Demência é um diagnóstico clínico que indica a redução progressiva das capacidades cerebrais, levando à perda de autonomia e da qualidade de vida. Dentre múltiplas causas, a doença de Alzheimer é a mais frequente em pessoas com mais de 65 anos de idade.
Nesse contexto, observam-se dois processos que levam ao comprometimento dos neurônios e das funções cognitivas. O primeiro é o acúmulo de placas amiloide fora das células cerebrais. Já dentro dos neurônios, ocorre o acúmulo progressivo de emaranhados formados pela proteína tau.
As proteínas amiloide e tau são dejetos do metabolismo cerebral, que, quando não eliminadas, se acumulam em níveis perigosos para o cérebro. Tornam-se, assim, tóxicas para o órgão, levando à morte de suas células e à quebra de conexões entre elas. Isso culmina na perda da memória, em problemas de orientação no tempo e no espaço e em déficits de linguagem.
Esse processo é silencioso na fase inicial do Alzheimer, começando anos antes do início dos sintomas. Essa é uma das razões que fazem com que as atuais terapias disponíveis para a demência ofereçam um benefício modesto, haja vista a magnitude dos danos cerebrais impostas pela doença ao longo do tempo.
Dessa forma, prevenir o acúmulo de proteínas tóxicas nas fases iniciais da doença de Alzheimer é uma estratégia que, apesar de ser desafiadora, se mostra plausível para evitar ou retardar a demência.
Recentemente, exames chamados biomarcadores têm permitido detectar o Alzheimer em uma fase mais precoce, em pacientes ainda sem demência. Esses biomarcadores identificam as proteínas toxicas mais de dez anos antes dos primeiros sintomas.
Com tal avanço, hoje podemos distribuir o Alzheimer em três estágios clínicos: o estágio assintomático, na ausência de sintomas; o estágio do comprometimento cognitivo leve, quando essas proteínas coexistem com a perda da memória em pessoas que vivem de forma independente; e a demência, quando surgem os sintomas devastadores da doença.
O desenvolvimento de biomarcadores foi um marco decisivo para a introdução das novas terapias capazes de eliminar as proteínas causadoras do Alzheimer ainda nos estágios iniciais, com o intuito de prevenir o dano cerebral. Atualmente, a primeira geração destas terapias visa retirar as placas amiloides, que é o fenômeno-chave no Alzheimer.
Esses medicamentos são administrados por infusões venosas e estão associados a efeitos adversos que devem ser monitorizados por especialistas. Porém, pouco ajudarão os 1,2 milhões de brasileiros ou 55 milhões no mundo que atualmente vivem com a fase mais avançada da doença.
A demência é considerada um problema de saúde pública pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e se estima que 75% das pessoas que vivem com o quadro são subdiagnosticadas, ou seja, não sabem que têm demência.
Por se tratar de uma prioridade diante do envelhecimento populacional, existe a urgência de aumentar o acesso aos exames com biomarcadores e às novas terapias – um desafio especialmente para países em desenvolvimento como o nosso, em que a doença representa uma ameaça aos sistemas de saúde e serviços sociais.
Fora a doença de Alzheimer em si, é importante lembrar que há outras causas frequentes de demência, como a demência frontotemporal, a demência de corpos de Levy, as doenças cerebrovasculares, abuso de álcool ou drogas, doenças sexualmente transmissíveis e deficiências nutricionais.
Também é importante ter em mente que hábitos saudáveis e o controle da pressão alta, do diabetes e do colesterol, bem como estímulos cognitivos e cuidados com a audição, são fundamentais para manter a saúde do cérebro e reduzir o risco de demência.
* Pedro Rosa-Neto é neurologista e médico do novo Centro de Memória do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre