antes.

    Mas as medidas de precaução não desaparecerão magicamente.

    Com ou sem máscara, será uma campanha épica.

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