Assine VEJA por R$2,00/semana
Letra de Médico Orientações médicas e textos de saúde assinados por profissionais de primeira linha do Brasil
Continua após publicidade

Infecções comuns no paciente com diabetes

Saiba porque algumas infecção são mais frequentes e/ou mais graves em pacientes com diabetes mellitus

Por Artur Timerman
27 nov 2017, 15h23
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Por quais motivos o paciente com diabetes mellitus é mais propenso a adquirir infecções? Por que motivo essas infecções se revestem de maior gravidade nesses pacientes? Quais são as infecções mais comumente encontradas em pacientes com diabetes? Quais são as peculiaridades dos aspectos epidemiológicos e clínicos do paciente diabético que desenvolve infecção? Como se pode prevenir as complicações infecciosas em pacientes com diabetes mellitus?

    Publicidade

    A maioria dos clínicos tem conhecimento que doenças infecciosas ocorrem com maior frequência e/ou são mais graves em pacientes com diabetes, muitas vezes associando-se a incrementos nos índices de morbimortalidade. Uma série de evidências ‘in vitro’ demonstra que tal associação correlaciona-se a uma série de fatores consequentes ao ambiente hiperglicêmico, que caracterizam o paciente com diabetes mellitus, dentre os quais podemos ressaltar:

    Publicidade
    1. A atividade funcional dos neutrófilos encontra-se comprometida: evidencia-se em ambientes hiperglicêmicos redução da mobilização de leucócitos polimorfonucleares (PMN), assim como também se caracterizam deficiências em sua quimiotaxia e atividade fagocítica. Além disso, nesse mesmo ambiente observa-se inibição da atividade enzimática da glicose-6-fosfato-dehidrogenase e da transmigração transendotelial dos PMNs, ao mesmo tempo em que se eleva seu índice de apoptose. A atividade funcional dos linfócitos CD4 também se encontra prejudicada em pacientes nos quais o índice de hemoglobina glicada esteja acima de 8,0%.
    2.  Depressão dos sistemas antioxidantes: nos tecidos nos quais a presença de insulina não se faz necessária para o transporte de glicose, o ambiente hiperglicêmico circunjacente acarreta incremento nos níveis intracelulares de glicose, à qual é então metabolizada através do emprego de NADPH como co-fator. Destarte, o decréscimo nos níveis de NADPH acaba por impedir a regeneração de moléculas que têm papel fundamental nos mecanismos anti-oxidativos no interior da célula, acarretando por consequência elevação na suscetibilidade celular ao estresse oxidativo.
    3. Comprometimento da imunidade humoral: tanto o sistema de ativação do complemento como a atividade funcional dos anticorpos podem se mostrar comprometidos em pacientes com diabetes. Dessa forma, alguns estudos demonstraram deficiência do componente C4 do complemento, enquanto outros demonstram que tal deficiência pode ser decorrente da disfunção dos PMNs. No que tange à produção de anticorpos, observa-se em pacientes diabéticos glicosilação da molécula de imuneglobulina, que se incrementa paralelamente à elevação dos níveis de Hb glicosilada, fato que pode acarretar seu
      comprometimento funcional.
    4. Redução na produção de interleucinas: os macrófagos e monócitos de pessoas com diabetes secretam menor quantidade de interleucina 1 (IL-1) e IL-6 em resposta ao estímulo de lipopolissacarídeos, aparentemente em decorrência da presença de defeito intrínseco nas células do paciente diabético. Por outro lado, incremento na glicosilação pode vir a inibir a produção de IL-10, Fator de Necrose Tumoral (TNF) e interferon-gama pelas células mieloides. Da mesma forma, essa elevada glicosilação acarreta redução da expressão na superfície de células mieloides do complexo de histocompatibilidade (MHC) classe I e, por conseguinte, prejudicando todo encadeamento da resposta imunológica iniciada pela interação dos antígenos com esse complexo MHC.

    Como consequência desses distúrbios anteriormente mencionados, uma série de infecções é mais comumente evidenciada ou se expressa com maior gravidade em pacientes diabéticos. Na seguinte tabela encontram-se enumerados os riscos relativos para o advento de infecção em um paciente diabético quando se o compara a um paciente sem diabetes. Como pode ser observado, alguns tipos de infecções são caracteristicamente mais observadas em pacientes com diabetes, dentre as quais podemos ressaltar:

    Incremento no risco de infecção associado ao diagnóstico de diabetes mellitus:

    Diagnóstico Incremento do Risco Frequência em população por diabéticos (por 100.000)
    Todas doenças infecciosas 1,21 46,048
    Infecções de tratamento ambulatorial Incremento do Risco Frequência em população por diabéticos (por 100.000)
    Infecções do trato respiratório alto 1,18 28.454
    Cistite 1,39 5.491
    Pneumonia 1,46 4.919
    Celulite 1,81 4.626
    Infecções intestinais 1,50 4.087
    Otite externa 1,14 1.734
    Micose superficial 1,38 1.396
    Infecções genitais em homens 0,89 1.340
    Otite média 1,21 1.071
    Herpes zoster 1,16 816
    Hepatite virótica 1,49 682
    Pielonefrite 1,95 486
    Tuberculose 1,12 344
    Osteomielite 4,39 340
    Herpes simplex 0,92 253
    Infecções trato genital feminino 1,16 234
    Mononucleose 1,60 150
    Abscesso retal 1,97 144
    Mastoidite 1,06 99
    Artrite infecciosa 1,72 98
    Infecção HIV 0,96 57
    Doenças infecciosas com hospitalização Incremento do Risco Frequência em população por diabéticos (por 100.000)
    Sepse 2,45 539
    Infecções pós-cirúrgicas 2,02 283
    Infecções vias biliares 1,60 173
    Peritonite 1,94 93
    Apendicite 1,19 62

      Infecções do trato respiratório

      Dentre as infecções do trato respiratório, destacam-se as infecções por Streptococcus pneumoniae e pelo vírus influenza. Deve-se salientar o dado de que durante os surtos anuais de infecção por influenza, há seis vezes mais chance de que um paciente com diabetes venha a requerer internação hospitalar quando comparado à população normal. A despeito do fato de que essas duas infecções são preveníveis pelo emprego de vacinas, é lastimável que seu emprego em pacientes com diabetes não faça ainda parte da prática médica da maioria dos responsáveis por esses pacientes; recomendam as normas de boas práticas clínicas, que se implemente expressivamente a administração desses agentes imunizantes.

      Publicidade
      Continua após a publicidade

      A vacina anti-pneumocócica preferível é aquela composta por 23 polissacarídeos que induziriam imunidade contra os sorotipos mais comumente associados à doença invasiva; a mesma deveria ser repetida a cada 5 anos. Já a vacina contra influenza deve ser administrada anualmente.

      Infecções de Pele e Partes Moles (IPPM)

      Pacientes com diabetes mellitus são mais predispostos a desenvolver infecções da pele e partes moles tais como: foliculites, furunculoses e abscessos. Tais infecções muitas vezes se correlacionam à colonização das narinas por Staphylococcus aureus, que se constituem muitas vezes em verdadeiros nichos ecológicos dessas bactérias. Até 25% dos adultos podem ser carreadores deste micro-organismo em suas narinas.

      Publicidade

      Pacientes diabéticos, assim como aqueles submetidos à diálise, usuários de drogas injetáveis, portadores de doenças dermatológicas, infectados pelo vírus da imunodeficiência humana apresentam maior incidência de colonização que a população geral. Principalmente no ambiente hospitalar, mas também fora dele, muitas vezes essa colonização se dá por intermédio de cepas multiresistentes dessa bactéria.

      Continua após a publicidade

      As IPPMs podem sobrevir durante o transcurso da doença, mas muitas vezes constituem-se na primeira manifestação clínica da mesma; outra característica relevante é que as mesmas comumente se expressam com maior gravidade nessa população de pacientes.

      Publicidade

      Algumas IPPMs merecem ser consideradas à parte:

      Infecções do Trato Urinário

      As infecções do trato urinário (ITU) ocorrem com maior frequência e também se apresentam revestidas de maior gravidade em pacientes com diabetes mellitus, assim como também são mais comumente correlacionadas à complicações. Os fatores mais frequentemente associados ao advento de ITUs em pacientes com diabetes são:

      Devemos ressaltar algumas peculiaridades nas manifestações clínicas das ITUs, a saber:

      Infecções do Trato Gastrintestinal

      A maior prevalência e gravidade das infecções do trato gastrintestinal em pacientes diabéticos prende-se primordialmente às alterações na motilidade intestinal comumente neles observada. Dessa forma, gastroenterites comumente se manifestam mais frequentemente e com maior gravidade nessa população.

      Outras infecções que podem também ser mais comumente observadas em pacientes com diabetes são: Gastrites causadas por Helicobacter pylori (dados controversos quanto à epidemiologia; maior dificuldade de erradicação); candidíase oral e esofágica (verificada principalmente em pacientes com pobre contrôle nos níveis glicêmicos) e colecistite enfisematosa (observada principalmente em pacientes do sexo masculino).

      Continua após a publicidade

      Nos últimos anos vem cada vez mais sendo valorizadas observações quanto à importância da microbiota humana na manutenção da saúde humana; distorções observadas em qualquer uma das diferentes funções dessa microbiota ou nos seus mecanismos de sinalização têm sido associados potencialmente à gênese de uma série de doenças, dentre elas se destacando doenças cardiovasculares, diabetes (associando-se a má coordenação da absorção de carboidratos e o consequente descontrole no controle glicêmico), doenças inflamatórias (incluindo-se doenças atópicas), doenças inflamatórias intestinais e até mesmo doenças neoplásicas.

      Mais recentemente vários estudos têm correlacionado alterações na microbiota à obesidade, conquanto haja alguns outros que não evidenciaram tal associação. O que podemos concluir a partir de todos estudos é que indubitavelmente, a microbiota intestinal tem papel significativo no diferencial de energia obtido a partir da fermentação de fibras. Esses pequenos ganhos adicionais de energia, caso venham a ser absorvidos pelo hospedeiro, podem após algum tempo resultar em ganho de peso; além disso, alguns mecanismos sinalizatórios emitidos por bactérias dessa microbiota podem se correlacionar a uma maior capacidade de armazenamento de gordura.

      Devemos também ressaltar que vários estudos clínicos e soroepidemiológicos têm corroborado o papel desempenhado pelos enterovírus na patogênese do diabetes mellitus tipo 1 (diabetes juvenil), em especial os vírus Coxsackie B4 e B3, quando os mesmos infectam indivíduos geneticamente predispostos. Tal associação pode ser deduzida pelas seguintes observações:

      Continua após a publicidade

      Os mecanismos que podem estar implicados nessa fisiopatogênese seriam:

      Outras infecções

      devemos ressaltar também outras importantes associações entre infecções que acometem mais frequentemente e/ou de maneira mais severa pacientes com diabetes. Dentre elas enfatizamos:

       

      Artur Timerman

       

      Quem faz Letra de Médico

      Adilson Costa, dermatologista
      Adriana Vilarinho, dermatologista
      Ana Claudia Arantes, geriatra
      Antonio Carlos do Nascimento, endocrinologista
      Antônio Frasson, mastologista
      Artur Timerman, infectologista
      Arthur Cukiert, neurologista
      Ben-Hur Ferraz Neto, cirurgião
      Bernardo Garicochea, oncologista
      Claudia Cozer Kalil, endocrinologista
      Claudio Lottenberg, oftalmologista
      Daniel Magnoni, nutrólogo
      David Uip, infectologista
      Edson Borges, especialista em reprodução assistida
      Fernando Maluf, oncologista
      Freddy Eliaschewitz, endocrinologista
      Jardis Volpi, dermatologista
      José Alexandre Crippa, psiquiatra
      Ludhmila Hajjar, intensivista
      Luiz Rohde, psiquiatra
      Luiz Kowalski, oncologista
      Marcus Vinicius Bolivar Malachias, cardiologista
      Marianne Pinotti, ginecologista
      Mauro Fisberg, pediatra
      Miguel Srougi, urologista
      Paulo Hoff, oncologista
      Paulo Zogaib, medico do esporte
      Raul Cutait, cirurgião
      Roberto Kalil, cardiologista
      Ronaldo Laranjeira, psiquiatra
      Salmo Raskin, geneticista
      Sergio Podgaec, ginecologista
      Sergio Simon, oncologista

      Publicidade
      Publicidade

      Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

      Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

      Domine o fato. Confie na fonte.

      10 grandes marcas em uma única assinatura digital

      MELHOR
      OFERTA

      Digital Completo
      Digital Completo

      Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

      a partir de R$ 2,00/semana*

      ou
      Impressa + Digital
      Impressa + Digital

      Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

      a partir de R$ 39,90/mês

      *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
      *Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

      PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
      Fechar

      Não vá embora sem ler essa matéria!
      Assista um anúncio e leia grátis
      CLIQUE AQUI.