Em entrevista na Folha de S. Paulo de hoje, Marina Silva defendeu, caso seja eleita, a constituição de uma “banca de seleção” incumbida de escolher indicados para ocupar postos estratégicos na administração federal. Funcionários de carreira terão prioridade em ministérios, estatais e agências de regulação.
A proposta ataca uma das principais deficiências do serviço público brasileiro, que tem 25.000 cargos de indicação política apenas no governo federal. Se considerados os estados e municípios, a conta passa facilmente dos 50.000. Além disso, a escolha costuma frequentemente recair em pessoas sem as qualificações para o exercício dos cargos.
Além das ineficiências que daí decorrem, ressalta a descontinuidade, que é uma das fontes de desperdício de tempo, talentos e recursos. A dança frequente das cadeiras, mesmo que ocupadas por pessoas competentes, gera alteração de programas, metas e processos. Servidores de carreira são desestimulados por terem que lidar com ordens (ou a falta delas) oriundas de pessoas despreparadas para liderá-los.
Marina precisaria explicitar a “prioridade” para funcionários de carreira. Mesmo os que condenam o atual método de escolha acham que caberia reservar os cargos exclusivamente para servidores de carreira. Seria consertar um erro com outro. Isso criaria feudos e inibiria a participação de especialistas de fora, os quais, se bem selecionados, podem contribuir para oxigenar o ambiente e para inovar métodos e processos.
Marina provavelmente conhece a história do serviço público britânico. Por isso, deveria examinar como lá são feitas as escolhas. O Reino Unido foi o primeiro país ocidental a profissionalizar carreiras do setor público e a instituir métodos impessoais de escolha (os chineses já haviam feito isso com seus mandarins, séculos antes).
A origem do serviço público britânico é o relatório Northcote-Trevelyan, de 1854. Stafford H. Northcote era um parlamentar que depois virou Chancelor of the Exchequer (o ministro da Fazenda) e C. E. Trevelyan era o secretário permanente do Tesouro, uma espécie de secretário executivo de ministério no Brasil.
No Reino Unido, dependendo de como se faz a conta, há apenas entre 100 e 300 cargos de indicação política, incluídos os ministros e assessores diretos. As escolhas para os cargos são feitas por comissões independentes, constituídas em sua maioria de especialistas provenientes do setor privado.
Para os “postos estratégicos”, como diz Marina, há a participação de consultorias privadas especializadas (head hunters), que selecionam os melhores para as posições, considerando candidatos do serviço público permanente e de fora dele. Por exemplo, o equivalente a Secretário da Receita Federal (o Inland Revenue Service) e semelhantes são escolhidos com a colaboração dessas consultorias.
Na escolha britânica, não há prioridade para servidores de carreira. Marina precisa incluir essa condição para que sua proposta de modernizar o nosso serviço público seja a melhor possível.