O ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro está sem cargo desde o dia 24 de abril, quando pediu demissão em meio a uma queda-de-braço com o presidente Jair Bolsonaro em torno do comando da Polícia Federal. Desde então, no entanto, o ex-juiz da Operação Lava Jato continua no embate político com o governo a que serviu por um ano e quase quatro meses, às vezes com palavras duras, às vezes com ironia.
O tom, no entanto, é sempre de quem não vai deixar de cutucar o governo tão cedo. Há quem aposte, com razoável dose de razão, que o embate de verdade entre Moro e Bolsonaro só vai se dar em 2022, quando os dois poderão se enfrentar na disputa da eleição presidencial. Moro não tem nem partido e nega sempre que será candidato, mas pesquisas de opinião mostram que ele seria um osso duro de roer para o atual presidente.
As críticas também deixam bem claro que ele vai se situar na oposição ao atual governo. Só nesta quinta-feira, 11, ele publicou dois posts no Twitter críticos a Bolsonaro. No primeiro, ironiza a recriação do Ministério das Comunicações e a entrega do seu comando ao deputado federal Fábio Faria (PSD-RN), genro do apresentador Silvio Santos, dono da rede de televisão SBT.
Recriado o Ministério da Propaganda. Quais serão os próximos?
Publicidade— Sergio Moro (@SF_Moro) June 11, 2020
Depois, usa o ex-presidente americano Theodore Roosevelt (1901 a 1909) para voltar a cutucar uma ferida antiga: a suposta tentativa de Bolsonaro de interferir na escolha de superintendentes e do diretor-geral da PF, instituição que estava sob o seu guarda-chuva no governo.
Da série estadistas: “O melhor dirigente é aquele que tem bom senso o suficiente para escolher boas pessoas para fazer o que ele quer que seja feito e auto-restrição suficiente para não interferir enquanto os escolhidos fazem o trabalho.” Theodore Roosevelt pic.twitter.com/Kb8ZDbKlW8
— Sergio Moro (@SF_Moro) June 11, 2020
Também criticou a troca de comando do Ministério da Saúde, que perdeu dois ministros em menos de um mês – Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich -, em meio à pandemia do coronavírus e emendou com uma crítica à tentativa do sucessor de ambos, general Eduardo Pazuello, de mudar a forma de divulgar os números de casos e mortos pela doença.
Imagine um avião em pleno voo na tempestade que, de repente, perde o piloto, depois o substituto do piloto e, por fim, inverte a lógica dos instrumentos de navegação. Não tem como dar certo. Transparência e rumo são fundamentais, especialmente em cenário de crise.
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Aqui, uma cutucada: o ex-ministro comemora a denúncia pela Operação Lava-Jato, por meio da Procuradoria-Geral da República, por corrupção do deputado federal Arthur Lira (Progressistas-AL), o cacique do Centrão que mais tem negociado apoio do bloco a Bolsonaro e que se tornou uma espécie de líder informal do governo na Câmara.
A Operação Lava Jato continua rendendo frutos. https://t.co/vLNGk059AZ
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De vez em quando, ele publica um post rebatendo alguma acusação de Bolsonaro – esta, feita pelo presidente nas suas explanações tradicionais na chegada e saída do Palácio da Alvorada, na qual chamou Moro de “covarde” por supostamente ser a favor da prisão de quem descumprisse a quarentena contra o coronavírus e por dificultar a política de liberação de armas defendido pelo presidente.
Algumas verdades necessárias. pic.twitter.com/595bNrrBh0
— Sergio Moro (@SF_Moro) June 1, 2020
Em um exemplo de ironia, o ex-juiz faz troça do protesto com estética fascista comandado pela ativista bolsonarista Sara Winter em uma noite de sábado contra o Supremo Tribunal Federal. Um grupo de cerca de 30 pessoas portava velas e usava máscaras lembrando passeatas nazistas e eventos de supremacistas brancos, como os da Ku Klux Klan, nos Estados Unidos.
Tão loucos mas, ainda bem, tão poucos. O único inverno chegando é o das quatro estações.
Publicidade— Sergio Moro (@SF_Moro) May 31, 2020
Aqui, ele mira os aliados mais radicais de Bolsonaro, que são alvos do chamado inquérito das fake news tocado pelo STF. O comentário veio após operação de busca e apreensão feita pela PF em endereços de bolsonaristas, que se defenderam dizendo que a iniciativa feria a liberdade de expressão.
Campanhas difamatórias contra adversários, ameaças e notícias falsas não têm a ver com liberdade de expressão. Um debate que não pode tirar o foco do que importa agora:defender o estado de direito e a vida.Meu respeito à democracia,ao Judiciário e às famílias de vítimas da Covid.
— Sergio Moro (@SF_Moro) May 28, 2020
Nos dois próximos posts, de novo responde ao presidente. No primeiro, rebate Bolsonaro após ele ser acusado de não se esforçar para impedir o cerco do Ministério Público e da polícia do Rio a seus filhos. No segundo, posta entrevista à Time na qual afirmou que não entrou no governo “para servir a um mestre”.
Não cabe também ao Ministro da Justiça obstruir investigações da Justiça Estadual, ainda que envolvam supostos crimes dos filhos do Presidente. As únicas buscas da Justiça Estadual que conheço deram-se sobre um filho e um amigo em dezembro de 2019 e não cabia a mim impedir. pic.twitter.com/OuhBs9oFxY
— Sergio Moro (@SF_Moro) May 23, 2020
Não entrei no Governo para servir a um mestre. Entrei para servir ao País, à Lei. https://t.co/VKvDqW4nDM
— Sergio Moro (@SF_Moro) May 21, 2020
Abaixo, ele dá um puxão de orelha em Bolsonaro após o presidente, em uma de suas tradicionais lives no Facebook, ter feito piada sobre a cloroquina e os seus adversários políticos. “Quem é de direita usa cloroquina, quem é de esquerda usa tubaína”, disse o chefe do Executivo às gargalhadas, num momento já crítico da pandemia da Covid-19,.
O coronavírus não é piada nem é algo positivo. Cuide-se! O número de mortes passou de mil por dia e continua subindo. Solidariedade às famílias.
— Sergio Moro (@SF_Moro) May 20, 2020
Aqui, ele cobra esclarecimentos de fatos revelados em entrevista de outro ex-aliado de Bolsonaro, o empresário Paulo Marinho, ao jornal Folha de S. Paulo, na qual afirmou que um dos filhos do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), havia sido avisado antes de operação da PF, que teria sido retardada para não interferir no segundo turno da eleição presidencial.
Espero que os fatos revelados,
com coragem, pelo Sr. Paulo Marinho sejam totalmente esclarecidos.— Sergio Moro (@SF_Moro) May 17, 2020
Enfim, o ex-juiz Sergio Moro pode até não ser candidato, mas a postura é de quem também não descarta seguir na política.