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Argentina: vitória acachapante de Javier Milei cria mais incerteza ainda

Poderia um candidato saído do nada, com ideias nada menos que mirabolantes e um plano ultra-radical, ser eleito presidente da Argentina

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 13 Maio 2024, 22h50 - Publicado em 14 ago 2023, 06h27

Essa é a pergunta que muitos sequer não têm coragem de vocalizar depois dos 30,% que Javier Milei, um outsider completo, conseguiu nas eleições primárias.

Certamente o candidato ultralibertário não está entre os timoratos. “Podemos ganhar da casta bandida e inútil no primeiro turno”, proclamou, numa euforia plenamente justificada.

Seria difícil, mas não impossível diante dos candidatos opositores: Patricia Bulllrich (17%, contando levar os11,2%  votos que foram para seu adversário interno na frente oposicionista, Horácio Rodríguez Larreta) e Sergio Massa (21,3%, mais os de se Juan Grabois, que balançou o coração dos peronistas de esquerda, com 5,8%).

Ou seja, até 22 de outubro, data do primeiro turno, podemos contar com duas certezas (fora a da sempre, as pesquisas erraram feio). Primeira, governo e oposição está empatados, com o país vivendo à beira do abismo criado por 112% de inflação e dólar a 600 pesos, uma situação limite. Segunda, a vida de Milei será incansavelmente escavocada.

O que já veio à tona agora é derrubar até os queixos mais experientes na surreal política latino-americana. Milei se diz especialista em sexo tântrico (embora seja difícil encontrar quem já tenha feito esse tipo de interlocução com ele), afirma que assistiu duas vezes a Ressurreição de Cristo e recebeu de Deus a missão de ser presidente da Argentina. Ah, sim, também fala através de uma médium com Conan, o buldogue inglês que mandou clonar, produzindo seus quatro “netinhos”, todos com nomes de economistas libertários: Murrey (Rothbard), Milton (Friedman), Robert e Lucas (Robert Lucas).

Foi de um livro de Murrey Rothbard, estrela do anarcocapitalismo abraçado por Milei, que o economista argentino tirou a ideia favorável à venda de órgãos, por motivos óbvios uma das posições que constroem a imagem que lhe valeu o apelido de “El Loco” desde o tempo da escola.

“Suas propostas poderiam gerar uma tragédia social de uma dimensão nunca vista. Essa perspectiva inquietante se sintetiza numa só palavra: dolarização”, alertou Eduardo Tanembaum no Infobae, resumindo o medo que Milei provoca entre todos os chamados atores racionais.

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Acontece que o eleitorado está mais para irracional, ou num estado de permanente bronca, esta palavra tão típica da Argentina. O “voto bronca”, como dizem, pode ter sido influenciado pelo pavoroso latrocínio de Morena Domínguez, morta a poucos  metros da escola por dois ladrões de motocicleta.

Ao contrário do que todos, de todas as tendências políticas, dizem, Milei insiste que a dolarização seria a parte mais fácil de todas de seu programa de governo. 

Apesar da imagem cuidadosamente construída de tipo bizarro (envolvendo até uma maquiadora 24 horas), Milei é economista e argumenta com eloquência sobre planos como acabar com o Banco Central (“Tirar a maquininha dos políticos”) e substituir os “ministérios sociais”, como educação e saúde, por um grande plano de desenvolvimento que devolveria a Argentina para o banco dos ricos, como era no começo do século XX.

Dá até vontade de acreditar, até que entrem no meio sexo tântrico, cachorros clonados, visões mediúnicas e a realidade objetiva de que ele não teria maioria no legislativo para fazer nada do descreve.

Milei vive sendo comparado com Jair Bolsonaro e Donald Trump, mas, do ponto de vista brasileiro, seria mais uma mistura de Jânio Quadros com Fernando Collor, unindo o estilo histriônico e o discurso articulado.

Poderia Javier Milei ir para o segundo turno? Poderia ser eleito presidente?

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São especulações de arrepiar os cabelos — uma comparação retórica que, no caso dele, que fez da cabeleira arrepiada uma marca registrada, ganha uma dimensão extra.

Pela lógica, a pessoa que irá presidir a Argentina é Patricia Bulllrich: a oposição ficou mais forte depois do fiasco peronista na gestão do país e somando todos os que não votaram no peronismo, temos 58%.

Mas num país que tem o histórico da Argentina e no qual Javier Milei saiu consagrado das primárias, é bom ter cautela. Muita cautela.

“Pensar que os políticos vão cuidar de você é como colocar seus filhos nas mãos de um pedófilo”, diz ele, numa de suas frases-bomba.

Pensar que dá para fazer prognósticos sobre a política argentina é como ser assessorado do além por Conan, o buldogue.

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