Quando Augusto Aras comandava o Ministério Público Federal, a acusação mais frequente que recebia era a de que passava uma certa leniência em relação às investigações envolvendo políticos, em especial o então presidente Jair Bolsonaro, por quem havia sido indicado ao cargo. Agora, com pouco mais de quatro meses no posto, o seu sucessor, Paulo Gonet, tem demonstrado firmeza, sem perder a independência, na condução dos processos que envolvem o ex-presidente e seus aliados — personagens de todas as apurações em andamento com potencial para promover algum tipo de combustão política.
Veja a seguir seis pareceres do novo PGR em casos envolvendo o ex-presidente Bolsonaro e seus aliados.
1. Fraude em vacinação
Contrariando a Polícia Federal, para quem o inquérito estava concluído, Gonet pediu que continuassem as investigações sobre fraude nos cartões de saúde de Bolsonaro e sua filha mais nova, Laura. Antes de decidir se vai ou não oferecer denúncia, o PGR quer ter acesso à íntegra das intercepções dos investigados e receber resposta do ofício enviado ao Departamento de Justiça dos EUA, para saber se o ex-presidente tentou entrar no país usando o documento falso. O ministro Alexandre de Moraes ficou do lado de Gonet e mandou a investigação continuar.
2. Golpe de estado
A megaoperação da Polícia Federal em 8 de fevereiro, que teve Bolsonaro e seus aliados próximos como alvos, contou com o aval do PGR. Gonet continua, inclusive, defendendo a continuidade da prisão do ex-assessor da Presidência Filipe Martins. A diligência é controversa: o argumento usado por Moraes para colocá-lo atrás das grades foi o fato de ele ter supostamente saído do país na comitiva de Bolsonaro no final de 2022. Contudo, o ex-assessor foi preso na casa da namorada, em Ponta Grossa (interior do Paraná), cidade de onde afirma nunca ter saído desde que perdeu o emprego no Planalto.
No entanto, esse caso teve uma divergência entre o PGR e o ministro. Gonet foi contra apreender o passaporte e impedir o cacique Valdemar Costa Neto de conversar com os demais presos na operação. Moraes deferiu o pedido da PF, e impôs ao presidente do PL medidas tão duras quanto as dos demais investigados.
3. Estadia na embaixada
Depois dessa operação, o ex-presidente passou dois dias na embaixada da Hungria. O gesto lhe rendeu um inquérito — que não foi para frente. O PGR concluiu que Bolsonaro não tentou violar a proibição de sair do País e pediu o arquivamento do caso. O relator no Supremo, Alexandre de Moraes, concordou com esse entendimento.
4. Carla Zambelli
Gonet é responsável pela primeira denúncia criminal contra aliados de Bolsonaro. No dia 23 de abril, ele acusou a deputada no STF pela invasão dos sistemas do Conselho Nacional de Justiça, operacionalizada pelo hacker Walter Delgatti, também denunciado. Os dois respondem pelos crimes de invasão de dispositivo informático e falsidade ideológica, cujas penas somadas chegam a nove anos. A parlamentar ainda pode receber um agravante por ser funcionária pública.
5. Abin de Alexandre Ramagem
Outro parlamentar e aliado de Bolsonaro que esteve na mira da PF este ano foi o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), que foi diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Nesse caso, Moraes e Gonet discordaram sobre a inclusão de uma das assessoras do deputado na operação de que ele foi alvo no final de janeiro. Moraes, assim como no caso de Valdemar, ficou ao lado da PF e incluiu-a nas buscas feitas pela corporação.
6. Inelegibilidade mantida
Bolsonaro levou ao Supremo um recurso contra a sua primeira condenação à inelegibilidade — quando o TSE decidu que houve abuso de poder político na reunião em que, na qualidade de presidente da República, ele discursou diante de embaixadores no Palácio do Planalto atacando o sistema eleitoral brasileiro. O caso está sob relatoria do ministro Cristiano Zanin e ainda não foi julgado. No último dia 25, Gonet se manifestou pedindo que a decisão do TSE seja mantida e que Bolsonaro continue inelegível.