Assine VEJA por R$2,00/semana
Maílson da Nóbrega Por Coluna Blog do economista Maílson da Nóbrega: política, economia e história
Continua após publicidade

O orçamento nunca foi “autorizativo”

Torná-lo impositivo é uma exigência civilizatória

Por Maílson da Nóbrega Atualizado em 30 jul 2020, 19h05 - Publicado em 20 mar 2020, 06h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Uma lenda virou verdade: “O Orçamento é autorizativo”. A lei orçamentária “autoriza” gastos, mas o governo cumpre o que quiser. Isso é repetido por servidores da área econômica, jornalistas, economistas e até, pasmem, por parlamentares. O Orçamento é e sempre foi “impositivo”.

    Publicidade

    Pela Constituição, artigo 165, parágrafo 8º, “a lei orçamentária anual não conterá dispositivo estranho à previsão da receita e à fixação da despesa”. São dois vocábulos distintos. O primeiro se refere à estimativa da receita, pois não há como ser preciso nesse campo. O segundo traduz uma determinação, isto é, uma imposição.

    Publicidade

    Questões orçamentárias estão na origem da democracia. Seu primeiro marco é a Carta Magna inglesa (1215). A elevação de impostos passou a depender da prévia autorização de barões e bispos reunidos em um Parlamento.

    A Revolução Gloriosa inglesa (1688) transferiu a supremacia do poder do rei para o Parlamento. O monarca perdeu poderes absolutos, enquanto os legisladores ganharam a prerrogativa de aprovar também a despesa pública. O Orçamento tornou-se uma lei, que como tal deve ser cumprida. É o que também decorre das constituições nascidas da Revolução Americana (1775-1783) e da Revolução Francesa (1789). Nelas, o Orçamento é impositivo.

    Publicidade

    “Esta é a hora de livrar o país dos custos das aberrações que rondam o Orçamento”

    Continua após a publicidade

    No Brasil, ao contrário, o assunto nunca foi levado a sério. Antes, os parlamentares aproveitavam a discussão do Orçamento para nomear protegidos e dar nome a ruas. Por isso a Constituição de 1937 incluiu um dispositivo acaciano, ainda presente no mesmo artigo 8º da Constituição: a lei orçamentária não conterá dispositivo estranho à receita e à despesa. Qual seria outro?

    Publicidade

    Aqui, o presidente da República emite um “decreto de programação”, estabelecendo o que vai cumprir da lei orçamentária. E todo mundo aceita como parte das tradições e dos costumes. Funcionários do Tesouro exercem o poder de “gerenciar” o Orçamento, controlando gastos na “boca do caixa”. A prática explica obras paradas que não recebem os recursos inscritos no Orçamento.

    Esse “contingenciamento” não existe em democracias sérias. Nelas, quando é necessário efetuar cortes orçamentários, cabe ao Parlamento autorizá-los. É mais demorado, todavia permite a discussão pública sobre as mudanças.

    Publicidade

    Recentemente, o Congresso decidiu que o relator do Orçamento pode designar as áreas em que aplicar 30 bilhões de reais no exercício de 2020. É uma inovação inacreditável: um parlamentar exerceria funções típicas do Poder Executivo. Haja criatividade!

    Continua após a publicidade

    Existem muitas outras esquisitices, que o espaço não permite analisar. Caso, por exemplo, da interpretação marota dos relatores do Orçamento, pela qual “reestimam” as receitas. Driblam a norma segundo a qual emendas parlamentares dependem do cancelamento de outras dotações.

    Publicidade

    Em um momento de crise econômica, provocada pelo avanço do coronavírus, que demanda uma resposta efetiva do governo, esta é a hora de discutir seriamente a matéria, de forma a livrar o país dos custos das aberrações institucionais que rondam o Orçamento.

    Publicado em VEJA de 25 de março de 2020, edição nº 2679

    Publicidade
    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Domine o fato. Confie na fonte.

    10 grandes marcas em uma única assinatura digital

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo
    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 2,00/semana*

    ou
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 39,90/mês

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.