Coração verde: estudo com gêmeos mostra benefícios da dieta vegana
Médica comenta pesquisa que mostra vantagens cardiovasculares entre pessoas que seguem uma alimentação à base de plantas
Figurando entre as principais causas de morte no Brasil e no mundo, as doenças cardiovasculares estão diretamente relacionadas com o estilo de vida, principalmente com a alimentação. Temos evidências, por exemplo, de que a redução do consumo de carne pode ajudar a diminuir o risco desses problemas, pois contribui com a melhora de indicadores como colesterol alto, glicemia elevada e ganho de peso.
Contudo, pesquisas que buscam confirmar a relação entre dieta e saúde cardiovascular tendem a ser prejudicadas por diferenças em fatores como genética, educação e hábitos dos participantes – tudo isso influencia os desfechos. Mas um estudo recém-publicado pelo periódico da Associação Médica Americana confirmou que a dieta vegana pode melhorar o estado cardiovascular ao investigar essa relação em gêmeos.
Estudar gêmeos idênticos permite um controle maior de fatores que podem interferir nos resultados, pois, além de possuírem a mesma genética, esses indivíduos cresceram no mesmo ambiente e geralmente têm estilo de vida parecido. Nesse caso, o estudo incluiu 22 pares de gêmeos idênticos, saudáveis e sem doenças cardiovasculares.
Cada par foi dividido em dois grupos: um designado a seguir uma dieta onívora e o outro, vegana. Ambos os menus eram balanceados e repletoss de verduras, frutas, legumes e grãos integrais, além de terem uma carga baixa de açúcar e carboidrato refinado. A dieta onívora incluía frango, peixe, ovos, queijos e demais derivados do leite, enquanto a dieta vegana era completamente à base de plantas e livre de carnes e outros produtos de origem animal.
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Inicialmente, os participantes receberam refeições em casa e, após quatro semanas, passaram a preparar sua própria comida, contando com um nutricionista para orientá-los. Durante as oito semanas de estudo, os gêmeos foram entrevistados sobre sua alimentação e passaram por exames de sangue e verificação do peso.
Com isso, foi observada uma redução nos níveis médios de colesterol LDL (o ruim), que, no grupo vegano, passaram de 110.7 mg/dL para 95.5, ante 118.5 mg/dL para 116.1 entre os onívoros. Idealmente, os níveis de LDL devem estar abaixo de 100 mg/dL e níveis altos estão relacionados ao aumento do risco de infarto e AVC devido ao depósito de colesterol nas artérias.
O grupo vegano também apresentou uma diminuição de 20% na insulina em jejum e perdeu cerca de 2 quilos a mais que os onívoros. Assim como o colesterol LDL, a insulina e o peso corporal também são fatores relacionados à saúde cardiovascular. Além disso, altos níveis de insulina são um fator de risco para o desenvolvimento de diabetes.
O estudo ainda demonstrou que é viável aprender a preparar e consumir uma alimentação saudável à base de plantas para melhorar a saúde em um curto período de tempo, visto que 21 dos 22 participantes designados para a dieta vegana concluíram o estudo e as maiores mudanças foram observadas nas primeiras quatro semanas.
E não é preciso adotar uma dieta estritamente vegana da noite para o dia. Simplesmente adicionar mais alimentos à base de plantas na rotina, além de reduzir o risco de doenças cardiovasculares e aumentar a longevidade, é capaz de conferir benefícios como melhora da microbiota intestinal e redução do encurtamento dos telômeros, o que está relacionado ao processo de envelhecimento do organismo. No estudo, as três principais medidas seguidas pelos participantes veganos para melhorar a saúde cardíaca foram: reduzir o consumo de gorduras saturadas, aumentar a ingestão de fibras alimentares e perder peso.
Vale ressaltar que o estudo se refere a dietas saudáveis. Então, na hora de migrar para uma alimentação à base de plantas, é importante evitar ciladas, como o consumo exagerado de alimentos ultraprocessados, incluindo as chamadas “carnes do futuro”. Muitos desses produtos que tentam replicar alimentos de origem animal são formulações industriais fabricadas a partir de substâncias extraídas ou derivadas de outros alimentos (no caso, as plantas) e sintetizadas em laboratório (corantes, aromatizantes, conservantes e aditivos).
Esse processamento é o que os torna mais agradáveis ao paladar e similares aos produtos que pretendem substituir, mas também é o que faz com que não sejam tão saudáveis quanto os alimentos in natura, podendo, a depender da composição, aumentar o risco de certos problemas de saúde.
Então, a melhor opção é apostar nas preparações caseiras protagonizadas pelos vegetais. Sempre diversificando e balanceando as refeições.
* Marcella Garcez é médica nutróloga, diretora da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran) e coordenadora da Liga Acadêmica de Nutrologia do Paraná