O radicalismo religioso que o Brasil já vive há alguns anos atingiu Ed René Kivitz, líder da Igreja Batista de Água Branca, uma das mais tradicionais do país, em São Paulo.
Na última semana, o pastor foi excluído da Ordem dos Pastores Batistas do Brasil em São Paulo por causa de uma pregação na qual defendeu que a Bíblia deveria ser atualizada para não “legitimar escravidão” e para que homossexuais não sejam mais condenados ao inferno por causa de textos bíblicos que não foram atualizados.
Com mais de 30 anos de pastorado, foram necessários apenas 8 minutos de um sermão para que Ed René fosse excluído da Ordem de Pastores. Em vídeo publicado em seu canal do YouTube no final de semana, o pastor diz que não se sente perseguido e nem vítima.
Mas eu, como jornalista, acompanho as redes sociais e vejo os ataques que Ed René sofre há algum tempo simplesmente porque não prega o que a cartilha radical prefere.
O pastor já criticou o presidente Jair Bolsonaro e o governo em alguns momentos. Certamente, o que ele vive hoje é resultado de uma perseguição maior que bolsonaristas fazem desde que seu líder assumiu o poder. Mesmo que não se ache perseguido, Ed René sabe que há um movimento preocupante acontecendo no Brasil e no mundo.
“O que está acontecendo comigo, esse desligamento reflete, é simbólico, é icônico de um momento de mundo, um momento de Brasil e reflete explicitamente que existe uma ruptura no movimento evangélico brasileiro, inclusive uma ruptura na denominação batista do Brasil”, afirma o pastor no vídeo.
O movimento de ruptura é real. Como sobrinho bisneto, neto, sobrinho e primo de pastores, posso dizer com propriedade que há, sim, uma exclusão daqueles que não acompanham o radicalismo da religião. Até o final de 2018, no auge das eleições, frequentei diversas igrejas e me senti excluído por não seguir a cartilha, e por defender as liberdades individuais, assim como Ed René Kivitz.
“Esse momento da minha vida é mais uma gota num rio que vai se tornando cada vez mais caudaloso e que vai gerar um novo lá na frente, porque há muita inquietação, muita indignação, há muito inconformismo, há muito questionamento e há muita gente interessada sim em repensar, em refletir, em reafirmar liberdades, há muita gente interessada sim em atualizar o entendimento das escrituras, atualizar o entendimento do Evangelho”, disse de forma certeira o pastor.
Depois de admitir que há uma “tentativa de controle”, o líder da Igreja Batista de Água Branca afirmou que está experimentando aquilo que ele afirmou que acontece: a exclusão é real.
“Eu hoje experimento aquilo que eu disse que acontece e que já vi acontecer tantas vezes. Num mundo de exclusão, quem é contra a exclusão é excluído. É muito simbólico que eu seja desligado da Ordem por ter pregado um sermão dizendo que precisamos parar de excluir pessoas. É muito inônico e muito profético que eu seja desligado por ter dito que se continuarmos a tratar a Bíblia de maneira dogmática, autoritária e com essa leitura fundamentalista, nós continuaremos excluindo pessoas. Então eu fui excluído por dizer isso”, afirmou.
Como jornalista, expresso publicamente nesta coluna a minha admiração pelo trabalho que Ed René está fazendo como pastor. Pessoalmente, estou preparando uma lista dos pastores brasileiros que apoiaram Jair Bolsonaro. Na minha visão, é importante fazer esse registro para a história.
Em alguns anos, esse tempo sombrio vivido pelo nosso país será estudado e o jornalismo profissional será uma ferramenta de informação para aqueles que vão estudar a tragédia que foi para o país o movimento evangélico brasileiro se aliar a um governo fascista encabeçado por Jair Bolsonaro.
Ed René afirmou que vai continuar pregando o Evangelho como sempre fez. Ainda bem. Num mundo de covardias e injustiças, é um alívio ver que existem líderes com coragem para enfrentar a correnteza e lutar por aquilo que acreditam.